Sábado, Novembro 23, 2024

Doutrinas heréticas do Vaticano II?

Doutrinas heréticas do Vaticano II?

"Falando das religiões não catolicas, o Vaticano II ensina que "mesmo que as consideremos vítimas de deficiências, elas não estão de modo algum desprovidas de significação é de valor no mistério da salvação". Isso é uma heresia! (…) "Repito, falar de valores de "salvação" das outras religiões é uma heresia"." (Mons. Marcel Lefebvre, Do liberalismo à apostasia)

"A doutrina, portanto, contida nessa declaração conciliar é herética. O Vaticano II, declarando direito natural do homem seguir a religião ditada pela própria consciência, ou não seguir nenhuma, proclama o direito ao erro…. A Igreja que adere formal e totalmente ao Vaticano II com suas heresias não é nem pode ser a Igreja de Jesus Cristo". (Dom Antônio de Castro Mayer, Entrevista concedida ao Jornal da Tarde de São Paulo, dia 6/11/1984)

"No Breve de Pio VI, é condenada como herética a tese de que Cristo deu o poder supremo na Igreja não só a Pedro mas a todo o Colégio dos Apóstolos. Ora, é exatamente esse erro que foi aprovado nas brumas fenomenológicas da Lumen Gentium, no Vaticano II" (Orlando Fedeli, A serpente se esconde sob a erva. A colegialidade do Concílio Vaticano II condenada já por Pio VI, 15/02/2010)

Muitos tradicionalistas (não todos) e sedevacantistas costumam defender que os ensinamentos doutrinais pertencentes ao Magistério simplesmente autêntico do Vaticano II podem conter não só erros, mas verdadeiras heresias. Entre os exemplos costumam citar as doutrinas da liberdade religiosa, colegialidade episcopal, inerrância das Escrituras (como ensinada pelo Concílio), dentre outras… Pretendo provar a falsidade dessa afirmação.

A questão chave, portanto, é: É possível a unanimidade moral dos bispos contrariar dogmas definidos em seus ensinamentos?

Os teólogos negavam tal possibilidade. São claros que é impossível a maioria dos bispos ensinar uma heresia, ao menos com relação a heresia considerada como uma negação a uma proposição de fé católica e definida(1). Com relação a heresia considerada como uma negação a uma verdade de fé divina e católica, mas não definida, alguns teólogos parecem conceder a possibilidade de erro da maioria dos bispos. Com efeito, o cardeal Joseph Ratzinger diz que "se em algum lugar uma 'maioria' fosse formada contra a fé da Igreja de outros tempos, definitivamente não seria uma maioria”  (La Chiesa, Milan 1991, p. 71)(2).

Aqui, portanto, vamos estudar como os teólogos no passado trataram a questão sobre a impossibilidade de erro da maioria dos bispos quanto a verdade de fé definida:

J. M. A. Vacant ensina que é consequência das promessas de Cristo que uma doutrina definida pela Santa Sé seja necessariamente, então, ensinada pela maioria do episcopado católico:

“Contemplemos agora o caso em que a Santa Sé impõe uma verdade discutida até então à fé ou assentimento da Igreja. Imediatamente a maioria do episcopado ensinará esta verdade como obrigatória. É a consequência das promessas de Jesus Cristo ao corpo episcopal e a tradição interpretou assim estas promessas, posto que sempre considerou o ensinamento dos bispos católicos como uma regra de fé”. (Le magistère ordinaire de l’Eglise et ses organes. Paris, 1887)

Mons. Joseph Clifford Fenton ensina que é absolutamente certo que um dogma proposto pela Igreja Católica no passado seja ensinado, aqui e agora, por todas as partes e por todos os membros da ecclesia docens:

 “Absolutamente falando, uma vez que se estabeleceu que um ensinamento particular é proposto aqui e agora como dogma da Igreja Católica ubique et ab omnibus, é completamente certo que sempre foi apresentado assim na Igreja verdadeira e Católica. Mas, do mesmo modo, uma vez que se estabeleceu que a ecclesia docens declarou realmente tal ensinamento como dogma Católico no passado, é completamente certo que é ensinado como dogma Católico aqui e agora por todas as partes e por todos os membros da ecclesia docens”. (Christ the Teacher and the Stability of Catholic Dogma, AER 125 (September 1951): 208-19).

Dom Vicent Gasser, secretário da Deputação da Fé durante o Concílio Vaticano I, escreveu para os padres conciliares:

"Finalmente, não separamos o Papa, ainda que minimamente, do consentimento da Igreja, conquanto este consentimento não seja estabelecido como condição que lhe seja antecedente ou consequente. Nós não seríamos capazes de separar o Papa do consentimento da Igreja, porque esse consentimento jamais lhe faltaria. Com efeito, uma vez que acreditamos que o Papa é infalível por meio da assistência divina, por esta mesma razão, também acreditamos que o consentimento da Igreja não irá faltar às suas definições, uma vez que não é possível acontecer que o corpo episcopal esteja separado de sua cabeça, bem como não é possível que a Igreja universal seja capaz de falhar. Pois é impossível que obscuridade geral seja difundida no que diz respeito às verdades mais importantes que tocam a religião, como manteve o Sínodo de Pistóia." (Relatio do Bispo Vicent Ferrer Gasser, 11 de julho de 1870 [Vaticano I]).

Nessa passagem Dom Gasser estava respondendo objeções dos galicanos. Estes defendiam que as definições pontifícias só são infalíveis em virtude do consentimento da maioria da Igreja que lhe antecede ou segue. Dom Gasser responde que embora o consentimento da Igreja não seja uma condição antecedente ou consequente para a infalibilidade da definição pontifícia, jamais o corpo dos bispos irá deixar de consentir às definições papais, pois é impossível estar separado de sua cabeça. Segundo Dom Gasser, de outro modo, isso seria uma forma de obscurecimento geral, o que é impossível ocorrer, uma vez que essa é uma tese jansenista condenada como herética pela Auctorem Fidei. Destaca-se que os jansenistas defendiam que a maioria dos bispos católicos ensinava heresias(3), bem como a maioria dos fiéis.

Padre M. R. Gagnebet (discípulo do Padre Garrigou-Lagrange, citando Mons. Gasser, explica: 

"Mas ele teve o cuidado de acrescentar que às definições infalíveis do Papa não faltarão o assentimento da Igreja tanto do corpo dos Pastores quanto do conjunto dos fiéis. Pois o Espírito que assiste o Papa para definir a verdade revelada assiste também toda a Igreja para fazer aderir à verdade divina… Essas explicações muito claras do Mons. Gasser inspiram os últimos retoques feitos no texto conciliar no último momento sobre os pontos que nos interessam". (L'Infaillibilité du Pape et le consentement de l'Eglise au Vatican I, Angelicum, Vol. 47, No. 3 (Iul. – Sept. 1970), pp. 267-307).

“À sua definição o assentimento de todos os Pastores é prometido, bem como a adesão de todos os fiéis”. (L'Infaillibilité du Pape et le consentement de l'Eglise au Vatican I: II, Angelicum, Vol. 47, No. 4 (Oct. – Dec. 1970), pp. 428-455)

No mesmo sentido Dom Prosper Guéranger diz:

“Em virtude das promessas de Jesus Cristo, é possível que o corpo docente de Cristo (o Papa e os bispos definindo simultaneamente), seja infalível; porque o salvador o prometeu. É possível que o Pontífice Romano definindo do alto de sua cátedra seja infalível; porque o salvador o prometeu. É possível que o corpo episcopal, quando o Papa define sozinho, adira à sentença numa infalibilidade passiva; porque o Salvador prometeu à sua Igreja a permanência. Finalmente ele faz com que a Igreja ensinada nunca fique sem a verdade professada, antes e depois da definição; Porque o Salvador prometeu manter os seus fieis na verdade até a consumação dos séculos. Não, não há, nunca houve, não pode haver definição de fé que não seja acolhida pelo consentimento da Igreja” (Réponse aux dernières objections contre la définition de l'infaillibilité du pontife romain, ano 1870, p. 9)

O Cardeal Franzelin sobre o mesmo tema aponta:

“A opinião galicana que exige esse consentimento da Igreja como necessário para a infalibilidade das definições do pontífice – de tal maneira que o único sujeito da infalibilidade deve ser o corpo da Igreja que ensina, a saber, o papa com os bispos – agora é uma heresia, direta e explicitamente condenada pelo Concílio Vaticano. O consentimento subsequente de toda a Igreja, no entanto, é sempre o efeito da definição do pontífice”. (Franzelin, Johann Baptist, S.J., “Tractatus de Divina Traditione et Scriptura.”  The Dublin Review. Vol. XVII. July, 1871.Pp.258-268:https://books.google.com/books?id=UGcVAQAAIAAJ).

Matthias Scheeben também explica:

"A indefectibilidade da Igreja ou da verdade na Igreja supõe naturalmente a indefectibilidade do corpo ensinante em si mesmo e de sua ação externa. Mas ela é essencialmente outra no chefe que no CONJUNTO dos membros do corpo ensinante…. É igualmente possível que o papa, sem que a ação de sua autoridade seja interrompida, professe, ensine ou ateste extra judicium uma falsidade ou uma heresia; embora seja incompatível com A AUTENTICIDADE PERMANENTE DO TESTEMUNHO UNIVERSAL DOS BISPOS, que todos os bispos, MESMO EXTRA JUDICIUM, atestem, ensinem ou professem um erro ou mesmo uma heresia". (Matthias Scheeben, La théologie dogmatique, 1877, p. 152)

Dorsch: 

"Portanto, não haverá motivo algum para temer que o pontífice romano esteja separado do restante da comunidade dos fiéis ou dos bispos em suas definições. O Espírito Santo sempre fará com que o corpo dos bispos se una ao pontífice romano na unidade da fé, e este irá definir aquilo que está contido na tradição da Igreja, mesmo que em algumas igrejas particulares tenha sido obscurecido. A própria Igreja pereceria se, em algum caso, os fiéis não seguissem seu pastor ensinando de forma geral; nesse caso, o pontífice não seria mais a cabeça nem o primado da Igreja. No entanto, todas essas coisas são impossíveis devido às promessas divinas". (Institutiones theologiae fundamentalis, De ecclesia Christi, vol. II, 1928, p. 383).

O Frei Boaventura Kloppenburg disse, ainda no tempo dos trabalhos do Concílio Vaticano II, que seria possível os Padres conciliares aprovarem o esquema sobre as Fontes da Revelação, pois este não continha qualquer heresia, o que, por essa razão, não colocaria em jogo a infalibilidade da Igreja: 

"se todos os Bispos tivessem recebido pelo correio o esquema "De Fontibus Revelationis", tal como fora elaborado na fase preconciliar, com o pedido de dar o "placet" ou o "non placet", creio que não seria temerário pensar que o texto teria sido aprovado (pois nele não havia nenhuma heresia, e portanto, não teria estado em jogo a infalibilidade da Igreja)". (Concílio Vaticano II, vol. II, Primeira Sessão (Set-Dez. 1962), Editora Vozes, 1963, p 267)

O cardeal Franzelin diz que mesmo na vacância da Sé Apostólica permanece no corpo episcopal a infalibilidade em pregar a verdade suficientemente proposta à crença católica:

“Certamente, permanece na Igreja não somente a indefectibilidade em crer (chamada de infalibilidade passiva), como também a infalibilidade em proclamar a verdade que já foi revelada e suficientemente proposta à crença católica, mesmo enquanto ela [a Igreja] está temporariamente enlutada pelo seu cabeça visível, de modo que nem todo corpo da Igreja na sua crença nem todo Episcopado no seu ensinamento podem apartar-se da fé transmitida e cair em heresia, porque essa permanência do Espírito da verdade na Igreja, reino e esposa e corpo de Cristo, está incluída na própria promessa e instituição da indefectibilidade da Igreja para todos os dias até à consumação do mundo”. (Theses de Ecclesia Christi, Romae 1907, p. 221-223).

Zubizarreta diz o mesmo:

"Durante a sede vacante [a Igreja] fica privada por um tempo de seu cabeça visível, mas mantém os privilégios junto com a indefectibilidade e infalibilidade tanto passiva ou in credendo no corpo dos fiéis, como ativa ou in docendo no corpo dos bispos, contudo sem a faculdade de definir nenhum dogma novo ainda não declarado" (Theologia dogmatico scholastica, vol. 1, p. 462).

Parece que isso tudo é suficiente para demonstrar que é impossível à unanimidade moral dos bispos no Vaticano II ter ensinado uma doutrina oposta aquilo que foi definido pelos Papas e pelos Concílios no passado.

O Padre Bernard Lucien também explica esse ponto com mais clareza, vejamos:

“Como então a causa própria de adesão de inteligência, requerida no caso do magistério simplesmente autêntico, está presente? É necessário, a título de pano de fundo, ter presente no espírito que, segundo a instituição divina, o magistério universal transmite infalivelmente em cada época, como instrumento de Jesus, chefe atual de sua Igreja, o conjunto dos dados revelados, seja explicitamente, seja implicitamente. Certo que ele parece não excluir que uma doutrina, tendo chegado a um estado de explicitação certo ao nível do magistério ordinário e universal a uma certa época, seja vista em seguida relegada a um estado tácito, deixando espaço para errantes e até mesmo  de erros, inclusive entre os membros do corpo episcopal. Mas a doutrina própria da infalibilidade do magistério ordinário e universal exclui certamente que o conjunto do papa e dos bispos possa concordar (unanimidade moral), em uma dada época, em oposição a uma doutrina já explicitada. Admitir em princípio que ele possa ir de outra forma, seria reconhecer o princípio de uma dupla norma de fé: o "magistério anterior", de uma parte, o "magistério atual", de outra parte. Isso seria romper o princípio visível de unidade da fé, em contradição com a nota da unidade da Igreja.

Devemos, portanto, reconhecer que o magistério ordinário e universal compromete de si mesmo a infalibilidade quando se volta sobre aquilo já foi explicitado pela Igreja. Quando aborda uma questão, o magistério ordinário universal recapitula ipso facto, em virtude da assistência infalivel quotidiana, o que a Igreja já tem explicitado. O Magistério ordinário e universal não infalível, portanto, aborda, portanto os novos aspetos numa base absolutamente assegurada, divinamente garantida, e, portanto melhor que qualquer teólogo teria feito. Nós estamos assegurados de duas coisas: negativamente, que o novo aspecto do ensino não pode contradizer o que já foi fixado pela Igreja; positivamente, que este aspecto apóia-se realmente neste conjunto já elaborado.

E por isso a doutrina assim apresentada impõe-se a priori ao fiel e ao teólogo como provavelmente verdadeira, mesmo se a possibilidade do erro não é absolutamente excluída, seja diante de doutrinas reveladas, mas ainda puramente implícitas (e que um teólogo não pode nem por isso pretender, contra o Magistério vivo, conhecer com uma certeza absoluta)[4], seja sobretudo diante de elementos não revelados e que se encontram ainda circunstancialmente misturados à apresentação atual da doutrina pelo Magistério não infalível. É sobretudo nesta segunda direção que um trabalho de decantação (que não consiste num atual “dissentimento” dos teólogos percebendo dificuldades na doutrina proposta) poderá se produzir e algumas vezes conduzir à um recomeço da questão pelo próprio Magistério, incluindo um discernimento entre o essencial e o acessório na primeira intervenção, com verdadeira correção sobre o acessório. (L'Autorité Magistérielle, contribution à un débat actuel, Sedes Sapientiae, 2012, n. 119).

Os tradicionalistas que afirmam a possibilidade de heresias nas doutrinas dos documentos conciliares desconhecem a doutrina a respeito do Magistério ordinário e universal e de sua infalibilidade. Eles, normalmente, crêem que esse tipo de Magistério ocorre uma vez ou outra, para afirmar certas verdades reveladas como de fé, mas que pode ficar suspenso num período da história. Padre Calderón chega a afirmar que a infalibilidade desse Magistério não se cumpre porque os bispos, desde o Concílio, tomam uma atitude liberal, não fazendo uso de sua própria autoridade. Grande confusão! Citamos dois teólogos para condenar esse tipo de pensamento, que demonstram que a infalibilidade do MOU é constante e habitual por conta das promessas do próprio Cristo, vejamos:

Mons. d’Avanzo durante o Concílio Vaticano I, em nome da Deputação da Fé:

“… Seja-me permitido recordar-vos como a infalibilidade se exerce na Igreja. Com efeito, temos dois testemunhos na Escritura sobre a infalibilidade na Igreja de Cristo, Lc XXII: Eu roguei por vós etc., palavras que dizem respeito a Pedro sem os outros; e o final de Mateus: Ide, ensinai etc., palavras que são ditas aos Apóstolos mas não sem Pedro… Há, portanto, um duplo modo de infalibilidade na Igreja; o primeiro é exercido pelo magistério ordinário da Igreja: Ide, ensinai… Por isso, como o Espírito Santo, espírito de verdade, reside na Igreja todos os dias; assim também, todos os dias a Igreja ensina as verdades de fé com a assistência do Espírito Santo. Ensina todas aquelas coisas que são, ou já definidas, ou contidas explicitamente no tesouro da Revelação mas não definidas, ou cridas implicitamente: todas essas verdades a Igreja as ensina cotidianamente, quer por meio do Papa principalmente, quer por meio de todos os Bispos que aderem ao Papa. Todos, Papa e Bispos, são infalíveis nesse magistério ordinário com a própria infalibilidade da Igreja: diferem somente nisto, que os Bispos não são infalíveis por si sós, mas precisam da comunhão com o Papa, pelo qual são confirmados; o Papa precisa somente da assistência do Espírito Santo que lhe foi prometida (…). Mesmo com a existência desse magistério ordinário, sucede por vezes que as verdades ensinadas por esse magistério ordinário e já definidas sejam combatidas por um retorno da heresia, ou que verdades ainda não definidas, mas aceitas implicitamente ou explicitamente, devam ser definidas; e aí então se apresenta a ocasião para uma definição dogmática”. (Mansi 52, 763 D9-764 C7.)

J. M. HERVÉ escreve:

“OS BISPOS DISPERSOS PELA TERRA TESE:
O magistério eclesiástico, mesmo disperso sobre a terra, é infalível para ensinar a doutrina do Cristo (verdade de fé católica)(…)

PROVAS DA TESE

b) Pelas promessas do Cristo: O Cristo prometeu a infalibilidade à sua Igreja absolutamente e sem restrição, todos os dias e para sempre, e portanto no ministério do magistério ordinário e cotidiano, tanto quanto em seu exercício mais solene.
c) Pela natureza da Igreja e por seu fim: não é apenas de uma maneira extraordinária, no concílio, mas por todo lugar, sempre e cotidianamente, que a Igreja deve propor a verdade de tal sorte que ela engendre a fé nas almas, que ela expulse as heresias, que ela conduza os homens à Salvação com segurança e eficácia: eis o seu encargo essencial. Logo, ela não pode cumprir essa obra sem ser infalível. (Manuale Theologiae Dogmaticae, vol. I: De Revelatione Christiane; De Ecclesia Christi; De Fontibus Revelationis, 1952, Paris no 486, pp. 491-492)

Além disso, é curioso que essas teses mirabolantes vão contra o próprio conceito de Tradição, que seus partidários dizem tanto defender. Segundo os teólogos clássicos, Tradição é a doutrina íntegra que é pregada continuamente, de idade em idade, pelo consenso dos sucessores dos apóstolos. Não se pode falar em Tradição sem mencionar o órgão de transmissão da doutrina. Daí que qualquer tese que suponha que a Hierarquia deixou de ensinar em nome de Cristo ou que suponha que a Igreja docente pode ensinar heresias é claramente falsa. A Tradição é a transmissão da verdadeira doutrina pela Igreja docente, todos os dias, até o fim dos tempos. Não é conservada por alguns fiéis privilegiados, que ignoram a hierarquia. Vejamos o que os teólogos dizem sobre a matéria:

Cardeal Franzelin:

 “Em sentido propriíssimo tradição é: a íntegra doutrina da fé tal como, com a assistência do Espírito Santo, é CONSERVADA com CONTÍNUA SUCESSÃO NO CONSENSO DOS GUARDIÕES DO DEPÓSITO DA REVELAÇÃO E DOUTORES DIVINAMENTE CONSTITUÍDOS, e se manifesta na profissão e na vida de toda a Igreja”. (J. B. FRANZELIN, De divina traditione et Scriptura, thes. XI, ed. altera, Romae 1875, p. 96).

Billot:

“Temos assim na religião cristã, por divina instituição, o órgão da tradição, efetivamente oral e sempre vivo; digo órgão autêntico, com duração perene, dotado do carisma de uma assistência contínua. Adiciono também: indiviso em si e sempre visível em sua individualidade; e isto, principalmente, em virtude do único centro e cabeça designado, Pedro, necessariamente presente como primeiro na hierarquia apostólica (Mt 10, 2); necessariamente presente com o nome misterioso que Cristo nele impôs, significando a solidez inconcussa de seu ministério (Jo 1, 42); necessariamente presente como confirmador dos seus irmãos (Lc 22, 32); como pedra sobre a qual está edificada a Igreja (Mt 16, 18), tudo isso entendido aqui conforme o que se supõe demonstrado e provado em seu próprio tratado. Pois bem, sendo tal o órgão da tradição, como até aqui foi descrito com base no próprio documento solene de instituição da Igreja, ressalta de imediato e se entende sem dificuldade que a tradição mesma, sobre a qual ora se discute, nada mais é do que a PREGAÇÃO CONTÍNUA, DE IDADE EM IDADE, PELOS SUCESSORES DOS APÓSTOLOS sob o carisma da indefectibilidade, da revelação originariamente recebida da boca de Jesus Cristo ou então de Seus apóstolos por ditado do Espírito Santo".
(L. BILLOT, De immutabilitate traditionis, ed. tertia, Romae, 1922, p. 17)

Padre Giuseppe FILOGRASSI:

"Tendo presente o ensinamento do Tridentino e do Vaticano, estamos em condições de formar um conceito exato da tradição divino-apostólica. É a doutrina da fé tal como os apóstolos primeiro a receberam da boca de Cristo Nosso Senhor ou por comunicação imediata do Espírito Santo, doutrina pregada de viva voz pelos apóstolos e depois, DE IDADE EM IDADE COM CONTÍNUA SUCESSÃO, conservada intacta e TRANSMITIDA até nós mediante a assistência do Espírito Santo. De tal doutrina a Igreja é a guardiã, mestra, intérprete e juíza; com a assistência divina que lhe foi prometida perpetuamente, ela a conserva inviolavelmente e infalivelmente a expõe. A revelação transmitida por via do magistério, sempre vivo e vigente, também está contida na Sagrada Escritura, embora de outra maneira e não com igual totalidade. E contudo em um único depósito da fé, à Igreja confiado, está contida integralmente a revelação" Rev. Pe. Giuseppe FILOGRASSI, S. J., Tradição Divino-Apostólica e Magistério da Igreja (partes I e II), Roma, 1952; trad. br. por F. Coelho (f.a.coelho@gmail.com), São Paulo, 18 jan. 2017, blogue Acies Ordinata, http://wp.me/pw2MJ-2S6).

Ademais, a nota da apostolicidade da Igreja requer que a Hierarquia ATUALMENTE esteja ensinando a mesma doutrina que Cristo deu aos Apóstolos. A coerência doutrinal é preservada na Igreja de Cristo no TEMPO e no ESPAÇO, através do ensinamento da Hierarquia.

A Enciclopédia católica (1907) diz:

"apostolicidade de doutrina exige que o depósito da fé confiado aos apóstolos permaneça inalterado. Posto que a Igreja é infalível em seu ensinamento, se deduz que se a Igreja de Cristo ainda existe, DEVE ESTAR ENSINANDO A SUA DOUTRINA. Portanto a APOSTOLICIDADE DE MISSÃO É UMA GARANTIA DA APOSTOLICIDADE DE DOUTRINA". (O'Reilly, T. (1907). Apostolicity. In The Catholic Encyclopedia. New York: Robert Appleton Company. Retrieved November 8, 2019 from New Advent: http://www.newadvent.org/cathen/01648b.htm)

Padre Bernardino Marina explica:

“A apostolicidade de doutrina exige que a Igreja ATUAL ENSINE E PROFESSE a mesma doutrina que Cristo deu aos Apóstolos, e que eles pregaram e ensinaram aos povos. Igualmente é preciso advertir que esta identidade de doutrina deve ser retamente entendida. Permite, então, o progresso dogmático, sempre que se entenda em um sentido ortodoxo, isto é “in eodem sensu et in eadem sententia”. (Problemas de actualidad sobre la sucesión apostólica ; otros estudios : XVI Semana española de Teología, 17-22 Sept. 1956, p. 110)

Ressalta-se que a doutrina ora explicada de modo algum diminui uma possível crise na Igreja Católica. A tese de fé apresentada é bem demarcada: ela demonstra que é impossível a unanimidade moral dos bispos ensinar uma heresia, ou seja, negar um dogma definido pela Igreja. Ela não diz que é impossível certas parcelas da Hierarquia ensinarem erros e heresias.

Alfredo Vacant diz que pode ocorrer que a maioria dos bispos tolere doutrinas falsas por temor ou negligência, sobretudo se não afetam o próprio fundo da fé. Tampouco é impossível que a maioria dos bispos se equivoque em seu sentir pessoal. Também não é impossível que a maioria dos bispos não ensine explicitamente certas verdades de fé (estando presentes apenas em seu ensino tácito):

“Não esquecemos, contudo que as decisões doutrinas da Igreja não obrigam a todos os fiéis a aderir explicitamente ao ponto particular que é seu objeto. Por isso não reencontraremos o ensinamento explícito de todas as verdades obrigatórias na boca da maioria dos bispos. Poderá talvez até suceder que, por temor de inconvenientes mais graves ou por negligência, os bispos tolerem em torno de si ensinamentos de doutrinas falsas, sobretudo se não afetam o fundo próprio da fé. Por fim, tampouco é impossível que os próprios bispos se equivoquem em sua maneira pessoal de ver”. (O Magistério ordinário e seus órgaos, «La Science Catholique»en 1888).

“Embora o magistério ordinário se estenda a toda a doutrina da Igreja, pode suceder, além disso, que uma verdade obrigatória não seja ensinada expressamente pela maioria dos bispos nem crida expressamente pela maioria dos fiéis Há, com efeito, pontos de doutrina certos e impostos como tais, inclusive por juízos solenes, e que estão acima do alcance do maior número dos leigos…. Tampouco poderá ninguém se dar conta daquele pelo ensinamento expresso que o corpo episcopal formula cada dia, posto que este ensinamento vai dirigido principalmente ao povo e, portanto, refere-se geralmente às únicas verdades que estão a seu alcance. Deve se dizer que as matérias cujao entendimento exige estudos particulares não são o objeto do ensinamento diário? Seria cair em um erro grave pensa-lo; já que este magistério se estende a toda a doutrina da Igreja, como o temos observado nas sucessivas ocasiões. O corpo episcopal ensina infalivelmente e o povo fiel aceita todos os pontos obrigatórios da doutrina cristão; mas os bispos ensinam expressamente as principais verdades da fé, aquelas cujo conhecimento é fácil a todos, enquanto que as verdades que apenas se compreendem dentro das escolas de teologia são principalmente objeto de seu ensinamento tácito”.

Explica o Padre Goupil que pode acontecer que, no desenvolvimento do dogma, que traz uma verdade revelada da fé confusa à crença clara e expressa, as controvérsias que surgem produzam por algum tempo uma regressão ao invés de um progresso.

“Pode até acontecer que, no desenvolvimento do dogma, que traz uma verdade revelada da fé confusa à crença clara e expressa, as controvérsias que surgem produzam por algum tempo uma regressão ao invés de um progresso”. (La règle de la foi : Le Magistaire vivant. La Tradition. Le développement du dogme, 1934).

O Padre Antônio Straub em seu tratado De Ecclesia (1912) defende que mesmo definições ex cathedra podem ser esquecidas no seio da Igreja com o passar do tempo. O Padre Francisco Segarra disputou com Straub sobre os exemplos que aquele apontou, mas não sobre a possibilidade teórica disso acontecer, numa séria de artigos na década de 1920(4).

Melchor Cano(5) e Bento XIV(6) pensavam que era possível a maioria dos bispos divergir erroneamente do Papa num ponto doutrinal, antes da definição.

Claramente um Papa pode ter atitudes ambíguas e ações reprováveis. Mesmo João de São Tomás(5) e S. Roberto Bellarmino(7) dizem que o Papa Marcelino ofereceu incenso aos ídolos, ainda que possamos discordar da questão histórica.

Tampouco é impossível que a maioria dos bispos abandone a fé. Muitos teólogos interpretam assim a apostasia geral predita nas Escrituras. Billot ao falar da nota de Catolicidade cita a opinião de Bellarmino (que ele não compartilha) de que basta uma difusão "sucessiva" e não "simultânea", da qual Belarmino conclui que "se somente uma diocese (província) retivesse a verdadeira fé, ainda assim se seguiria chamando verdadeira e propriamente Igreja Católica…", e esta conclusão Billot nega "pelo menos como lei ordinária" e disse: "Creio que devemos nos abster disto, já que se esta opinião tem algum fundamento, não é outro além do que se lê sobre o fim do mundo e a perseguição do Anticristo(Lc. XVIII, 8; Mt. XXIV, 21-29; II Tes. II, etc)". (Tractatus de Ecclesia Christi sive continuatio theologiae de verbo incarnato, 1909, p. 218).

Por fim, contra a tese de fé que apresentamos alguém pode argumentar que no tempo do arianismo a maioria do episcopado passou a defender heresias. São Jerônimo disse: “O mundo inteiro gemeu – disse – admirado ao ver que se tinha tornado ariano”. Dial. Adv. Lucifer. n. 19. Mas é um erro interpretar o dito do santo dessa maneira. Vejamos o que os teólogos explicam sobre a matéria:

De Groot:

"Obj. II (…) b) Ao surgir a heresia de Ario defeccionou a Igreja, como atesta São Jerônimo. “O mundo inteiro gemeu – disse – admirado ao ver que se tinha tornado ariano”. Dial. Adv. Lucifer. n. 19.

Resp. Nego antec. Para provar respondo. (…) b) O que se diz sobre a admiração do mundo, dist. Admirou-se de ser ariano com heresia imputada, conc., com heresia, nego. – No ano de 359 os bispos católicos, reunidos em Arimini, subscreveram incautamente a fórmula na qual não se lia o vocábulo “consubstancial”. Esperavam que os arianos, dissimulando a fé católica, sem ter em conta esta palavra prendessem a si mesmos. Mas os Arianos afirmaram haver destruído a fé nicenas por causa da palavra que faltava. “O mundo inteiro gemeu – diz São Jerônimo – admirado ao ver que se tinha tornado ariano”. Mas o mesmo doutor santíssimo explica as palavras hiperbólicas sobre o arianismo imputado, acrescentando isto: “enganados pelos dolos Ariminenses eram sem sabê-lo tidos por hereges, pondo o Corpo de Nosso Senhor e tudo o que é santo na Igreja para testemunhar de não haver suspeita de qualquer coisa defeituosa em sua própria fé. Nós pensamos, diziam, que as palavras eram para ser tomadas em seu sentido natural: nem suspeitamos que na Igreja de Deus em que reina a simplicidade e a confissão pura, tivesse uma coisa fechada no coração, e outra proferida pelos lábios. Nós pensamos bem de uns homens maus e fomos enganados” Dial. Adv. Luciferianos, n. 19″. (Groot, Summa apologetica de Ecclesia Catholica ad mentem S. Thomae Aquinatis, ano 1890, pp. 235-236).

Santo Afonso de Ligório:

"Nem vale instar; supondo faltas cometidas pela Igreja nos concílios de Arímino e de Sirício, e que os bispos, junto com o Papa Libério, caíram na heresia de Ário, firmando fórmula de fé que observavam os arianos: porque não é exato assegurar que tropeçassem na heresia, pois que o fato passou desta maneira, segundo referem Santo Atanásio, Santo Hilário, São Jerônimo, Severo, Sulpicio e Teodoreto. Apresentando-se a assinatura dos bispos católicos e de Libério a fórmula de fé sirmiense, que se bem isenta de todo erro (pois se reconhecia nela que o Filho não era criatura como as demais), carecia, contudo, da expressão do concílio Niceno, que o Filho fosse consubstancial com o Pai, e como o Pai, verdadeiro Deus. Nisto se fundou a superstição empregada por Valente, cabeça dos arianos, para arrecadar do Papa e dos demais bispos católicos subscrevessem a indicada fórmula; prometendo fraudulentamente acrescentar à ela depois quantas expressões se julgassem oportunas: fiados nesta promessa, Libério e os bispos católicos, seja para livrar-se do mal trato que em Arímino sofriam por parte dos ariano, e seja especialmente do imperador Constâncio, subscreveram a fórmula. Culpáveis foram, é certo, de negligência e de minguada fortaleza; mas não de haver sucumbido aos erros de Ário: e isto é tão exato como que, percebendo pouco depois a falta por eles cometida, deram-se pressa a protestar, por meio de públicos manifestos, não haver sido jamais sua intenção se separar da fé de Nicéia, revogando Libério em termos formais quanto havia autorizado com sua assinatura. (A verdade da Fé – http://www.intratext.com/IXT/ITASA0000/_POR.HTM).

O Cardeal Franzelin explica que no tempo do arianismo a Igreja docente continuou sendo ativo instrumento da Infalibilidade da Igreja:

 "Pode certamente suceder que muitos bispos e muitas províncias completas reneguem a fé e que, no entanto, a maior parte dos rebanhos de fiéis em profissão ortodoxa conserve constantemente a comunhão e o consenso com a sucessão apostólica, a qual permanece em consenso e comunhão com o centro de unidade, isto é, a Sede de Pedro. Mas não pode suceder que todo o episcopado cometa defecção e não permaneça órgão de conservação da Tradição sob a assistência do Espírito Santo, mediante o qual, como por magistério ordinário externo, o mesmo Espírito contém e conserva a comunhão e a fé do povo católico. Para que isso tenha lugar, nem sempre se requer necessariamente que todo o episcopado defenda e proteja a fé ortodoxa contra seus adversários com empenho e ardor extremo, senão que pode ser suficiente sua perseverança na mesma doutrina transmitida, sendo essa mesma constância norma imediata viva e reitora e vínculo imediato de união do povo católico. Isso mesmo é o que podem corroborar os fatos da história eclesiástica, particularmente a história de arianismo que aflorava no IV, não assim aquilo que o autor anônimo da dissertação De consulendis fidelibus in rebus christianae doutrinae[1] julgou poder inferir a partir de tal história: “a Igreja docente não foi em todos os tempos instrumento ativo da infalibilidade da Igreja”. Mesmo tendo sido expulsos todos os bispos católicos, sua constância contra os arianos, a fuga do povo fiel do povo dos bispos intrusos e sua comunhão com os desterrados, o relato de Sozomendo segundo o qual tinha sido o mais perseverante o povo das cidades cujos bispos eram mais fortes e mais constantes na fé,[2] a cominação dos fiéis antioquenses para que comunicassem aos bispos ocidentais as fraudes do bispo ariano Leôncio[3] e outros fatos, todos referidos pelo mesmo autor anônimo da dissertação, demonstram que também naquele tempo “a Igreja docente tinha sido instrumento ativo da infalibilidade da Igreja”. (Cardeal FRANZELIN, Sobre a vacância da Sé Apostólica, 1886; trad. br. por F. Coelho, São Paulo, nov. 2014, blogue Acies Ordinata, http://wp.me/pw2MJ-2qh. A partir da trad. ingl., por James Larrabee, de: Theses de Ecclesia Christi (opus posthumum), Roma: Typographia Polyglotta, 1887, p. 221-224; reproduzida por John Lane em 25 de maio de 2012 nos Bellarmine Forums)

Uma resposta indireta a essa objeção é dizer que alguns autores sustentam que os bispos negavam uma verdade revelada de fé divina e católica, proposta por Nicéia em seu símbolo, mas não uma verdade de fé definida. Assim, não seriam heréticos no sentido referido pelos teólogos acima citados. Com efeito, os símbolos da Igreja são propostos infalivelmente à fé pelo magistério ordinário, mas não são propriamente de fé definida, segundo alguns autores (cf. Cartechini, Dall'opinione al domma, valore delle note teologiche, 1953, parte prima, NOTE TEOLOGICHE E CENSURE IN PARTICOLARE, etc). Por exemplo, o padre Roschini, citando o cardeal Lépicier, que afirma que a doutrina da Assunção era "de fé divina e católica" (como proposta pelo magistério ordinário universal), acrescenta: "Portanto, não se deve concluir que quem negar essa verdade cairá nas penalidades para os hereges, uma vez que falta uma definição mais explícita da Igreja sobre esse assunto". (Mariologia, 1948, T. II, partie, p. 285). Aqui, é claro, a palavra heresia é tomada em sentido estrito.

Esse é o entendimento do padre Gagnebet sobre o assunto: "Um obscurecimento momentâneo e parcial relativo à uma verdade não ainda definida pode se produzir numa parte mais ou menos grande da Igreja. Assim no tempo do Arianismo um grande número de bispos foram infectados pela heresia". (L'Infaillibilité du Pape et le consentement de l'Eglise au Vatican I, Angelicum, Vol. 47, No. 3 (Iul. – Sept. 1970), pp. 267-307). Por óbvio a palavra heresia vem tomada em sentido lato, pois Gagnebet não considera que houve uma negação a uma verdade definida.

Eis os argumentos que refutam, definitivamente, a opinião difundida nos círculos tradicionalistas e sedevacantistas sobre a existência de heresias nas doutrinas dos documentos conciliares.
 

NOTAS:

[1] "Para que haja uma "proposta da Igreja", não é necessário que haja sempre uma "definição". Basta que uma verdade seja proposta pelo que o Concílio Vaticano chama de "magistério ordinário e universal". Loc cit. Ver MAGISTÉRIO. É de fé católica, por exemplo, o que está explicitamente contido nas profissões de fé utilizadas em toda a Igreja, mesmo quando não são definições propriamente ditas. É assim que muitos teólogos subdividem a fé católica em “fé definida” e fé católica indefinida, ou “fé católica” para abreviar". (Dictionnaire de Théologie Catholique, Tome Sixiême, París, 1920, p. 171, verbete Fé (foi))

[2] Embora outros teólogos de peso parecem defender a impossibilidade da maioria dos bispos negar mesmo uma verdade de fé divina e católica ainda não definida. Nesse sentido é interessante notar as conclusões da Comissão especial, indicada pelo Papa Pio IX, para investigar a doutrina da Imaculada conceição e para submeter ao Papa por escrito seus pontos de vista acerca da possibilidade da definição do dogma. O Cardeal Manning traz no Apêndice de sua Obra The Vatican council and its definitions: a pastoral letter to the clergy, a declaração da Comissão especial nesse sentido, aprovada à unanimidade, que julga como FALSA a seguinte proposição: “Que não pode ser concluído legitimamente a partir do fato de que uma doutrina é mantida em qualquer época, que a mesma doutrina nunca foi negada pela maioria, e que isso foi ao menos implicitamente acreditado pelo maior número”
ttps://archive.org/details/TheVaticanCouncilAndItsDefinitions/page/n247

[3] O principal teólogo do Sínodo condenado, Pietro Tamburini, diz claramente: "A doutrina revelada será sempre ensinada no seio da Igreja, e a tradição será sempre uma regra infalível, no caso em que a obscuridade espalhe-se e se estenda sobre algumas verdades até cegar o entendimento do maior número dos pastores. Neste mesmo caso a Igreja permanece sempre visível, católica, infalível, e depositária fiel de toda a revelação, sem deixar de ensinar até aquela mesma verdade sobre a qual cai, digamos assim, o obscurecimento" (Resultado de las conferencias eclesiásticas, celebradas el año de 1789, en la ciudad y diócesis de Pistoya y de Prato, pág. 225: citado em Rochefort- Gusta, Bosquejo del jansenismo problema : los jansenistas son jacobinos. Geografía del Jansenismo ano 1847, p. 62)

[4] ¿Definiciones "Ex cathedra" olvidadas?, Estudios eclesiásticos: Revista de investigación e información teológica y canónica, ISSN 0210-1610, Vol. 5, Nº. 20, 1926, págs. 438-442.

[5] De locis theologicis, lib. V, cap. V

[6] De Synodo, lib.XIII, cap.II, n.3

[7] Cursus Theologici II-II De Auctoritate Summi Pontificis, Disp II, Art. III, De Depositione Papae. All quotations used in this article are found on pages 137-140.

[8] De Romano Pontifice, lib. IV, c. 8.

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