Sábado, Maio 18, 2024

O sentido de uma proposição condenada do Sínodo de Pistóia

I. A PROPOSIÇÃO HERÉTICA DO SÍNODO

“Nestes últimos séculos disseminou-se um obscurecimento generalizado das verdades mais importantes concernentes à religião, que são a base da fé e dos ensinamentos morais de Jesus Cristo” (Decreto da Graça, da predestinação, e do fundamento da Moral, § I. Sessão III do Sínodo de Pistóia)

 

a) A explicação do principal teólogo do Sínodo

Pietro Tamburini: 

“Estes pontos de doutrina não são por vezes reconhecidos por revelados se não por um certo número de fiéis seguidores da tradição, em comparação tidos como falsos ou duvidosos para um maior número de católicos. É evidente que o número daqueles que seguem a verdade e a doutrina da Igreja pode em certas matérias e em certos tempos ser o menor. Onde é que Deus prometeu que a verdade seria sempre ensinada pelo maior número? Antes muitas vezes tem predito escuridades e agitações com que deve gemer a Igreja. Era por ventura o maior número que nos tempos mais próximos de nós seguia a doutrina da Escritura e da Tradição sobre os justos juízos da hierarquia? Era o maior número que seguia as santas regras da Moral evangélica contra as máximas licenciosas dos Probabilistas? Era o maior número que propugnava pelos sagrados direitos da Graça de Jesus Cristo? Era o maior número que se opunha às relaxações dos atricionistas?” (Análise do livro das Prescrições de Tertuliano… Análise do livro das Prescrições de Tertuliano…p.50)

“A doutrina revelada será sempre ensinada no seio da Igreja, e a tradição será sempre uma regra infalível, no caso em que a obscuridade espalhe-se e se estenda sobre algumas verdades até cegar o entendimento do maior número dos pastores. Neste mesmo caso a Igreja permanece sempre visível, católica, infalível, e depositária fiel de toda a revelação, sem deixar de ensinar até aquela mesma verdade sobre a qual cai, digamos assim, o obscurecimento” (Resultado de las conferencias eclesiásticas, celebradas el año de 1789, en la ciudad y diócesis de Pistoya y de Prato, pág. 225: citado em Rochefort- Gusta, Bosquejo del jansenismo problema : los jansenistas son jacobinos. Geografía del Jansenismo ano 1847, p. 62)

 

b) A explicação do bispo do Sínodo

Scipione de Ricci:

“A tácita de estar só, embora falsa, não me assusta contanto prego a verdade do Evangelho” (Carta Pastoral do Arcebispo Bispo de Pistoia e Prato para o clero e o povo da cidade e diocese de Prato, Pistoia 05 de outubro de 1787, ed. Pistoia, p. 72)

“La tacita di essere solo, benché falsa, non mi spaventa finché predico la verità del Vangelo” (Lettera pastorale di monsignor vescovo di Pistoia e Prato al clero e popolo della città e diocesi di Prato, Pistoia 5 ottobre 1787, ed. Pistoia, p. 72)

  

II. A CONDENAÇÃO DA PROPOSIÇÃO DO SÍNODO NA BULA AUCTOREM FIDEI DE PIO VI

“DO OBSCURECIMENTO DA VERDADE NA IGREJA. Do Decreto da Graça, § 1º. A proposição que afirma ‘que nestes últimos séculos disseminou-se um obscurecimento generalizado das verdades mais importantes concernentes à religião, que são a base da fé e dos ensinamentos morais de Jesus Cristo’, HERÉTICA.” (Auctorem fidei, 1794)

 

a) 14 bispos da Assembléia de Florença censuram uma obra jansenista que defendia o obscurecimento da verdade na Igreja

“Admite-se na Igreja que tal obscurecimento de fé não só é possível, mas atual, que ela se encontra reduzida a pouquíssimos exemplos, graças a quatro ou seis bispos, outras tantas paróquias, etc. Isso tira dela a visibilidade, a infalibilidade, a indefectibilidade, entre seus atributos, O primeiro, porque o caráter de visibilidade tem de ser de modo sensível, não por via de exame, tem de ser de profissão externa de fé, não pelo peso intrínseco das provas dos homens que a professam. E contra tantos milhares, seis ou doze tornam-se um nada. O segundo, porque todos moralmente consentindo num dogma, que a Igreja está, visivelmente, caduca em erro. Portanto falha, que era o terceiro. Isto é quase confessado abertamente, embora negado em palavras…” (Análise do livreto intitulado “Gesú Cristo sotto l’Anatema” impresso em Pistoia por Atto Bracali em 1786, em “Apologia contra la censura“ feita por 14 bispos da Toscana para alguns livros publicados em Pistoia, Florença 1787, p. 12s. Segue=-se resposta, p. 145-175)

“Si ammette nella Chiesa tale oscuramento di fede non solo possibile, ma attuale, che ella si trovi ridotta a pochissimi, esempli grazia, a quattro o sei vescovi, altrettanti parochi, ecc. Ciò gli toglie la visibilità, l’infallibilità, l’indefettibilità, tra suoi attributi essenziali. Il primo, perché il carattere di visibile ha da essere in modo sensibile, non per via d’esame, ha da essere di esterna professione di fede, non per il peso intrinseco delle prove dei dommi che si professano. E contro tante migliaia, sei o dodici divengono un niente. Il secondo, perché tutti moralmente consentendo in un domma, che la Chiesa è visibilmente caduta in errore. Dunque è mancata, che era il terzo. Questo è  quasi confessato apertamente, quantunque negato in parole…” (Esame del libercolo intitolato Gesú Cristo sotto l’Anatema stampato in Pistoia per Atto Bracali nel 1786, in Apologia contro la censura fatta da XIV vescovi della Toscana ad alcuni libri pubblicati in Pistoia, Firenze 1787, p. 12s. Segue la risposta, p. 145-175)

 

b) Giovanni Marchetti censura o erro do bispo de Pistóia

“Ah! Não é possível ouvir-lhe, bispo católico, por assim dizer, sem tampar-se as orelhas e horrorizar-se. Como? Não assusta-lhe somente supor, não que a estigma de ficar sozinho na Igreja toda para pregar a verdade do Evangelho? (. ..) Mas, permita-me chamar as coisas pelo seu nome, este suposto é herético (…). E quem me negar, com pertinácia, assunto, seria também herege”. (Anotações pacíficas de um pároco católico …, S.1, 1788, p. 33; 1788, p. 40s)

“Ah! non è possibile il sentirvi così parlare, vescovo cattolico, senza turasi le orecchie ed inorridire. Come? non vi fa spavento il solo supposto, non che la taccia di restar solo nella Chiesa tuta a predicare la verità del Vangelo? (…) Ma, permettetemi di chiamar le cose col nome loro, questo supposto è eretico (…). E chi mi negasse com pertinacia cotesto assunto, sarebbe eretico anch’egli”. (Annotazioni pacifiche di un parroco cattolico…, s.1, 1788, p. 33; 1788, p. 40s)

  

c) O dominicano Filippo Anfossi comenta a condenação da Auctorem fidei:

“O ofuscamento nas verdades de maior importância, que são a base da moralidade e da fé, estendido com o termo geral também para todos estes [= bispos, papas e concílios gerais], em oposição às palavras e as promessas de Jesus Cristo, foi, com razão, condenado como herético (…). Mas é um erro em matéria de fé, que aquilo, que foi crido uma vez, como de fé, cessa, em seguida, de ser como tal; portanto, erro em matéria de fé, o unânime moral ofuscamento dos bispos unidos ao Papa, mas este unânime moral ofuscamento dos bispos unidos ao Papa, veio comprimido na primeira proposição do sínodo; portanto, contém um erro em matéria de fé e, como tal, devia ser condenado “. (Responder p. F. Filippo Anfossi Dominicana Cartas a Mr. de La Plat ea oposição de alguns outros teólogos, que reivindicou a desafiar a bolha Auctorem fidei …, t. II, Roma, 1805, p. 102)

“L’acciecamento nelle verità di maggiore importanza, che sono la base della morale e della fede, esteso col termine generalem anche a tutti questi [= vescovi, papi, concili generali], siccome contrario alle parole e alle promesse di Gesù Cristo, è stato a ragione condannato siccome eretico (…). Ma è un errore in materia di fede, che quello, che è stato creduto una volta, come di fede, cessi in seguito di esser tale; dunque errore in materia di fede l’unanime morale acciecamento dei vescovi uniti al papa; ma questo unanime morale acciecamento dei vescovi uniti al papa, viene compresso nella prima proposizione del sinodo; dunque contiene un errore in materia di fede, e come tale doveva essere condannata”. (Risposta del p. f. Filippo Anfossi domenicano alla Lettere del signor de La Plat e alle opposizioni di alcuni altri teologi, che hanno preteso d’impugnare la bolla Auctorem fidei…, t. II, Roma 1805, p. 102)

 

d) Cardeal Giacinto Sigismondo Gerdi[2] refuta um teólogo que se opunha a Auctorem fidei: 

“Na promessa de Cristo inclui aqui Bossuet junto a Sagrada Ceia a confissão da fé pela profissão dos fiéis na Comunhão exterior, e interior com Jesus Cristo, e entre eles sob a condução do Ministério Eclesiástico sempre, e sem interrupção assistido por Cristo. Ora uma fé, que se confessa em comunhão com Jesus Cristo é fora de dúvida a verdadeira fé; e se esta fé há de ser professada em comunhão exterior dos fiéis entre si até o fim dos séculos, aqui é excluída abertamente a possibilidade de um obscurecimento geral, que não pode estar com a exterior confissão da fé professada na universalidade, ou como diz em outro lugar (Nota minha: Bossuet diz), na totalidade dos fiéis, unidos na comunhão sob a condução do ministério eclesiástico. Além disso, se esta perpétua exterior profissão da verdadeira fé não pode manter-se na Igreja senão por meio do ensinamento do Ministério Eclesiástico instituído por Cristo, deve para tal efeito durar perpetuamente, igualmente fica excluída a possibilidade de um abuso geral desse Ministério no ensinamento confiado por Cristo, afim que se conservasse perpetuamente a profissão exterior da fé na totalidade da Sua Igreja” (Esame de’motivi della opposizione fatta da Monsignor Vescovo di Noli alla pubblicazione della bolla Auctorem fidei, pp 86-87: https://goo.gl/fQi0eN)

 

e) Cardeal Franzelin:

“Segue-se então o terceiro estágio, quando por meio de um juízo solene do Magistério autêntico ou, de outro modo, por um firme consenso estabelece-se como certo que um dogma é revelado e a questão saneada passa em entendimento católico explícito e em pregação eclesiástica pública. Havendo consenso manifesto e pregação explícita e eloquente, já não pode haver dentro da Igreja lugar para dissensão ou obscurecimento deste dogma. Com efeito, a Bula Auctorem Fidei em seu primeiro cânon condenou como herética a proposição do Sínodo de Pistóia que afirmava: “Nos últimos séculos, disseminou-se um obscurecimento generalizado das verdades mais importantes concernentes à religião, que são a base da fé e dos ensinamentos morais de Jesus Cristo“. (Tractatus de divina traditione et scriptura, Roma, 1870, pp. 245-246).

 

f) O Bispo Vicent  Ferrer Gasser no Concílio Vaticano I em 11 de julho de 1870 em sua Relatio diz:

“Finalmente, não separamos o Papa, ainda que minimamente, do consentimento da Igreja, conquanto este consentimento não seja estabelecido como condição que lhe seja antecedente ou conseqüente. Nós não seríamos capazes de separar o Papa do consentimento da Igreja, porque esse consentimento jamais lhe faltaria. Com efeito, uma vez que acreditamos que o Papa é infalível por meio da assistência divina, por esta mesma razão, também acreditamos que o consentimento da Igreja não irá faltar às suas definições, uma vez que não é possível acontecer que o corpo episcopal esteja separado de sua cabeça, bem como não é possível que a Igreja universal seja capaz de falhar. Pois é impossível que obscuridade geral seja difundida no que diz respeito às verdades mais importantes que tocam a religião, como manteve o Sínodo de Pistóia.” (O’Connor 43-44; Mansi, col. 1213-1214)

 

f) Pe. Sisto Cartechini:

“”Muitos, na verdade, daqueles que chamamos autores e testemunhas da nossa fé, escreveram em torno de vários dogmas, especialmente da Trindade, de modo diverso de nós, e portanto, no Tratado da Trindade coloca-se uma tese para escusá-los. Assim, também depois do cisma do Ocidente, muitos católicos também ensinavam que o concílio está acima do papa, o que agora é heresia. Trata-se de dar uma explicação deste fato e como isso é possível na Igreja infalível. A resposta é esta: os erros teológicos que encontramos na história eclesiástica, que, aliás, não são universais em toda a Igreja, consideramos: ou as consequências (consectária) de alguns dogmas, ou o modo de exprimir-se a cerca do mesmo, ou se observam com a substância, se trata só de alguma verdade que também não é um dogma explicitamente proposto para crer. Assim, os antigos apologistas falavam em um modo menos direto do Filho de Deus, quando o dogma da consubstancialidade não estava ainda proposto; e falavam menos diretamente, não só sobre as consequências ou derivações, mas também sobre a própria essência do dogma. O mesmo diga-se da linguagem de certos doutores sobre a Imaculada. Porém observado que também, que com aqueles que erraram, de fato, admitiram a doutrina depois, em seguida, definida, aceitando aquelas coisas que, então, foram explícitas e nas quais se continham de modo implícito a doutrina mais tarde definida. Assim, aqueles apologistas, admitindo a divindade do Filho, admitiram implicitamente a consubstancialidade, porque duas pessoas não podem ser ambas Deus, se não têm numericamente a mesma natureza. Assim Santo Tomás admitia implicitamente a Imaculada Conceição pelo fato de que admitiu explicitamente que Maria era a mãe de Deus, cheia de graça, porque neste conceito se contém tanto Mãe quanto maculada. Logo, podem sofrer um obscurecimento também das verdades reveladas, mas somente aqueles que ainda não são dogmas, isto é, que não são propostos pela Igreja como dogmas de fé; e tal obscurecimento nunca pode ser universal em toda a Igreja, de modo que em toda a Igreja ensina-se uma doutrina contrária à revelação”. (Dall’Opinione al Domma, Valore delle note theologiche, ano 1953, p. 109-110)

Molti, infatti, di quelli che chiamiamo autori e testimoni della nostra fede, scrissero intorno a diversi dommi, specialmente della Trinità, in modo diverso da noi, e perciò nel trattato della Trinità si suole porre una tesi per scusarli. Così anche dopo lo scisma di Occidente, molti anche cattolici insegnavano che il concilio è al disopra del papa, ciò che ora è eresia. Si tratta di dare una spiegazione di questo fatto e come ciò sia possibile nella Chiesa infallibile. La risposta è questa: gli errori teologici che incontriamo nella storia ecclesiastica, che del resto non sono universali in tutta la Chiesa, riguardano: o le conseguenze (consectaria) di qualche domma, o il modo di esprimersi circa il medesimo, o se riguardano la sostanza, si tratta solo di qualche verità che ancora non è domma esplicitamente proposto a credere. Così gli antichi apologisti parlavano in un modo meno retto del Figlio di Dio, quando il domma della consostanzialità non era stato ancora proposto; e parlavano meno rettamente non solo circa le conseguenze o derivazioni, ma anche circa la stessa sostanza del domma. Lo stesso si dica del linguaggio di certi dottori circa l’Immacolata. Va però osservato che anche coloro che errarono, di fatto ammettevano la dottrina poi in seguito definita, ammettendo quelle cose che allora erano esplicite e nelle quali si conteneva in modo implicito la dottrina più tardi definita. Così quegli apologisti, ammettendo essi la divinità del Figlio, ne ammettevano implicitamente la consostanzialità, perché due persone non possono essere ambedue Dio se non hanno numericamente la stessa natura. Così san Tommaso ammetteva implicitamente l’Immacolata Concezione per il fatto che ammetteva esplicitamente che Maria era madre di Dio, piena di grazia, poiché in questo concetto si contiene che tale Madre sia immacolata. Dunque, possono subire un oscuramento anche le verità rivelate, ma quelle soltanto che ancora non sono dommi, cioè non sono proposte dalla Chiesa come dommi di fede; e tale possibile oscuramento non può mai essere universale in tutta la Chiesa, in modo che in tutta la Chiesa s’insegni una dottrina contraria alla rivelazione”. (Dall’Opinione al Domma, Valore delle note theologiche, ano 1953, p. 109-110)

 

h) Dom Fernando Ocáriz:

Quando se trata de verdades infalivelmente ensinadas pelo Magistério, a infalibilidade do sensus fidei do Povo de Deus significa que na Igreja não pode faltar o assentimento a estas verdades[nota]”

Nota: Por isso, já Pio VI condenou como herética a proposição do Sínodo de Pistóia segundo a qual, postremis hisce saeculis sparsam esse generalem obscurationem super veritates gravioris momenti, spectantes ad religionem, et quae sunt basis fidei et moralis doctrinae Iesu Christi (Pio VI, Const. Auctorem fidei, 28-VIII-1794: DS 2601). (Teología fundamental, p. 83)

 

 

[1] Foi membro da Comissão de cardeais criada por Pio VI para redigir o texto definitivo da bula Auctorem fidei. Cf. http://www.treccani.it/enciclopedia/giacinto-sigismondo-gerdil_(Dizionario-Biografico)/

 

 

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