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Padres da Igreja
Do Cuidado Devido Aos Mortos

Do Cuidado devido aos Mortos

Tradução: Carlos Martins Nabeto

CAPÍTULO I

Caríssimo Paulino, meu irmão no Episcopado: há muito devo-te uma resposta… Devo-a desde que me enviaste uma carta - através dos familiares da nossa piedosíssima irmã, Flora - onde me perguntavas se o cristão lucra algo para si se for sepultado próximo à sepultura de algum santo. Essa questão fora-te feita pela própria viúva que acabo de citar, em razão do seu falecido filho, enterrado em alguma parte da sua capela. Para a consolar, disseste que tal voto já havia se concretizado para o seu jovem filho, Cinérgio, em razão do carinho que a mãe nutre para com seu filho, pois fora ele sepultado na Basílica do bem-aventurado Félix, confessor da fé.

Tendo os mensageiros trazido a carta de resposta a Flora, aproveitaste para me interrogar por escrito sobre tal prática, pedindo o meu parecer sem esconder o que sentes.

Como me dizes, achais que não é coisa vã o sentimento que leva pessoas fiéis e religiosas a tomarem tal cuidados com os seus falecidos. Adiantas, ainda, que não é sem motivo que a Igreja universal mantém o costume de orar pelos mortos. Assim, pode-se concluir que é útil para o homem, após sua morte, ter uma sepultura desse gênero, providenciada pela piedade [de seus familiares], onde possa contar a proteção dos santos.

Caro Paulino: consideras que, caso a opinião que diz ser útil sepultar os entes queridos junto à sepulturas de santos seja verdadeira, então existe uma controvérsia com relação às palavras do Apóstolo que diz: “Todos nós certamente nos apresentaremos diante do tribunal de Cristo, para recebermos a retribuição de acordo com aquilo que fizemos durante nossa vida corporal, seja para o bem ou para o mal”1

De fato, a sentença do Apóstolo exorta-nos que é antes da morte que podemos fazer o que seja útil para depois dela e não depois que ela ocorre, quando recolhemos os frutos que praticamos durante a vida.

A questão então é resolvida da seguinte maneira: enquanto vivemos neste corpo mortal, há uma certa forma de viver que permite, após a morte, obter certo alívio através das obras pias feitas em seu sufrágio. Porém, tal ajuda será proporcional ao bem que cada um de nós fizemos durante a vida.

Para alguns, tais auxílios são totalmente inúteis, pois a conduta destes durante a vida foi tão má que simplesmente se tornaram indignos de os aproveitarem. Também existem outros que viveram de forma tão irrepreensível que não têm necessidade desses socorros. Assim, é através do modo de vida que cada um levou durante a existência corpórea, que se determina a utilidade ou inutilidade desses auxílios que lhes são piedosamente dedicados após a morte. Se o mérito da proveitosidade foi nula durante a vida, permanecerá estéril também após a morte.

Contudo, isso não significa que a Igreja e os fiéis perdem seu tempo, ao inspirar, pela religião, o piedoso cuidado aos defuntos - ainda que seja verdade que cada um receberá de acordo com o que praticou de bom ou de mau durante a sua vida, já que o Senhor retribui a cada um conforme as suas obras; logo, para que o cuidado tomado em relação a um ente querido seja-lhe útil após sua morte, é necessário que essa pessoa tenha adquirido a faculdade de torná-lo útil ainda durante o tempo em que viveu no seu corpo.

Esta resposta seria suficiente para a pergunta que me fizeste, mas creio que ela acaba gerando outras questões que preciso também abordar. Peço-te, assim, atenção! Lemos, no livro dos Macabeus2, que foi oferecido um sacrifício pelos mortos. Ainda que não encontremos em qualquer outra parte do Antigo Testamento uma outra referência a esse respeito, não podemos substimar a autoridade da Igreja universal, que manifesta esse costume, pois, nas preces que o sacerdote dirige ao Senhor Deus junto ao altar, existe espaço especialmente reservado para a encomendação dos falecidos.

CAPÍTULO II

Convém examinar se o lugar onde alguém foi sepultado exerce alguma influência sobre a alma. Mas, primeiro, vejamos se existe algum efeito o fato de deixar um corpo sem sepultura, seja para o início ou para o aumento das penas no além. Julguemos, pois, esta questão fundamentando-se nas Sagradas Escrituras da nossa religião e não conforme a crendice popular.

Não devemos crer, como lemos em Virgílio, que os mortos insepultos não podem navegar nem atravessar na barca do rio do Hades, confome esta passagem da Eneida: “Não lhes é permitido passar para além dessas horríveis margens e desse rio de ruído assustador, até que seus ossos não recebam uma morada tranquila”3.

Que inteligência cristã poderia crer em tais fábulas e ficções se o próprio Senhor Jesus, ao tranquilizar os cristãos que viriam a cair nas mãos e poder de seus inimigos, afirmou que nenhum só fio de cabelo de sua cabeça se perderá4 e os exortou a não temer aqueles que matam o corpo e nada mais podem fazer [contra a alma]5?

Já falei muito sobre isso no primeiro livro da minha obra “A Cidade de Deus”6, para calar a boca dos pagãos que nos acusam, como cristãos que somos, como responsáveis pelas devastações promovidas pelos bárbaros, especialmente aquelas sofridas por Roma, e alegam que Cristo não nos socorreu nessa ocasião. Ao explicarmos que Cristo acolheu as almas dos fiéis conforme o mérito de sua fé, eles nos insultam dizendo que muitos cadáveres ficaram sem sepultura. Eis o que trato a esse respeito - quanto ao lugar do sepultamento - na citada obra:

“Naquela espantosa quantidade de cadáveres, quantos fiéis devem ter ficado sem sepultura? Contudo, tal infortúnio é pouco temido pela fé viva, que tem por certa que os animais nada podem fazer contra a ressurreição dos corpos de suas vítimas e delas não perecerá um só fio de cabelo da cabeça7. A Verdade afirmaria: ‘Não temais aquele que mata o corpo e não pode matar a alma’8, se a engenhosa crueldade dos assassinos pudesse eliminar nos corpos dos inimigos a semente da vida futura? Haveria alguém tão insensato que acreditasse que os inimigos não devem ser temidos antes da morte, mas apenas depois, por privá-lo de uma sepultura? Se fosse possível fazer tal mal aos cadáveres, então as palavras de Cristo: ‘não temais aquele que mata o corpo e não pode matar a alma’ seriam falsas. O quê? As palavras da Verdade falsas? Que se afaste de nós tamanha blasfêmia! Está escrito que os assassinos dispõem de tal poder no momento de matarem porque o corpo é sensível ao golpe da morte, mas, em seguida, nada mais podem fazer pois o cadáver é desprovido de qualquer sensibilidade. É verdade que a terra não recebeu o corpo de grande quantidade de cristãos, mas, mesmo assim, ninguém separou a terra do céu, pois ela está cheia da presença d’Aquele que sabe de onde chamar à vida para aquilo que criou. Bem diz certo Salmo: ‘Deram os corpos de teus servos como pasto para as aves do céus e as carnes dos teus santos aos animais da terra. Derramaram o sangue deles como água à roda de Jerusalém e não havia quem os sepultasse’9. Mas o Salmista diz isso mais para exagerar a crueldade dos carrascos do que para lamentar o infortúnio das vítimas. ‘É preciosa aos olhos do Senhor a morte dos seus santos’10. Assim, as providências quanto ao funeral, a escolha da sepultura, a pompa do enterro, etc., é mais consolo para os vivos do que alívio para os mortos. O quê? Poderiam os ímpios se aproveitarem das honras fúnebres? Se sim, realmente seria um infortúnio para o justo possuir uma sepultura pobre ou até mesmo não a possuir. Se para os olhos dos homens grande número de escravos realiza magnífico cortejo fúnebre para o rico impiedoso11, brilham muito mais para os olhos de Deus as exéquias que o ministério de anjos ofereceram ao pobre Lázaro, todo coberto de úlceras. Para seus restos mortais, não foi erguido um túmulo de mármore, mesmo assim, foi levado para o seio de Abraão. Vejo rindo aqueles contra quem defendo a Cidade de Deus… Contudo, até mesmo seus próprios filósofos menosprezaram a preocupação com o sepultamento e, muitas vezes, exércitos inteiros pouco se preocuparam com o lugar onde seus corpos haveriam de jazer - ao morrerem por sua pátria -, mesmo sabendo que os animais se alimentariam deles. Desta forma, puderam os poetas dizer, com aplausos: ‘A quem faltou o sepulcro, o céu serve de proteção’12. Portanto, que loucura é essa de ultrajar os cristãos por terem deixado corpos insepultos, se aos fiéis foi prometido que a carne e os membros - deixados sobre a terra ou dispersos pelo interior de outros elementos - hão de retornar à vida, num piscar de olhos, sendo restituídos à anterior integridade, como foi prometido por Deus?13.

CAPÍTULO III

Mesmo assim, isso não é justificativa para abandonar sem cuidados os despojos dos falecidos, principalmente dos justos e fiéis, que são órgãos e instrumentos do espírito para toda boa obra. Se a roupa, o anel ou qualquer outro objeto pertencente ao pai é precioso para os filhos, muito mais terna é a piedade filial. Acaso o corpo não merece mais cuidados por estar muito mais intimamente ligado a nós do que a roupa, seja ela qual for? Logo, o corpo não é mero ornamento exterior do homem, mas parte de sua natureza humana. Este é o verdadeiro motivo dos deveres de piedade solenemente prestados aos antigos justos, a pompa de suas exéquias, os cuidados com suas sepulturas e as ordens que eles mesmos, quando vivos, davam a seus filhos, para sepultá-los ou transladá-los uma vez mortos14.

De acordo com o testemunho do anjo, Tobias atrai sobre si as bênçãos de Deus devido a seu cuidado para com os mortos15. O próprio Nosso Senhor, que ressuscitará no terceiro dia, divulga a boa ação da santa mulher que lhe unge com precioso perfume, como que para sepultá-lo antecipadamente16. Também o Evangelho recorda com louvores aqueles que receberam piedosamente o Corpo, à descida da cruz, cobrindo-o com o sudário e depositando-o no sepulcro17.

De forma alguma, tais exemplos não provam que os cadáveres conservam algum tipo de sensibilidade. Mas provam que a Providência de Deus vela os despojos dos falecidos e esses deveres de piedade lhe são agradáveis, por demonstrarem a fé na ressurreição.

Além disso, existe salutar ensinamento para nós: ainda que Deus retribua abundantemente as nossas esmolas prestadas a criaturas vivas e dotadas de sensibilidade, também aos olhos de Deus nada se perde pela nossa caridade prestada aos restos inanimados dos homens.

É certo que os santos patriarcas deixaram, por inspiração profética do Espírito, outras recomendações sobre o sepultamento e a transladação de seus corpos, porém, não é oportuno aprofundarmos em tais mistérios neste momento. Basta, então, o que acabamos de dizer.

Se é verdade que a falta de coisas necessárias para a manutenção da vida - como o alimento e o vestuário - são provações cruéis, mas impotentes contra a corajosa paciência do homem virtuoso, longe de afastar a piedade do seu coração, como poderia, então, que a falta das solenidades fúnebres costumeiras, perturbasse o repouso de tal alma na santa e bem-aventurada mansão? “E que os últimos deveres tenham faltado aos cristãos na desolação de Roma ou de outras cidades, isto pouco importa: não foi falta dos vivos, que nada puderam fazer; nem infortúnio para os mortos, que nada puderam sentir”18.

Tal é a minha opinião sobre a causa e a razão de ser das sepulturas. Se extraí essa passagem de algum dos meus livros para colocá-la aqui, é porque me pareceu mais simples retomá-la do que exprimir em outras palavras as mesmas idéias.

CAPÍTULO IV

Como esses princípios acima elencados são justos, não deixa de ser marca dos bons sentimentos do coração humano escolher para seus entes queridos que serão sepultados um lugar próximo aos túmulos dos santos.

Já que o sepultamento é, por si mesmo, uma obra religiosa, a escolha do local não poderia ser estranha ao ato religioso. É consolo para os vivos, uma forma de testemunhar sua ternura para com os familiares desaparecidos. Não enxergo, porém, como os mortos podem encontrar aí alguma ajuda, a não ser quando o lugar onde descansam é visitado e são encomendados, pela oração [dos visitantes], à proteção dos santos junto ao Senhor. Contudo, isso pode ser feito ainda quando não é possível sepultá-los em tais lugares santos…

Se é verdade que denominam de “Memorial” ou “Monumento” aos sepulcros vistosamente construídos, fazem-no, na verdade, para trazer à memória aqueles que, pela morte, foram subtraídos aos olhos dos vivos. Isto é feito para que as pessoas continuem a se lembrar deles, para que não aconteça de, tendo sido retirados da presença dos vivos, também sejam retirados do coração pelo esquecimento. Aliás, o termo “Memorial” indica claramente esse sentido de recordação, da mesma forma como “Monumento” significa “o que traz à mente”, ou seja, o que a faz recordar. Eis o motivo pelo qual os gregos chamam de “mnemeion” ao que chamamos de “memoria” ou “monumentum”. Na língua deles, “mnème” significa “memória”, a faculdade com a qual recordamos.

Assim, quando o pensamento de alguém se concentra sobre o lugar onde o corpo de um ente querido jaz e esse local esteja consagrado pelo nome de um mártir venerável, então a afeição amorosa recorda-se e reza, recomendando o falecido querido a esse mártir.

Não se pode duvidar de que essas súplicas, feitas pelos fiéis em nome dos seus caros defuntos, são úteis a estes caso apenas tenham merecido - durante a vida - beneficiar-se após a morte. Ainda que se suponha que alguma circunstância impediu o sepultamento ou que não foi dada a autorização para sepultar num desses locais sagrados, não será por isso que deveremos negligenciar as orações pelos falecidos.

A Igreja tomou para si o encargo de orar por todos aqueles que morreram dentro da comunhão cristã e católica. Ainda que não conheça todos os nomes [de seus fiéis defuntos], ela os inclui numa comemoração geral19. Dessa forma, aqueles que não possuem mais pais, filhos ou outros parentes e amigos para auxiliá-los, são amparados pelo sufrágio dessa piedosa Mãe comum.

Julgo, porém, que caso esses sufrágios pelos mortos sejam feitos sem verdadeira fé e piedade, de nada valeria ao espírito deles que seus corpos sem vida se encontrassem sepultados nos lugares mais santos.

CAPÍTULO V

Aquela mãe cristã de que me falaste desejou que o corpo de seu filho fosse depositado na basílica de um mártir por ter aquele expirado na fé. É que ela acreditava que a alma do finado poderia ser ajudada pelos méritos desse mártir. Essa fé, a seu modo, já era uma súplica; e súplica útil, se admitirmos isso, à medida em que voltar o seu pensamento frequentemente em direção a esse túmulo e, cada vez mais, recomendar o filho em suas orações… e é isto o que realmente será útil para a alma do finado. O que vale não é o lugar onde o corpo está enterrado, mas a viva afeição da mãe, revivificada pela lembrança desse lugar. A isso, devemos acrescentar que o objeto de sua afeição e o pensamento do santo protetor contribuirão bastante para tornar mais fecunda sua oração e piedade.

Ocorre que aqueles que oram impõem a seus membros uma posição condizente com a oração: ajoelham-se, estendem as mãos, prostram-se no chão e praticam outros gestos do gênero. É certo que Deus conhece-lhes a verdade oculta e a intenção do coração, e não tem a necessidade desses sinais sensíveis para penetrar no íntimo da consciência humana. Entretanto, é por essas demonstrações que a pessoa estimula-se a si mesma a orar e gemer com mais humildade e fervor. Ainda que os gestos corporais não se produzam sem o movimento interior da alma, esses atos externos e invisíveis aumentam - não sei como - o ato interior e invisível.

Ainda que estivesse impedido ou impossibilitado de os realizar com seus próprios membros, isso não imcapacitaria o homem interior de orar. Deus o vê, contrito e arrependido, prostrar-se no santuário secreto do seu coração.

De forma análoga, podemos dizer que o local de sepultamento é, por certo, de grande importância para aquele que encomenda a Deus a alma do morto querido, desde que a oração seja vivificada pelo espírito interior, já que foi o sentimento interno do coração que escolheu com antecedência o lugar santificado para o sepultamento. E esse local, após receber o corpo, renova e aumenta o sentimento interior, que foi o princípio de tudo, pelas lembranças que suscita.

Contudo, se tão piedosa pessoa não consegue sepultar aquele que ama no lugar onde desejaria por inspiração cristã, ela não deve, por isso, suprimir as orações necessárias para a encomendação do defunto. Pouco interessa se aqui ou ali está um corpo sem vida: o essencial é que a alma encontre seu repouso. Deixando este mundo, ela leva conscientemente consigo o tipo de sorte que lhe está reservada, se a felicidade ou o infortúnio.

Não é da carne que a alma espera ajuda para a sua vida futura. É ela que lhe comunicava a vida na terra. Ao partir, ela retirou a vida; ao voltar20, a devolveria. É a alma que prepara para a carne o que lhe será devido no momento da ressurreição, e o corpo ela o fará revivificar, seja para o castigo ou para a glória.

CAPÍTULO VI

Lemos na “História Eclesiástica” de Eusébio, escrita em grego e traduzida para o latim por Rufino, o seguinte acontecimento: na Gália, os corpos dos mártires de Lião foram atirados aos cães. A carne e os ossos que restaram foram reduzidos a cinzas, até a última parcela, e foram jogadas finalmente no rio Ródano, para que não sobrasse nada de sua memória.

Ora, devemos crer que se Deus permitiu tal destruição é para demonstrar aos cristãos que, ao confessarem a Cristo, desprezando esta vida, os mártires devem desprezar ainda mais a sepultura, pois se a detestável crueldade com que foram tratados os corpos desses mártires pudesse afastar do bem-aventurado repouso a alma vitoriosa, Deus certamente não o teria permitido. Está bem claro o que o Senhor afirmou: “Não temais os que matam o corpo e depois nada mais podem fazer”21. Isso não significa que os perseguidores perderiam o poder sobre o corpo dos fiéis após a morte, mas ainda que detivessem tal poder, nada mais podiam fazer para diminuir a felicidade das suas vítimas, pois já não podiam atingir a vida consciente delas no além-túmulo e também não podiam danificar mais os próprios corpos, do ponto de vista da integridade da sua ressurreição.

CAPÍTULO VII

Existe no coração humano um sentimento natural que não permite ninguém detestar sua própria carne21. Assim, se alguém vem a saber que, após sua morte, seu corpo não receberá as honras de sepultura, conforme o costume da cada raça e nação, sente-se perturbado como homem. Teme que seu corpo, antes da morte, não atinja o destino pretendido após a morte.

É isto que lemos no livro dos Reis22, quando Deus envia um profeta a outro profeta (um homem de Deus) que havia transgredido a Sua Palavra, para anunciar-lhe que seu corpo, como castigo, não seria levado à sepultura de seus pais. Eis o que diz as Escrituras: “Aquele profeta disse ao homem de Deus que tinha vindo de Judá: ‘Eis o que diz o Senhor: porque não obedeceste à Palvra do Senhor e não guardaste o mandamento que o Senhor, teu Deus, havia te imposto, voltando e comendo pão e tomando água, o teu cadáver não será levado ao sepulcro de teus pais’”.

Medindo a importância desta punição em relação ao Evangelho - onde está escrito que, estando morto o corpo, os membros nada devem temer - não podemos dizer que isso tenha sido uma punição, exceto se considerarmos o amor que todo homem tem por sua própria carne: o profeta, em vida, com certeza sentiu temor e tristeza com a idéia de um tratamento que não poderia sentir após a morte. E era justamente essa a sua punição; esse sentimento de dor diante da idéia do que sofreria o seu corpo, ainda que, de fato, não viesse a sofrer em absoluto no momento em que a ameaça se concretizasse.

Ora, o Senhor quis apenas punir a desobediência do seu servo, não por má vontade, mas por ter sido enganado pela mentira de um outro profeta. Não se pode pensar que a mordida da fera selvagem o tenha matado para que a sua alma fosse lançada no Inferno, pois o mesmo leão que o agredira montou guarda de seu corpo, sem fazer mal algum ao jumento que assistia destemidamente ao funeral do seu dono, ao lado da terrível fera. Esse fato notável é sinal de ter sofrido o profeta tal morte como castigo temporal e não como punição eterna.

O Apóstolo lembra que muitos são punidos com doença ou morte por causa de seus pecados, fazendo esta observação: “Se nos examinássemos a nós mesmos, não seríamos julgados; mas com seus julgamentos, o Senhor nos corrige, para que não sejamos condenados com o mundo”23.

O velho profeta, que enganara o homem de Deus, sepultou-o com muita honra e tomou os procedimentos necessários para que, mais tarde, ele mesmo fosse sepultado junto a aquele. Esperava que aqueles ossos encontrariam graça quando chegasse o tempo em que, conforme a profecia do homem de Deus, Josias, rei de Judá, exumaria os ossos de muitos mortos para profanar com eles os altares sacrílegos erguidos aos ídolos. Contudo, passados mais de 300 anos, Josias poupou o sepulcro onde havia sido enterrado o homem de Deus que predissera esse fato. E, assim, graças a esse homem de Deus, a sepultura do profeta que o enganara não foi violada.

O efeito que leva alguém a odiar a própria carne24, o havia feito prever o destino do seu corpo, mesmo tendo matado sua alma por uma mentira. Cada um ama sua própria carne por instinto. Assim, um profeta sofreu à idéia de que não iria repousar no sepulcro de seus pais e o outro tomou o cuidado de prover à segurança de seus ossos, fazendo-se enterrar em sepulcro que ninguém haveria de violar.

CAPÍTULO VIII

Porém, os mártires venceram esse apêgo ao próprio corpo, em sua luta pela verdade. Não é de surpreender que tenham desprezado as honras reservadas aos seus despojos. Só estariam insensíveis a elas após a morte, pois enquanto viviam e tinham sensibilidade, não se deixaram vencer pelo suplício.

O Senhor não permitiu ao leão tocar no cadáver daquele homem de Deus, morto por essa mesma fera assassina que logo depois se tornou seu guardião25. Do mesmo modo, Deus poderia, se quisesse, ter afastado os cadáveres de seus fiéis dos cães aos quais foram jogados. Ele poderia, de mil maneiras, dominar a crueldade dos carrascos, impedindo-os de queimar aqueles corpos e dispersar suas cinzas. Porém, foi necessário que essa provação se acrescentasse ainda à múltipla diversidade das tribulações, a fim de que a firmeza da ferocidade da perseguição, armada contra o corpo deles, não temesse diante da privação das honras fúnebres do sepultamento.

Em outras palavras: era necessário que a fé na ressurreição não fosse abalada pela destruição do corpo. Logo, todas essas provações foram permitidas para que os mártires, após demonstrarem tão grande coragem nos sofrimentos, se tornassem ainda mais fervorosos para confessar a Cristo, tornando-se testemunhas também desta verdade: os que matam o corpo, nada mais podem fazer26. Qualquer que seja o tratamento imposto aos corpos sem vida, em nenhum efeito resultará pois sendo o corpo desprovido de vida, que se separou dele, nada mais pode sentir. E aquele que o criou nada pode perder.

Mas enquanto tratavam com tanta crueldade os corpos das vítimas - e os mártires suportavam com grande coragem tais tormentos - entre os irmãos erguia-se grande lamentação. Estavam aflitos por não terem a liberdade para prestar os deveres fúnebres aos santos, como é de justiça. A vigilância dos guarda proibia-os de subtrair às escondidas algum resto mortal desses mártires, como nos atesta a mesma História27.

Após sua morte, os mártires não padeciam mais nenhum sofrimento, nem mesmo do esfacelamento dos seus membros, nem das chamas que transformaram em cinzas os seus ossos, e nem da dispersão destas cinzas. Mas os cristãos eram atormentados por grande dor e piedade por não poderem sepultar a mínima porção de suas relíquias. Eles sentiam em sua misericordiosa compaixão todos os sofrimentos que aqueles mortos não mais podiam experimentar.

CAPÍTULO IX

Foi graças a esse sentimento de misericordiosa compaixão, que acabo de citar, que o rei Davi louvou e bendisse aqueles que caridosamente forneceram uma sepultura aos ossos secos de Saul e Jônatas28.

Mas que tipo de caridade se pode testemunhar para com aqueles que nada mais sentem? Seria, por acaso, retornar àquela concepção de que os falecidos privados da sepultura não podem cruzar o rio do Hades29? Rejeitamos essa idéia contrária à fé cristã! De outra maneira, teríamos que considerar que o pior castigo imposto aos mártires fora justamente o fato de terem sido privados da sepultura e, nesse caso, a Verdade os teria enganado ao dizer: “Não temais aqueles que matam o corpo e depois disso nada mais podem fazer”30, pois seus perseguidores teriam conseguido impedir-lhes de chegar à morada tão desejada.

Isso tudo é de uma falsidade evidente: os fiéis nada sofrem por estarem privados da sepultura da mesma forma como os infiéis nada aproveitam por a receberem.

Perguntemo-nos, então, por que aqueles que enterraram Saul e seu filho Jônatas foram louvados, por executarem uma obra de misericórdia, e abençoados pelo piedoso rei Davi31…

Ocorre que os corações piedosos obedecem a uma boa inspiração quando, levados pelo sentimento de que “ninguém odeia a própria carne”32, sofrem ao verem os cadáveres dos outros receberem maus cuidados, pois não gostariam que seu próprio corpo sem vida recebessem tal tratamento. E o que desejam que lhes proporcionem quando não mais existirem, cuidam de proporcionar aos que já não existem, enquanto eles mesmos ainda gozam dos sentidos.

CAPÍTULO X

Também nos são relatadas várias aparições, que não podemos neglengenciar de abordar na presente dissertação.

Fala-se que certos falecidos manifestaram-se a pessoas vivas durante o sono ou através de outro modo. E à essas pessoas, que ignoravam o lugar onde jazia os cadáveres insepultos, os mortos indicavam os lugares e pediam para que lhes providenciasse a sepultura da qual foram privados.

Dizer que tais visões são falsas parece-nos afrontar e contradizer testemunhos escritos de alguns autores cristãos, bem como a íntima convicção que têm as pessoas que testemunharam tais fatos. Eis, portanto, a resposta mais sensata: não é necessário pensar que os falecidos agem na realidade, quando parecem dizer, indicar ou pedir em sonho aquilo que nos é relatado, pois muitas vezes as pessoas vivas também aparecem em sonhos, sem disso terem consciência. E será dessas mesmas pessoas a quem apareceram nos sonhos que saberemos terem dito ou feito tal ou tal coisa durante a visão… Portanto, alguém pode me ver, durante o sonho, anunciando certo acontecimento passado ou predizendo um fato futuro, sendo que eu mesmo ignore totalmente a coisa, sem poder questionar o próprio sonho que o outro teve, ou se ele estava acordado enquanto eu dormia, ou se ele dormia enquanto eu estava acordado, ou se nós dois estávamos dormindo ou acordados ao mesmo tempo ao ter ele o sonho em que me via.

Logo, o que há de estranho nos vivos verem os mortos em sonhos, que nada sabem ou sentem, dizendo certas coisas que, ao acordarem, percebem que são verdadeiras? Eu estou mais inclinado a crer na mediação dos anjos, que receberiam do alto a permissão ou a ordem de se manifestarem em sonhos para indicar os corpos a serem enterrados, sendo que aqueles que viveram nesses corpos tudo ignoram a esse respeito.

Essas aparições podem ter sua utilidade, seja para o consolo dos vivos - que vêem a imagem dos seus falecidos queridos - seja para recordar aos homens o dever de humanidade que é o sepultamento dos falecidos. Isso não traz auxílio para os mortos, mas a sua negligência poderia ser classificada de impiedade culposa.

Algumas vezes ocorrem visões que levam a cometer erros grosseiros aqueles que as tiveram. Imaginemos alguém que teve o mesmo sonho que Enéas33… O poeta afirma ter visto no Inferno, em visão poética e falaciosa, a imagem de um morto que não fora sepultado e põe a mensagem na boca de Palinuro; e quando Enéas acorda, procura e encontra o corpo do defunto no exato lugar em que jazia, como soubera pelo aviso que teve no sonho, e o sepulta conforme o pedido que recebera no mesmo sonho. Como a realidade era igual à que teve no sonho, passou a crer que é necessário sempre enterrar os mortos para que seja permitido às almas atingirem a sua última morada. Sonhou, assim, que as leis do Inferno nos impedem de entrar na morada eterna enquanto os nossos corpos não recebem uma sepultura. Ora, se algum homem adotar tal crença, não estará ele se afastando demais do caminho da Verdade?

CAPÍTULO XI

O homem é tão fraco que crê que viu a alma de alguém caso este morto lhe apareça em sonho. Mas se sonha com uma pessoa viva, fica-se demonstrado que não viu nem o corpo nem a alma dela, mas somente a sua imagem, como se os mortos não pudessem aparecer do mesmo modo que os vivos, sob a forma de imagens semelhantes.

Eis a narração de um fato que ouvi em Milão: certo credor reclamava o pagamento de um dívida e exibia a cautela assinada por um senhor recém-falecido ao seu filho, que ignorava que o pai havia efetuado o pagamento do empréstimo [antes de falecer]. O jovem, muito aborrecido, estranhava o fato de seu pai não ter-lhe falado nada sobre a existência dessa dívida, embora o testamento tenha sido feito. Em sua extrema angústia, eis que vê o seu pai aparecer-lhe em sonho indicando o lugar onde se encontrava o recibo que anulava a cautela; ao encontrar o recibo, mostrou-o ao credor e anulou a reclamação mentirosa, recuperando o documento assinado que não fora devolvido a seu pai quando do pagamento da dívida.

Eis aí um fato em que se supõe que a alma do defunto tenha se preocupado com o seu filho, vindo a seu encontro enquanto dormia, para avisar-lhe o que este ignorava, livrando-o de uma séria preocupação.

Praticamente na mesma época em que me contaram esse fato, enquanto eu ainda residia em Milão, aconteceu a Eulógio, ótimo professor de Cartago e meu discípulo nessa arte, como ele mesmo me recordou, o seguinte acontecimento (que ele próprio me narrou quando retornei à África): ele estava fazendo um curso sobre as obras de Cícero e preparava uma lição sobre certa passagem obscura que não conseguia compreender. Tal preocupação não o deixava dormir, mas eis que, de repente, eu lhe apareço durante o sono e explico-lhe as frases que lhe eram incompreensíveis. Ora, certamente não era eu, mas a minha imagem - sem eu o saber! Eu estava bem longe, do outro lado do mar, ocupado com um outro trabalho ou talvez dormindo, sem sentir qualquer tipo de preocupação com as dificuldades dele…

Como, então, se produziram tais fenômenos? Não sei. Mas seja como for, por que razão devemos acreditar que os mortos nos aparecem em sonhos, na mesma forma de imagem, como acontece com os vivos? Uns e outros ignoram completamente serem objeto de aparições e também não se preocupam em saber para quem, onde e quando aconteceram.

CAPÍTULO XII

Algumas visões, ocorridas durante o estado de vigília, são semelhantes aos sonhos. Acontecem a pessoas que estão com os sentimentos conturbados, como os frenéticos e os loucos de todo gênero. Conversam consigo mesmos, como se falassem com outras pessoas presentes ou ausentes, vivas ou falecidas, cujas imagens aparecem-lhes à frente dos olhos. Mas os vivos não sabem que essas pessoas imaginam estar conversando com eles, já que de fato não se encontram lá, nem falam nada. Essas visões imaginárias surgem da perturbação dos sentidos. Do mesmo modo, aqueles que já deixaram esta vida aparecem a pessoas que têm o cérebro perturbado, como se estivessem presentes, sendo que, de fato, não estão lá, mas bem longe, e nem supõem que alguém tenha percebido as suas imagens em uma visão imaginária.

Abordemos um outro fato semelhante: existem pessoas que ficam sem o domínio dos sentidos ainda mais do que ao dormir. Absorvidas que ficam em suas visões imaginárias, julgam ver vivos e mortos. Ao retornar ao uso da razão, declaram os nomes dos falecidos que viram, e as pessoas que os escutam acreditam que realmente tal fato se verificou. Os ouvintes, contudo, não percebem que nessas mesmas visões apareceram pessoas vivas que não estiveram lá de verdade e que sequer souberam do ocorrido.

Isso aconteceu com um homem chamado Curma, habitante de Tullium, município próximo a Hipona, que era membro do Conselho Municipal, pequeno magistrado da aldeia e simples camponês. Caindo doente, entrou em profundo estado de letargia e ficou como que morto durante vários dias; como exalava pouquíssimo ar pelas narinas, indicando um grau mínimo de vida, não foi sepultado; mas não mexia nenhum membro e seus olhos e outros sentidos permaneciam insensíveis a qualquer tipo de estímulo. Mesmo assim, tinha visões como aqueles que dormem e as contou alguns dias depois, quando se libertou do sono. Assim disse quando abriu os olhos: “Vão imediatamente à casa do Curma ferreiro e vejam o que está acontecendo por lá”. Ao chegarem lá, ficaram sabendo que esse Curma havia falecido no exato momento em que o primeiro saía do estado letárgico e retornava à vida com sentidos. Interessados pelo ocorrido, os assistentes interrogaram-no e ele lhes disse que o Curma ferreiro havia recebido ordem de comparecer perante Deus no mesmo momento em que ele havia sido reenviado para este mundo. Lá, no outro mundo que voltara, ficara sabendo que não era o Curma da Cúria Municipal que deveria se apresentar à mansão dos mortos, mas o Curma ferreiro. Nas visões que teve durante os sonhos, o Curma da Cúria Municipal reconheceu entre os mortos alguns vivos que conhecera aqui, sendo tratados de acordo com os méritos que cada um teve durante a vida.

Eu talvez acreditaria nessa história se todas as pessoas que viu fossem realmente falecidas, isto é, se o doente não tivesse visto em seus sonhos outras pessoas que ainda vivem, como, por exemplo, clérigos da sua região e, entre outros, um padre que lhe disse para se batizar em Hipona, a quem ele respondeu: “Eu já fui batizado”. Portanto, em sua visão, ele percebera também padres, clérigos e eu mesmo, ou seja, seres vivos. E entre estes, vira outros mortos.

Portanto, por que não havemos de crer que ele viu esses mortos da mesma forma como viu a nós, isto é, viu uns e outros sem que ninguém soubesse disso e estando todos eles distantes? Pois tivera para si uma rerpresentação imaginária de pessoas e lugares; ele viu a propriedade onde aquele padre morava com seus clérigos, viu Hipona onde eu o tinha batizado - como alegara. Mas, de fato, ele não estivera nesses lugares onde tinha a ilusão de ter estado; ele ignorava o que aí se fazia no momento da visão. Se ele realmente tivesse estado ali, certamente saberia o que ali se fazia. Portanto, foi uma espécie de visão em que os objetos não se apresentam como são na realidade, mas sob a sombra de suas imagens.

Finalmente, esse homem ainda contou que, na última das suas visões, ele fora levado ao Paraíso e lá lhe disseram, antes de o devolverem aos seus: “Ide e faze-te batizar se quiserdes um dia estar nesta morada de bem-aventurados”. Avisado de receber o batismo de minhas mãos, ele respondeu que já o recebera, mas a voz que lhe falava insistiu: “Ide e faze-te batizar realmente porque o teu batismo é imaginário”. Assim, após sua cura, ele veio a Hipona próximo do tempo da Páscoa; e fez-se inscrever na lista dos aspirantes [ao batismo], sendo desconhecido de mim e de muitos outros. Não confiou suas visões a mim ou a outros padres… Recebeu o batismo e, terminados os dias santos, retornou para a sua casa. Fiquei sabendo da história dois anos depois - ou até mais - por um amigo comum que foi fazer uma refeição em minha casa, quando falávamos sobre esse tipo de assunto. Mais tarde, consegui, depois de muita insistência, que me contasse a história, na presença de seus concidadãos, gente honrada, que se apresentaram como testemunhas da realidade dos fatos: a sua estranha doença, seus longos dias de morte aparente, o caso do outro Curma, ferreiro - conforme narrado acima -, enfim, todos os pormenores que se lembrava. E todos testemunharam já terem ouvido essa narração de sua boca, à medida que ele a divulgava.

Conclui-se, assim, que ele vira seu batismo, a mim, Hipona, a basílica e o batistério não na realidade, mas na imagem, da mesma forma como vira outras pessoas vivas, sem que elas tenham percebido isto. Logo, por que não admitir que ele viu os mortos sem que estes tenham percebido?

CAPÍTULO XIII

Por que não podemos atribuir a anjos essas operações permitidas pela Providência Divina, que sabe se servir sabiamente dos bons e dos maus, conforme a inescrutável profundidade de seus julgamentos? Essas visões podem servir tanto para instruir quanto para enganar os vivos, para consolá-los ou assustá-los, sendo cada um tratado com misericórdia ou com rigor por aquele que a Igreja não celebra em vão “a misericórdia e a justiça”34.

Entenda como quiser isto que vou falar agora: se acaso os mortos intervissem nos problemas dos vivos, aparecendo-nos e falando-nos durante o sono, a minha piedosa mãe (para não falar de outras pessoas) não me abandonaria uma noite sequer, pois ela sempre me seguiu por terra e mar, sempre partilhou comigo a sua vida. Para mim é difícil crer que uma vida mais feliz a tornou indiferente para comigo, a ponto de não mais me consolar nas tristezas, justo eu que fui seu grande amor e a quem ela jamais quis ver triste!

Certamente as palavras do Salmo são verdadeiras: “Meu pai e minha mãe me abandonaram, mas o Senhor me acolheu”35.

Ora, se os nossos pais nos abandonaram, como podem eles se interessarem por nossos problemas? E se ficam indiferentes, que outros mortos poderiam se inquietar pelo que fazemos ou sofremos? Assim declara o profeta Isaías: “Porque tu é que és o nosso Pai. Abraão não nos conheceu, nem Israel soube de nós”36.

Se os grandes patriarcas desconheceram o destino do povo do qual eram a fonte e cuja raça saiu como fruto de sua fé em Deus, como seria possível aos mortos intervir, para conhecer e proteger nos negócios e empreendimentos dos vivos? E como poderíamos declarar bem-aventurados os santos que morreram antes das nossas infelicidades se eles continuassem sensíveis às desolações da vida humana? Acaso não estaríamos enganados se disséssemos que eles se encontram em um lugar de absoluta tranquilidade se porventura eles se inquietassem com a atormentada existência dos vivos? O que significaria, então, esta promessa feita por Deus em benefício do piedoso rei Josias, de que ele morreria antes dos males que estavam para se abater sobre sua nação e seu povo, para que não sentisse tristeza de ver tal tragédia? Eis a Palavra de Deus: “Direis ao rei de Judá que vos enviou a consultar o Senhor: ‘Eis o que diz o Senhor Deus de Israel: como ouviste as palavras do livros e o teu coração se atemorizou a ponto de te humilhares diante do Senhor, após ouvir as palavras contra esta terra e seus habitantes, que virão a ser objeto de espanto e reprovação, e também por rasgardes as vestes e chorardes diante de Mim, eu te escutei - diz o Senhor - e por isso te farei descansar com teus pais e sereis sepultado em paz, para que teus olhos não vejam o mal que farei cair sobre esta terra”37.

Aterrorizado por essas ameaças de Deus, Josias chorou e rasgou suas vestes, mas a certeza de que sua morte precederia as desgraças que estavam por vir, bem como a certeza de que fora chamado a gozar a paz no repouso, sem ter que ver aqueles males, devolveram-lhe a serenidade da alma.

Portanto, as almas dos mortos encontram-se em um lugar onde não podem ver o que se passa ou acontece aos homens da terra. E como poderiam partilhar das misérias dos vivos se estão a suportar as próprias penas, caso as tenham merecido, ou estão em paz repousando, como foi prometido a Josias? Aí não sofrem nem por si, nem por outros, pois se livraram de todas as penas por suportarem a dor pessoal e a compaixão por outrem quando viviam sobre a terra.

CAPÍTULO XIV

Alguém me dirá por objeção: se os mortos não se interessam pelos vivos então porque aquele rico que passava tormentos no Inferno suplicou a Abraão para que enviasse Lázaro a seus cinco irmãos vivos, para convencê-los a mudar de vida e, assim, evitarem aquele lugar de sofrimentos?38. Será que é possivel deduzir dessa passagem que ele sabia o que seus irmãos faziam ou sofriam nesse tempo? Estava ele preocupado com os vivos, sem saber o que faziam, da mesma forma como nos preocupamos com os mortos, sem sabermos o que fazem? Na verdade, se não nos interessássemos por eles, também não oraríamos na intenção deles. Aliás, Abraão não enviou Lázaro à terra, mas respondeu ao condenado que seus irmãos tinham Moisés e os profetas; deveriam ouvi-los se desejassem escapara daqueles suplícios…

Neste ponto, pode-se novamente objetar: “como poderia Abraão ignorar o que se passava sobre a terra, já que sabia viver Moisés e os profetas, isto é, seus escritos, e que, seguindo-os, escapariam dos tormentos do Inferno? Ele não sabia também que o rico havia gozado as delícias e que o pobre Lázaro vivera na miséria e no sofrimento, pois disse: ‘Filho, lembra-te de que recebeste teus bens em vida e Lázaro, por sua vez, os males’39? Logo, Abraão conhecia os fatos referentes aos vivos e não aos mortos”. É certo, mas esses fatos ele podia não ter conhecimento no momento em que ocorreram, mas após o falecimento dos dois e sob as indicações do próprio Lázaro. Desse modo, a palavra do profeta não está desmentida: “Abraão não nos conheceu”40.

CAPÍTULO XV

Convenhamos que os mortos ignoram o que acontece na terra, pelo menos no momento em que ocorrem. Pode vir a conhecer mais tarde, por intermédio daqueles que vão ao seu encontro, uma vez falecidos. Certamente, não ficam sabendo de tudo, mas apenas aquilo que lhe for autorizado saber e que têm necessidade de saber.

Os anjos, que velam sobre as coisas deste mundo, também podem lhes revelar alguns pontos que julguem convenientes a cada um, por Aquele que tudo governa, pois se os anjos não tivessem o poder de estarem presentes tanto na morada dos vivos quanto na dos mortos, o próprio Senhor Jesus não teria dito: “Aconteceu que o pobre [Lázaro] morreu e foi levado pelos anjos ao seio de Abraão”41. Eles estão, assim, ora na terra, ora no céu, já que foi da terra que levaram aquele homem que Deus os confiou.

As almas dos mortos também podem conhecer alguns acontecimentos aqui da terra por revelação do Espírito Santo, acontecimentos estes cujo conhecimento seja necessário. E isto não se restringe somente a fatos passados ou presentes, mas também futuros. É assim que os homens - não todos, mas apenas os profetas - conheceram durante sua vida mortal, não todas as coisas, mas apenas aquelas que a Providência Divina julgava bom lhes revelar.

A Sagrada Escritura atesta-nos que alguns mortos foram enviados a certas pessoas vivas e, da mesma forma, algumas pessoas foram até a morada dos mortos: Paulo foi arrebatado até o Paraíso42; e o profeta Samuel, após sua morte, apareceu a Saul, ainda vivo, e lhe predisse o futuro43. É bem verdade que alguns não admitem que tenha sido Samuel que apareceu, já que sua alma não acatava a tais procedimentos mágicos, como dizem. Julgam, assim, que foi outro espírito que se submete a essa arte maléfica que se revestiu de uma imagem semelhante a dele. Mas o livro do Eclesiástico, atribuído a Jesus, filho de Sirac - cujas semelhanças de estilo poderiam ser do próprio Salomão -, relata-nos um elogio aos Patriarcas onde afirma que “Samuel profetizou mesmo depois de morrer”44, e isto não poderia se referir a outra coisa a não ser essa aparição do defunto Samuel a Saul. Alguém poderia discutir a autoridade desse livro, sob o pretexto de que não se encontra no cânon dos hebreus, mas existe um outro texto que nos convida a admitir esse envio de mortos aos vivos: trata-se da passagem das aparições de Moisés e Elias no [monte] Tabor. O que dizer de Moisés, cujo livro do Deuteronômio nos certifica da sua morte45, aparecendo vivo ao lado de Elias - que não morreu - como lemos no Evangelho?46

CAPÍTULO XVI

Tudo o que foi escrito até agora serve para resolvermos esta questão: como os mártires que se interessam pelas coisas humanas se manifestam, atendendo as nossas orações, uma vez que os mortos ignoram o que fazem os vivos?

Com efeito, sabemos, não por vagos rumores, mas por testemunhas dignas de fé, que o confessor Félix - cujo túmulo tu veneras piedosamente como santo asilo - deu não apenas mostras de seus benefícios, mas até de sua presença, ao aparecer aos olhos dos homens durante o cerco da cidade de Nola pelos bárbaros.

Esses fatos excepcionais acontecem graças à permissão divina e estão longe de entrar na ordem normalmente estabelecida para cada espécie de criatura. Não podemos concluir pelo fato da água ter se transformado em vinho pela palavra do Senhor47, que a água tenha poder de operar por si mesma essa transformação pela propriedade natural de seus elementos, visto que tratou-se de uma operação divina excepcional e até única! Também o fato de Lázaro ter ressuscitado48 não significa que todo morto possa se levantar quando quiser ou que possa ser normalmente acordado como qualquer homem adormecido. Uns são os limites do poder humano; outras são as marcas do poder divino. Uns são fatos naturais; outros, miraculosos, ainda que Deus esteja presente na natureza para a manter na existência e a natureza tenha seu lugar inclusive para os milagres.

Assim, é necessário não crer que todos os defuntos - sem excessão - podem intervir nos problemas dos vivos apenas pelo fato de que os mártires tenham obtido curas ou prestado outros socorros. É preciso compreender, ao invés, que é por causa do poder de Deus que os mártires intervêem nos nossos interesses, pois os mortos não possuem tal poder por sua própria natureza.

Há, porém, uma questão que ultrapassa os limites da minha inteligência: como os mártires, que sem sombra de dúvida socorrem seus devotos, aparecem… em pessoa e no mesmo momento? em vários lugares e afastados uns dos outros? sua ação se faz notar apenas onde se encontra o seu túmulo ou em qualquer outro lugar? se permanecem confinados na morada reservada a seus méritos, longe de qualquer relacionamento com os mortais, contentam-se em interceder pelas necessidades daqueles que lhes suplicam? oram da mesma forma que nós oramos pelos mortos, sem estar presentes e sem saber onde estão e o que fazem?

Não será Deus, o Deus onipotente e onipresente, que não se acha confinado em nós e muito menos afastado de nós, que atende as orações dos mártires, servindo do ministério dos anjos, cuja ação se estende sobre todas as coisas, para distribuir o consolo aos homens que Ele julga ser necessário para enfrentar as misérias da vida presente? Não será Ele que, com poder admirável e infinita bondade, faz resplandecer os méritos dos mártires onde Ele o quer, quando quer, como quer, especialmente nos locais onde se ergueram suas sepulturas, por saber que a lembrança dos sofrimentos suportados em confissão a Cristo, nos é útil para nos confirmar na fé?

Repito: esta é uma questão muito elevada e complexa para mim, de forma que não a posso explicá-la a fundo… Dessas duas hipóteses que indiquei, qual será a verdadeira? Talvez os dois processos sejam empregados em conjunto, de maneira que, às vezes, os mártires nos atendem com sua presença pessoal, e, às vezes, por intermédio dos anjos que tomam a sua forma. Não ouso decidir e preferiria esclarecer-me junto a homens sábios que conheçam o assunto. Não digo que ignore ou imagine que saiba pois é impossível que não haja alguém que saiba porque Deus, em suas liberalidades, concede certos dons a alguns e outros dons a outros, conforme o ensino do Apóstolo que diz que a ação do Espírito Santo manifesta-se em cada um de acordo com uma utilidade comum. Eis o que diz Paulo:

“Cada um recebe o dom de manifestar o Espírito para utilidade de todos. A um, o Espírito dá a mensagem da sabedoria; a outro, a palavra da ciência segundo o mesmo Espírito; a outro, o mesmo Espírito dá a fé; a outro, ainda, o único e mesmo Espírito concede o dom das curas; a outro, o poder de fazer milagres; a outro, a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos; a outro, o dom de falar em línguas; a outro, ainda, o dom de as interpretar. Mas tudo isso é realizado pelo único e mesmo Espírito, que distribui os seus dons a cada um conforme lhe apraz”49.

Ora, entre todos esses dons elencados pelo Apóstolo, quem recebeu o dom do discernimento dos espíritos é que conhece essas questões - que agora tratamos - da forma como é necessário conhecer.

CAPÍTULO XVII

Creio que esse é o caso do famoso monge João, a quem o imperador Teodósio Magno consultou a respeito de uma guerra civil. De fato, ele possuía o dom da profecia… Mas eu não duvido que os dons [do Espírito] sejam distribuídos um por pessoa, isto é, acho que é possível a uma mesma pessoa receber diversos dons.

Certa vez, esse monge João soube que uma mulher muito piedosa desejava vê-lo. Então, através de seu marido, ela insistiu em marcar uma entrevista, mas ele recusou, como costumava a fazer quando se tratava de mulheres. Contudo, disse ao marido: “Ide e dize à tua esposa que ela me verá esta noite durante o sono”. E, de fato, ela o viu dando-lhe conselhos convenientes a uma mulher cristã casada. Quando acordou, essa mulher contou tudo a seu marido, que conhecera pessoalmente esse homem de Deus e o reconheceu tal como ela o descreveu. O casal, então, revelou esse fato a um senhor que me comunicou, senhor esse sério, nobre e digno de fé.

Ora, se me fosse possível encontrar esse santo monge que, como me disseram, se deixava interrogar pacientemente, sabendo responder tudo com grande sabedoria, perguntar-lhe-ia algo que nos interessa aqui: se ele realmente se apresentou a essa mulher que dormia, pessoalmente, sob os traços aparentes do seu corpo, tal como os nossos corpos se apresentam a nós mesmos durante nossos sonhos; ou se a visão ocorreu pelo ministério dos anjos ou outra modalidade, enquanto ele mesmo fazia outra coisa ou até mesmo dormia, tendo seus próprios sonhos… E, caso confirmasse esta segunda hipótese, perguntar-lhe-ia se foi por uma revelação do Espírito de profecia que pôde prometer sua aparição naquela noite, durante o sonho da mulher.

Ora, se ele se apresentou pessoalmente em sonho à mulher, ele o fez por uma graça extraordinária e não por meios naturais, isto é, por um dom de Deus e não por seu próprio e natural poder. Mas, se essa mulher o viu enquanto ele fazia uma outra coisa (por exemplo: estivesse ele dormindo e tendo seus próprios sonhos), o fato se assemelhará ao que lemos nos Atos dos Apóstolos, quando o Senhor Jesus, falando a Ananias sobre Saulo, revela-lhe que Saulo vê Ananias ir até ele, ao passo que este nada sabia sobre isso50.

Porém, qualquer que fosse a resposta dada pelo monge João, esse homem de Deus, às minhas perguntais, eu ainda o teria questionado sobre os mártires. Perguntar-lhe-ia se eles aparecem pessoalmente durante o sono ou outro modo, sob figura que lhes apraz. E perguntaria, principalmente, como explicar o fato de dêmonios que habitam pessoas possessas queixarem-se de ser atormentados pelos mártires, a ponto de suplicarem que sejam poupados. Ainda lhe perguntaria se a sua intervenção se produz por ordem de Deus e pelo ministério dos anjos, para a glorificação dos santos e utilidade dos homens, já que os mártires encontram-se em repouso, longe de nós, em visões mais altas, contentando-se em orar por nossa intenção. De fato, em Milão, junto à sepultura de Gervásio e Protásio, quando se pronunciava os nomes desses heróis e dos falecidos comemorados com eles, os demônios gritavam o nome de Ambrósio, que ainda era vivo, suplicando-lhe que os poupasse. E o bispo encontrava-se longe dali, ignorando o que se passava e entretido com outras ocupações…

Será que podemos pensar que os mártires às vezes agem por presença efetiva e outras vezes pelos ministérios dos anjos? Podemos discernir o modo empregado por eles? Sob quais sinais podemos reconhecer isso? Somente quem recebeu esse dom do Espírito Santo é que pode discernir, pois é o Espírito que distribui os favores particulares a cada um, conforme lhe apraz.

Creio que o monge João, a meu pedido, poderia me esclarecer sobre essas dificuldades. Em sua escola eu poderia aprender o verdadeiro e correto conhecimento, ou até mesmo poderia crer - mesmo sem o compreender - naquilo que me afirmasse saber com certeza. Talvez até ele me responderia com as seguintes palavras da Escritura:

“Não procures saber o que excede a tua capacidade e não especules o que ultrapassa as tuas forças; mas creia sempre no que Deus te mandou”51.

Com gratidão, eu também acolheria esse conselho, pois não é de pouco proveito, nas coisas obscuras e incertas - e que não podemos compreender, adquirir a convicção clara e correta de que elas não devem ser investigadas, ou seja, convencer-se de que não é nocivo ignorar aquilo que se quer saber, imaginando que poderíamos tirar proveito em o saber.

CAPÍTULO XVIII

Conforme o que expomos anteriormente, eis o que devemos pensar a respeito dos benefícios prestados aos mortos a quem dedicamos os nossos cuidados: nossas súplicas só lhes serão proveitosas se forem oferecidas de modo conveniente, no sacrifício do altar, em nossas orações e esmolas. Também é necessário dizer que [nossas súplicas] não serão proveitosas a todos a quem pretendemos ajudas, mas tão somente àqueles que tornaram-se dignos, durante a vida, de receber tal benefício. Contudo, como não podemos discernir quem sejam, convém apresentar súplicas a todos os regenerados, para que não omitemos alguém entre aqueles que possam se servir desses benefícios. Melhor ainda é que haja sobras dessas boas obras, mesmo oferecidas para aqueles que não podem se beneficiar delas, para que não venham a faltar para aqueles que podem tirar proveito. Entretanto, é mais natural que sejam oferecidas pelos amigos, a fim de que tais cuidados também sejam prestados mais tarde à nós.

Tudo o que se faz quanto ao sepultamento digno dos falecidos não é para obter a sua salvação, mas para cumprir um dever de humanidade, conforme o sentimento natural de que “ninguém odeia a sua própria carne”52. Portanto, é certo que se tenha pelo corpo do próximo o cuidado que ele próprio não pode mais se dar por ter deixado esta vida. E, já que esse cuidado é tido até mesmo por aqueles que negam a ressurreição da carne, nada mais justo que aqueles que crêem [na ressurreição] o façam ainda com maior solicitude. Assim, que o cuidado tributado a esse corpo sem vida - mas que haverá de ressuscitar e permanecer por toda a eternidade - se constitua no testemunho claro dessa mesma fé.

Quanto à sepultura próxima ao túmulo dos mártires, eis a única utilidade que me parece trazer para o defunto: colocando-a sob a proteção dos mártires, ela torna mais viva a caridade daqueles que oram por ele.

Tais são as respostas que posso apresentar às tuas questões. Desculpa-me se me estendi por demais, mas isso decorre do prazer e afeição que sinto ao conversar contigo. Peço-te que me escrevas, para que eu possa conhecer as impressões que Vossa Venerável Caridade sentiu ao ler este trabalho.

Sem sombra de dúvida, o portador desta carta torna-la-á mais agradável. Trata-se do nosso irmão no sacerdócio, Candidiano, que conheci por ter-me trazido as tuas cartas. Acolhi-o de corações e vejo-o partir com pesar, pois sua presença na caridade de Cristo foi grande consolo para mim. Graças à sua insistência - devo confessar - vi-me obrigado a responder-te, pois o meu coração está sobrecarregado por muitas e muitas preocupações; se ele não me lembrasse frequentemente, certamente teria me esquecido e o teu pedido ficaria sem resposta.

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Notas:
1cf. 2Cor 5,10.
2cf. 2Mc 12,43.
3Virgílio, “Eneida” VI,327-328: “Nec ripas datur horrendas, nec rauca fluenta transportare prius quam sedibus ossa quierunt”.
4cf. Mt 10,30.
5cf. Lc 12,4.
6cf. Sto. Agostinho, “A Cidade de Deus” I,12-13.
7cf. Lc 21,18.
8cf. Mt 10,28.
9cf. Sl 78,2-3.
10cf. Sl 115,15.
11v. Lc 16,22.
12Lucano, “Farsália”,VIII: “Coelis tegitur, qui non habet urnam”.
13cf. 1Cor 15,52.
14cf. Gn 25,9; 35,29; 47,30; 50,2.13.
15cf. Tb 2,9; 12,12.
16cf. Mt 26,10-13.
17cf. Jo 19,38-42.
18Sto. Agostinho, “A Cidade de Deus” I,12-13.
19Clara menção à Missa de Finados.
20Através da ressurrreição.
21Lc 12,4.
21cf. Ef 5,29.
22cf. 1Rs 13,21-22.
23cf. 1Cor 11,31-32.
24v. nota 21.
25cf. 1Rs 13,24.
26cf. Lc 12,4.
27Eusébio de Cesaréia, “História Eclesiástica” V,1,61.
28cf. 2Sm 2,4-6.
29Virgílio, “Eneida” VI.
30v. nota 26.
31v. nota 28.
32v. nota 21.
33Virgílio, “Eneida” VI,337.
34cf. Sl 100,1.
35cf. Sl 26,10.
36cf. Is 63,16.
37cf. 2Rs 22,18-20.
38cf. Lc 16,27.
39cf. Lc 16,25.
40v. nota 36.
41cf. Lc 16,22.
42cf. 2Cor 12,2.
43cf. 1Sm 28,15-19.
44cf. Eclo 46,23.
45cf. Dt 34,5.
46cf. Mt 17,3.
47cf. Jo 2,9.
48cf. Jo 11,44.
49cf. 1Cor 12,7-11.
50cf. At 9,12.
51cf. Eclo 3,22.
52cf. Ef 5,29.

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