Sábado, Maio 18, 2024

Subsídios para a Qualificação Teológica da Lumen Gentium

“(…)

No n. 25 da Lumen Gentium ensina o Concílio que os Bispos “doctrinam Christi infallibiliter enuntiant” quando se realizam conjuntamente as seguintes condições: 1) Devem ensinar em comunhão com o Papa e os demais membros do Colégio; 2) devem ensinar “authentice”, isto: “ut testes fidei”, segundo a explicação do Relator; 3) devem ensinar sobre assuntos de fé e moral; 4) devem concordar numa sentença (“in unam sententiam conveniunt”); 5) devem propor a doutrina “tamquam definitive tenendam”. E acrescenta o mesmo n. 25: “Quod adhuc manifestius habetur quando, in Concilio Oecumenico coadunati, pro universa Ecclesia fidei et morum doctores et iudices sunt”. Ora, todas estas condições se realizam plenamente no caso da própria Constituição Lumen Gentium; logo, nesta Constituição, doctrinam Christi infallibiliter enuntiant. Entretanto esta conclusão não vale sem mais para todos os enunciados do documento conciliar, mas apenas para as doutrinas que são propostas data opera e como doutrina de Cristo. Exemplifiquemo-lo com a doutrina do Colégio dos Bispos. Não pode haver dúvida de que esta doutrina é proposta data opera no n. 22 (e já preparada nos nn. anteriores); nem há dúvida também de que é intenção do Concílio apresentá-la como ensinamento de Cristo. (O “statuente Domino” do início do n. 22 foi resultado de longas discussões. O próprio Papa interveio e enviou uma pergunta forma à Pontifícia Comissão Bíblica: “an et quibus textibus Sacrae Scripturae”, aquilo poderia ser demonstrado. E no dia 31-5-64 a Comissão respondeu que “pela Sagrada Escritura se pode provar que, por determinação do Senhor, São Pedro e os outros Apóstolos constituíam um só Colégio Apostólico”; e que os textos citados no n. 19 provam tal afirmação). Assim sendo, a doutrina da Colegialidade dos Bispos é “infalivelmente doutrina de Cristo”, isto é: verdade de fé. E da mesma forma se poderá argüir com relação aos outros ensinamentos positivos da Constituição: será necessário apenas verificar de cada vez se tal doutrina é de fato ensinada data opera e proposta ut doctrina Christi. Confirmadas estas duas condições, estamos diante de verdades que teologicamente devem ser qualificadas como “de fide”. Salvo meliore iudicio.

À mesma conclusão chegaremos à luz do ensinamento de Pio XII na Constituição Dogmática Munificentissimus Deus, pela qual se definiu em 1950 como verdade de fé a Assunção de Nossa Senhora. Antes deste solene documento o Papa perguntara a todos os Bispos do orbe se julgavam que a Assunção era uma verdade revelada e, portanto, definível. E quando Pio XII verificou que a resposta era afirmativa, concluiu que se tratava de uma verdade de fé e, por conseguinte, que ela poderia ser solenemente definida. Eis o raciocínio do Papa da Assunção: “Itaque ex ordinarii Ecclesiae Magisterii universali consensu certum AC firmum sumitur argumentum quo comprobaatur corpoream Beatae Mariae Virginis in Caelum Assumptionem… filiis firmiter fideliterque credendam” (n. 12) Note-se: antes de ser solenemente definida por Pio XII, a Assunção já era uma verdade de fé (não definida) porque ensinada pelos bispos do mundo inteiro segundo as cinco condições do n. 25 acima lembradas. Ora, estes mesmos Bispos do mundo inteiro estão agora reunidos no Concílio. Ainda que tenham a intenção expressa de nada querer definir solenemente (o que, aliás, não consta em nenhum documento conhecido), mesmo assim, quando ensinam, não deixam de ensinar como mestres e juízes autênticos da fé reunidos em solene e universal assembléia, isto é: não deixam de ser a voz do magistério ordinário e universal e supremo e solene da Igreja.

Em teologia costuma-se distinguir entre verdade de fé simplesmente e verdade de fé solenemente definida. A função específica do Magistério é ensinar autenticamente (isto é: com autoridade, como guardião, mestre e eventualmente juiz da verdade revelada ou com ela conexa); a modalidade “solene” deste ensinamento é de per si acidental. Em outras palavras: o Magistério ensina necessariamente “verdades de fé”, não necessariamente “verdades de fé solenemente definidas”. Nos primeiros séculos cristãos, antes de Nicéia, havia verdades de fé, mas não havia verdades de fé solenemente definidas. Havia fé porque havia um Magistério vivo. Depois fomos habituados a receber ensinamentos e condenações formalmente solenes. Os argumentos acima expostos nos convenceram que as doutrinas data opera propostas como doutrina revelada pela Constituição Lumen Gentium são realmente “verdades de fé” (…)”

Fonte: Revista Eclesiástica Brasileira, vol XXV, ano 1965, p. 217 – 219

 

PARA CITAR


KLOPPENBURG, Pe. Dr. Frei Boaventura. Subsídios para a Qualificação Teológica da Lumen Gentium, – Disponível em: < http://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/concilio-vaticano-ii/valor-magisterial/689-subsidios-para-a-qualificacao-teologica-da-lumen-gentium >. Desde: 04/06/2014. Transcrição: Nelson M. Sarmento.

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