Sexta-feira, Novembro 15, 2024

Os Pais da Igreja e o batismo das crianças

 INTRODUÇÃO

O batismo de crianças é uma prática antiga da Igreja, que foi instituída pelos apóstolos. Desta vez eu quero estudar a evidência que nos foram deixados pela Igreja ao longo da história em favor deste sacramento, no qual fomos sepultados com Cristo na sua morte, para que, como Cristo foi ressuscitado dos mortos pela glória do Pai, também nós vivamos uma vida nova. Vou tentar também tratar brevemente quais têm sido ao longo dos séculos as heresias que tem colocado obstáculos contra o fato das crianças serem regeneradas no nascimento da água e do espírito.

 

O BATISMO DE CRIANÇAS NOS PADRES DA IGREJA NOS SÉCULOS I A IV

Nos primeiros quatro séculos da era cristã, é completa a unanimidade a respeito (Tertuliano sendo praticamente a única exceção). Há inúmeros relatos de pais da igreja que falam sobre a importância do batismo infantil. Havia, claro, quem optava por rejeitá-lo, mas por razões imorais, para não abandonar a vida pecaminosa e obter o perdão dos pecados apenas na hora da morte (muito tolo porque ninguém sabe quando vai morrer ou se vai ter a oportunidade de ser batizado), ou até mesmo se livrar das penitências que fariam se eles caíssem em pecado depois do batismo.

 

IRENEU DE LYON (130 – 202 D.C)

Ecoa a fé da Igreja primitiva, que professava que todo homem nasce na carne e, portanto, deve nascer da água e do espírito, o qual inequivocamente interpretava como o batismo, com o qual se obtinha também a remissão dos pecados.

Não foi por nada que Naamã de idade, sofrendo de lepra, foi purificada por ser batizada, mas para dizer-nos que, como leprosos no pecado, somos purificados por meio da água sagrada e a invocação do Senhor, de nossas transgressões, sendo espiritualmente regenerados como os bebês recém-nascidos, quando o Senhor disse: ‘Se alguém não nascer de novo da água e do Espírito, não entrará no reino dos céus.”[1]

Ao longo dos escritos deste e de outros pais se verá como em nenhum momento restringem a graça e dons de Deus para alguém, se as crianças, adolescentes ou adultos. No texto a seguir, embora não seja uma referência explícita ao batismo de crianças, nós encontrarmos a crença de que Deus pode derramar a sua graça e santificar todos, independentemente, se tem idade para acreditar ou não (rejeitando mais de um milênio antes os argumentos utilizados pelos anabatistas).

Porque Ele veio para salvar a todos: digo a todos, ou seja, todos aqueles renasceram a Deus sejam eles bebês, crianças, adolescentes, jovens ou adultos. Então, quis passar por todas as idades: fez-se bebê como os bebês para santificar os bebês; criança como as crianças, a fim de santificar aos de sua idade, dando-lhes um exemplo de piedade, e sendo para eles modelo de justiça e obediência; se fez jovem como os jovens, para dar aos jovens, exemplo, e santificá-los para o Senhor.” [2]

 

 

ORÍGENES  DE ALEXANDRIA (185 – 254 D.C.)

O Testemunho de Orígenes é crucial, não só porque, como outros pais, explica por que é necessário batizar as crianças, mas por seu testemunho explícito de que esta era uma prática que a Igreja recebeu diretamente dos apóstolos. Orígenes confirmaram previamente com sua caneta o que a arqueologia comprovaria ao encontrar provas do batismo de crianças pela Igreja primitiva.

A Igreja recebeu dos Apóstolos o costume de administrar o batismo até mesmo para crianças. Pois aqueles a quem foram confiados os segredos dos mistérios divinos sabiam muito bem que todos carregam a mancha do pecado original, que deve ser lavada com água e o espírito.” [3]

Se as crianças são batizadas “para a remissão dos pecados” cabe uma pergunta: de que pecados se tratam? Quando eles poderiam pecar? Como podemos aceitar tal testemunho para o batismo de crianças, a menos que se admita que ‘ninguém está sem pecado, mesmo quando sua vida na terra não tenha durado mais que um dia’?. As manchas do nascimento são removidas pelo mistério do batismo. Se batiza crianças porque ‘se alguém não nascer da água e do espírito, é impossível entrar no reino dos céus.’” [4]

Havia muitos leprosos em Israel nos dias do profeta Eliseu, mas nenhum deles foi purificado, senão Naamã, o sírio, que pertencia ao povo de Israel. Considere o grande número de leprosos que tinha até então ‘em Israel segundo a carne’. Veja, por outro lado, a espiritual Eliseu, nosso Senhor e Salvador, que purifica no mistério do batismo os homens cobertos pelas manchas da lepra e dirige-lhe estas palavras: ‘Levanta-te, vai ao Jordão, e a tua carne ficará limpa’. Naamã se levantou, foi tomar banho e cumpriu o mistério do batismo, ‘sua carne ficou como a carne de uma criança.’ Que criança? Daquele que ‘no banho de regeneração’ nasce em Cristo Jesus.” [5]

Se você gosta de ouvir o que os outros santos disseram sobre o nascimento físico, ouça Davi, quando ele diz: ‘Eu fui formado, assim diz o texto, em maldade, e minha mãe me concebeu no pecado’; mostra que toda alma que nasce em carne carrega a mancha da iniquidade e do pecado. É por isso que esta frase citada acima: Ninguém está livre de pecado, nem mesmo a criança que tem apenas um dia. Tudo isso pode ser adicionado a consideração da razão sobre o motivo que tem a Igreja para o costume de batizar crianças, pois este sacramento da Igreja seja para a remissão dos pecados. Certamente, se não houvesse crianças em necessidade de remissão e perdão, a graça do batismo pareceria desnecessária.” [6]

 

HIPÓLITO DE ROMA (? – 235 D.C.)

Um testemunho de singular importância, temos graças à Tradição Apostólica, que é uma das constituições eclesiásticas mais antigas e importantes da antiguidade (foi escrito por volta do ano 215). Nela encontramos instruções específicas sobre a administração do batismo, onde consta a prática de batizar crianças e como em virtude da fé dos pais poderiam ser batizados.

“Ao cantar do galo, se se começará a rezar sobre a água. Far-se-á assim a não ser que exista uma necessidade. Mas se houver necessidade permanente e urgente, se utilizará a água que se encontre. Desvestir-se-ão, e si batizarão as crianças em primeiro lugar. Todos os que puderem falar por si mesmos, falarão. Enquanto aos que não podem, seus pais falarão por eles ou alguém de sua família. Se batizará em seguida os homens e finalmente as mulheres

O Bispo impor as mãos dirá a invocação: “Senhor Deus, que os fizeste dignos de obter a remissão dos pecados pela lavagem da regeneração, tornai-os dignos de receber o Espírito Santo e enviar-lhes a tua graça, para que te sirvam seguindo a tua vontade; a ti a glória, Pai, filho e Espírito Santo na Santa Igreja, agora e por todos os séculos, Amém.” [7]

 

CIPRIANO DE CARTAGO (200 – 258 D.C.)

Tem-se a evidência de que durante a sua vida advertiu quem não batizava as crianças até o oitavo dia depois do nascimento, em semelhança a circuncisão, então se fez necessário que Cipriano, em seu nome e de 66 bispos, enviasse uma carta a Fido testemunhando a fé da Igreja a cerca de que o batismo das crianças não poderia ser atrasado e que elas poderiam ser batizadas a qualquer momento. A carta completa está disponível na WEB no Volume V do Ante-Nicene Fathers de Philip Schaff (protestante)  bem como na New Advent Encyclopedia.[8]

Porém em relação com o caso das crianças, na qual disse que não devem ser batizados no segundo diz ou terceiro dia depois do nascimento, e que a antiga lei da circuncisão deve ser considerada, pela qual pensa que alguém que de nascer não deve ser batizado e santificado dentro de 8 dias, todos nos pensamos de uma maneira muito diferente em nosso concílio. Por que neste curso que pensas tomar, nada está de acordo, se não que todos julgamos que a misericórdia e graça de Deus não devem ser negada a nenhum nascido do homem. Por que como disse o senhor em seu evangelho: “o Filho do Homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las.” Na medida em que possamos, devemos depois procurar que se possível, que nenhuma alma se perca…

Por outro lado, a fé nas escrituras divinas nos declaram que todos, sejam crianças ou maiores, temos a mesma igualdade nos dons divinos…

A razão pela qual cremos que ninguém deve ser impedido de obter a graça da lei, por que na lei que foi ordenada, e a circuncisão espiritual não deve ser impedida pela circuncisão carnal, senão que absolutamente todos os homens tem que ser admitidos à graça de Cristo., já que também Pedro nos Atos dos Apóstolos fala e diz: “Deus me mostrou que eu não deveria ligar para qualquer homem comum ou imundo.”. Mas se nada poderia impedir a obtenção da graça aos homens, e o mais atroz de todos os pecados não pode por obstáculos aos que são maiores. Mas se até aos que são os maiores pecadores, e os que haviam pecado contra Deus, quando creem, lhes é concedido a remissão dos pecados e nada se vê impedindo o batismo e a graça, deveríamos impedir um bebê? Que sendo recém nascido, não há pecado, salvo, que nascido da carne de Adão, contraiu o contágio da morte antiga em seus nascimento?

E, portanto, querido irmão, esta foi nossa opinião no concílio, que por nós, nada deve impedir o batismo e a graça de Deus, que é misericordioso, amável e carinhoso para com todos. Que, posto que é observado e mantido em respeito a tudo, nos parece que se deve respeitar em todos os casos inclusive nos das crianças…” [9]

É importante notar aqui que Fido e possivelmente os outros presbíteros, pretendiam fazer não era negar o batismo as crianças, tal como as seitas protestantes fazem hoje, e sim simplesmente atrasá-lo até o 8 dia de nascido.


 

GREGORIO DE NAZIANZO (329 – 390 D.C.)

Gregório escreveu um belo sermão sobre o batismo onde testemunha a fé da Igreja primitiva no qual vem que para o adulto é necessária a fé para receber o sacramento, mas não é assim para as crianças (que recebem em virtude da fé dos pais), portanto não há motivo algum para atrasar o batismo, nem mesmo no caso das crianças.

“11. Vamos batizar para vencer. Tomemos nossa parte nessas, mais detergentes que hissopo, mais puras que o sangue das vítimas impostas pela lei, mais sagradas que as cinzas de uma novilha, cuja a aspersão podia ser suficientes para dar as faltas comuns uma provisória purificação corporal, mas não uma completa remissão do pecado: Havia sido necessário, sem ele, renovar a purificação daqueles que a haviam recebido uma vez?

Vamos batizar hoje, para não estar obrigado a fazê-lo amanha. Não retardemos o benefício como se não ocasionasse algum problema. Não esperamos haver pecado mais para ser, mediante ele, perdoados em maior medida. Isso seria fazer uma indigna especulação comercial a propósito de Cristo. Tomar uma carga maior da qual podemos levar é correr o risco de perder em um naufrágio, navio, corpo e bebês, ou seja todo o fruto da graça do Senhor que não se sabe aproveitar[…]

17. Incluindo as crianças: não dê tempo para a malícia apoderar-se deles, santificai-os quando todavia são inocentes, consagrai-os ao Espírito quando todavia não tenham nascido os dentes. Que falta de coragem e que falta de fé a das mães que temem o caráter batismal pela debilidade de sua natureza. Antes de havê-lo trazido ao mundo, Ana dedicou Samuel a Deus, e, imediatamente depois de seus nascimento, o consagrou; desde então, o levou vestido com uma hábito sacerdotal sem nenhum temor dos homens, por causa da sua confiança em Deus.

Não há necessidade, então, de amuletos nem encantamentos, meios do que servem ao maligno para insinuar-se nos espíritos fracos e trazer em seu beneficio o temor religioso a Deus: põem contra a trindade um grande e belo talismã.” [10]

Recomenta como uma opinião pessoal que se não estão em perigo de morrer, esperem até os 3 anos até que possam recitar os mistérios da fé, algo que não é necessário para receber o batismo:

“26. Todo isto está bem dito para aqueles que solicitam por si mesmo o batismo, mas o que podemos dizer das crianças, todavia de pouca idade, que são incapazes de dar-se conta do perigo que estão e da graça do sacramento? Eles são batizados também?

Certamente, no caso de perigo imediato é melhor batiza-los sem seu conhecimento do que deixa-los morrer sem haver recebido o selo da iniciação. Estamos obrigados a dizer o mesmo a respeito da prática da circuncisão, que se realizava no oitavo dia prefigurando o batismo e que também se fazia sobre as crianças desprovidas de razão. Da mesma maneira se realizava a unção sobre as soleiras das portas e que, se tratando de coisas inanimadas, protegia aos primogênitos.

E a respeito das demais crianças? Está aqui minha opinião: Esperem que cheguem a idade de 3 anos, de modo que sejam capazes de compreender e expressar brevemente os mistérios; apesar da imperfeição de sua inteligência recebem o sinal, e seu corpo, o mesmo que sua alma, se encontram santificados pelo grande sacramento da iniciação. Eles devem prestar contas de seus atos no momento preciso em que, em plena possessão da razão, cheguem ao conhecimento completo do Mistério, pois não serão responsáveis das faltas que chegaram a cometer pela ignorância própria de sua idade. Pois, de todos os modos resulta vantajoso possuir a muralha do batismo para proteger-se dos perigosos ataques que caem sobre nós e superam nossas forças.

27. Mas, se dirá, Cristo, que é Deus, se fez batizar aos trinta ano e tu nos empurras a adiantar o batismo. Afirmar desse modo a sua divindade, é o que resolve a objeção. Ele, a própria pureza, não necessitava de purificação, mas se fez purificar por vocês como por vocês se fez carne, pois Deus não tem corpo. Também, ele não corria nenhum perigo para retardar seu batismo, pois podia regular a sua vontade seu sofrimento como havia regulado seu nascimento. Para nós, pelo contrário, não seria pequeno o perigo, no caso de abandonar o mundo sem haver recebido, a vosso nascimento, mais uma vida perecerá, sem estar revestida da incorruptibilidade.” [11]

 

JOÃO CRISÓSTOMO (347 – 407 D.C.)

“Deus seja louvado! Ele, que produz tais maravilhas. Vê quão grande é a graça do batismo? Alguns só veem nela a remissão dos pecados, enquanto que nós podemos alinhar dons de honra. Por esta razão batizamos também as crianças de pouca idade, quando, todavia ainda não começaram a pecar, para que recebam a santidade, a justiça, a filiação, a herança, a fraternidade de Cristo, para que se convertam nos membros e moradas do Espírito Santo.” [12]

 

BASÍLIO O GRANDE (330 – 379 D.C.)

“Há um tempo conveniente para cada coisa: um tempo para o sono, outro para a vigília, um tempo para a guerra e um tempo para a paz. No entanto, o tempo do batismo absorve toda a vida do homem. Se não é possível ao corpo viver sem respirar, muito menos o será para a alma subsistir sem conhecer ao seu criador.

A ignorância de deus é a morte da alma. Aquele não foi batizado tampouco foi iluminado. Assim como sem luz, a vista não pode examinar aquilo que lhe interessa, do mesmo modo, a alma não pode comtemplar a Deus. Ademais, todo tempo é favorável para chegar a salvação por meio do batismo, já se trata do dia ou da noite, de uma hora ou de um menor espaço de tempo, por mais breve que seja. Certamente, a data que se aproxima, é, em maior extensão, a mais adequada. Que época poderia ser, em efeito, mais adequada para o batismo do que o dia da páscoa? Pois esse dia se comemora a ressurreição, e o batismo é uma fonte de energia para chegar a salvação.

Por esta razão, a Igreja convoca desde a muito tempo seus “filhos de peito”, em uma sublime proclamação, a fim de que eles a quem ela deu a luz sem dor, colocando os no mundo depois de havê-los alimentado com o leite do ensinamento e da catequese, para que degustem o alimento sólido de seus dogmas.” [13]

O PELAGIANISMO, PRIMEIRA HERESIA A REJEITAR O BATISMO DAS CRIANÇAS.

Mas foi no século V, onde apareceu a primeira heresia a negar a necessidade do batismo, incluindo o batismo infantil; seu autor foi Pelágio, um monge influenciado por doutrinas pagãs (especialmente do estoicismo). Minimizou a eficácia da graça e acreditava que a vontade, com o seu livre arbítrio, poderia alcançar a santidade sozinho. Para os pelagianos não havia pecado original, pensavam que Adão não foi criado imortal, por isso que morreu, mas não tinha pecado, e que as crianças estão no mesmo estado de Adão antes de sua queda, sem contrair qualquer pecado original. Ao negar o pecado original, consequentemente, viu o batismo de crianças como desnecessário.

Depois de se tornar um monge Pelágio viaja a Roma antes do ano 400. Depois de Roma ser conquistada e saqueada pelos godos parte para Cartago e depois para Jerusalém  acompanhado de Celestius, outro partidário do Pelagianismo que o ajuda, de forma eficiente, a propagar suas doutrinas.

Dezoito bispos, incluindo Juliano de Eclana aderiu ao Pelagianismo, enquanto Santo Agostinho tenazmente combatia a heresia. Os bispos Pelagianos são privados de suas sés e são condenados pelos concílios africanos de Cartago e Milevis (anos 411, 412 e 416) que sentenciam:

“Igualmente satisfeito que quem quer negue que os recém-nascidos do seio de suas mães, não são para ser batizados, não ou dizem que na verdade são batizados para a remissão dos pecados, mas que do pecado original de Adão nada trazemos seja necessário expiar na lavagem de regeneração; de onde consequentemente seguem entre eles a fórmula do batismo “para a remissão dos pecados”, é para ser entendido que não é verdade, mas falsa, seja anátema. Porque o que diz o Apóstolo: Por um homem entrou o pecado no mundo e pelo pecado a morte, e assim passou a todos os homens, porque todos pecaram [ Cf. Rom. 5, 12], não há outro modo de se entender, do que como sempre entendeu a Igreja Católica espalhada por todo o mundo. Por que para esta regra de fé, até mesmo as crianças que ainda não podem cometer qualquer pecado de si mesmas, são verdadeiramente batizadas para a remissão dos pecados, de modo que pela regeneração eles são limpos pela geração contraída.”[14]

No entanto, os pelagianos se recusaram a se submeter-se aos concílios. Os concílios escrevem ao Papa para aprovar as decisões desses concílios locais, o que faz o Papa Inocêncio I. Santo Agostinho com a sentença da Sé Apostólica (Roma) dá o caso encerrado, no entanto, após a morte do Papa Inocêncio, Celestius ante o papa Zózimo faz uma confissão de fé que quase o confundi-o, mas este confirma os julgamentos de seu antecessor. Posteriormente, o concílio de Éfeso em 431, novamente condenou o pelagianismo tentando se espalhar agora na Inglaterra.

 

AGOSTINHO DE HIPONA (354 – 430 D.C.)

Graças à sua dura luta contra o pelagianismo são abundantes os textos onde explora a necessidade de batizar bebês para purificá-los do pecado original.

O batismo das crianças pelos pais Cristãos.

Por causa desta concupiscência, nem mesmo de um matrimónio justo e legítimo de filhos de Deus, podem nascer filhos de Deus. Porque os que geram, mesmo que tenham sido regenerados, não geram filhos de Deus, se não filhos do mundo. Na verdade isto é o julgamento do Senhor. Os filhos deste mundo geram e são gerados. Como ainda somos filhos deste mundo nossa natureza interna esta corrompida. Por esta razão eles são filhos nascidos deste mundo, e não serão filhos de Deus antes de serem regenerados. Mas como somos filhos de Deus, o homem interior se renova dia a dia, e o homem exterior, pelo banho de regeneração, é santificado e recebe a esperança da incorruptibilidade futura, por esta razão somos chamados templo de Deus.[15]

Qualquer um que negar que as crianças são arrancadas, ao serem batizadas, deste poder das trevas, das quais o diabo é o príncipe, isto é, do poder do diabo e seus anjos, é refutado pela verdade dos sacramentos da igreja. Nenhuma novidade herética pode alterar qualquer coisa na igreja de Cristo, eis que a cabeça dirige e ajuda a todo o corpo, tanto dos pequenos como dos grandes.” [16]

Com efeito, desde que foi instituída a circuncisão, dentre o povo de Deus, que era então o sinal da justificação pela fé, tinha valor para significar a purificação do pecado original antigo também para as crianças, pelo mesmo motivo que o batismo começou a ter um valor também para a renovação do homem desde o momento que foi instituído. Não que antes da circuncisão não houvesse justiça alguma pela fé, por que o mesmo Abraão, pai das nações que haviam de seguir sua mesma fé, foi justificado pela fé quando todavia era incircunciso, sinal que o sacramento da justificação pela fé estava oculto de todos nos tempos mais antigos. No entanto, a mesma fé no mediador salvava aos antigos justos, pequenos e grandes.” [17]

A REFORMA PROTESTANTE E O MOVIMENTO ANABATISTA

Seria apenas séculos depois, não mais pelos pelagianos mas por um movimento totalmente diferente, surgido em Zurique em torno da Reforma Protestante promovida pelo reformador Ulrico Zwínglio, que se levantaria oposição ao batismo das crianças. Os partidários deste movimento foram chamados “anabatistas” (ou “batistas”).

O nascimento deste movimento remonta ao ano 1523, quando a Reforma chegou a Zurique. Não passou muito tempo para que começasse a ocorrer divisões dentro do Protestantismo. De Zwínglio se separaram vários grupos protestantes que anteriormente colaboravam na formação de uma comunidade independente da tutela da autoridade civil. Entre estes estavam Conrado Grebel (1498-1526) e Feliz Mantz (1500-1527), que passaram a desenvolver a idéia de que apenas os que críam retamente e levavam conduta pia eram membros da Igreja; assim, segundo suas opiniões, o batismo das crianças não podia nem sequer ser considerado batismo, sendo portanto inválido. Os anabatistas passaram então a se rebatizar, rejeitando a validade do seu primeiro batismo e alegando que apenas aqueles que podiam expressar conscientemente a fé em Cristo podiam ser batizados.

No ano 1524, Grebel rejeitou que seu novo filho fosse batizado e ocasionou um conflito com o Conselho de Zurique; em janeiro de 1525, o Conselho dispôs que fosse expulso da cidade quem, no prazo de oito dias, não batizasse seus filhos. Grebel e Mantz também foram proibidos de pregar[18], mas como o Protestantismo já tinha rejeitado a autoridade da Igreja [Católica], tendo em vista a livre interpretação da Bíblia, o novo movimento também não tinha motivos para se submeter às novas autoridades protestantes. A “caixa de Pandora” estava aberta e a partir de então não havia mais como o Protestantismo guardar uma unidade doutrinária.

É neste contexto que surgiram as inquisições protestantes. Mas apesar de se servirem da tortura e, em 7 de março de 1526, ter sido decretada pena de morte para todos aqueles que realizassem um segundo batismo, não foi possível conter os anabatistas (o mesmo passaria a ocorrer, aliás, com cada nova denominação protestante). Começaram assim as execuções de anabatistas, entre elas as de Félix Mantz (por afogamento), Jorge Blaurock e Miguel Sattler (ambos queimados vivos). As vítimas continuaram, mas o Anabatismo se propagou inclusive para a Alemanha, terra de Lutero, e os Países Baixos, onde a palavra de Calvino era a lei.

Proibidos tanto nas regiões católicas quanto nas protestantes, apareceram diferentes grupos anabatistas (menonitas, huterianos), alguns pacíficos, outros nem tanto. Um dos líderes destes grupos anabatistas violentos foi Tomás Müntzer, que logo depois de ser seguidor de Lutero acabou se tornando seu férreo inimigo. Liderou grupos de camponeses que, embora fizessem reclamações justas e buscassem o apoio de Lutero, acabaram partindo para a violência quando este último ofereceu-lhes a espada. É neste momento que Lutero escreve a obra “Contra as Hordas de Bandidos e Assassinos Camponeses” (WA 18,357-361), em que exorta os príncipes a realizar uma matança de camponeses, em público ou em privado, culminando tudo em um grotesco massacre.

Com o passar do tempo, a tendência anabatista foi penetrando nas diversas denominações protestantes, ecoando suas tendências referentes ao batismo inclusive em denominações não- anabatistas (pentecostais, metodistas), embora rejeitadas por outras (calvinistas, luteranos, reformados). A divisão chegou a tal ponto que hoje conheço comunidades eclesiais luteranas que rejeitam o batismo de crianças (embora continuem sendo exceção e não regra).

Entre algumas confissões protestantes rejeitando as doutrinas anabatistas, podemos mencionar:

“O Batismo: ensinamos que o Batismo é necessário para a salvação e que pelo Batismo nos é dada a graça divina. Ensinamos também que se devem batizar as crianças e que por este Batismo são oferecidas a Deus e recebem a graça de Deus. É por isso que condenamos os Anabatistas que rejeitam o Batismo das crianças” (Confissão de Augsburgo, artigo 9; ano 1530 – Igrejas Luteranas).

“Não apenas devem ser batizados aqueles que professam a fé em Cristo e obediência a Ele, como também as crianças, filhas de um ou de ambos os pais crentes” (Confissão de Westminster 28,4 – Igrejas Reformadas).

“Pergunta: Deve-se também batizar as crianças?
Resposta: Naturalmente, pois, como os adultos, encontram-se compreendidas na Aliança e pertencem à Igreja de Deus[a]. Tanto a estas quanto aos adultos se lhes promete, pelo sangue de Cristo, a remissão dos pecados[b] e o Espírito Santo, operário da fé[c]; por isso, e como sinal desta Aliança, [ambos] devem ser incorporados à Igreja de Deus e diferenciados dos filhos dos infiéis[d], assim como se fazia na Aliança do Antigo Testamento pela circuncisão[e], cujo substituto na Nova Aliança é o Batismo[f]. Notas: [a] Gênesis 17,7; [b] Mateus 19,14; [c] Lucas 1,15; Salmo 22,10; Isaías 44,1-3; Atos 2,39; [d] Atos 10,47; [e] Gênesis 17,14; [f] Colossenses 2,11-13” (Catecismo de Heidelberg, pergunta 74 – Igrejas Reformadas).

“Opomo-nos aos anabatistas, os quais não aceitam o batismo infantil dos filhos dos crentes. Porém, conforme o Evangelho, ‘o reino de Deus é dos pequeninos’ e estes encontram-se incluídos na Aliança de Deus. Portanto, por que não devem receber o sinal da Aliança de Deus? Por que não devem ser consagrados pelo santo batismo, considerando que já pertencem à Igreja e são propriedade de Deus e da Igreja? Igualmente negamos as demais doutrinas dos anabatistas, que contêm pequenas considerações próprias e contrárias à Palavra de Deus. Em suma: não somos anabatistas e com eles nada temos em comum” (Confissão Helvética – antiga confissão protestante de 1566).

“Por esta razão, cremos que quem deseja entrar na vida eterna deve ser batizado uma [só] vez com o único Batismo, sem repetí-lo jamais, já que tampouco podemos nascer duas vezes. Mas este Batismo é útil não apenas enquanto a água está sobre nós, mas também todo o tempo de nossa vida. Portanto, reprovamos o erro dos anabatistas, que não se conformam com o único batismo que receberam e que, além disso, condenam o batismo das crianças [filhas] de crentes, as quais cremos que se deve batizar e selar com o sinal da Aliança, como as crianças em Israel eram circuncidadas nas mesmas promessas que foram feitas aos nossos filhos. E, certamente, Cristo não derramou menos o seu sangue para lavar as crianças dos fiéis como o fez pelos adultos; [por seu sangue] devem receber o sinal e o sacramento daquilo que Cristo fez por elas, da mesma forma como o Senhor, na Lei, ordenou que participassem do sacramento do padecimento e morte de Cristo pouco depois de terem nascido, sacrificando por elas um cordeiro, o qual era um sinal de Jesus Cristo. Por outro lado, o Batismo significa para nossos filhos o mesmo que a circuncisão significava para o povo judeu, o que fez São Paulo chamar o Batismo de ‘a circuncisão de Cristo’” (Confissão Belga de 1619, artigo 34 – a Confissão Reformada dos Países Baixos e de várias igrejas reformadas atuais).

Os anglicanos também rejeitaram o anabatismo:

“Do Batismo – O batismo não é apenas um sinal da profissão e uma nota de distinção pela qual se identificam os cristãos e os não-batizados, mas também é um sinal da regeneração ou renascimento, pelo qual, como por instrumento, os que recebem retamente o batismo são inseridos na Igreja; as promessas da remissão dos pecados e a de nossa adoção como filhos de Deus por meio do Espírito Santo são visivelmente assinaladas e seladas; a fé é confirmada; e a graça, em razão da oração a Deus, é ampliada. O Batismo das crianças, sendo conforme com a instituição de Cristo, deve ser inteiramente conservado na Igreja” (Os 39 Artigos da Religião, capítulo 27 – confissão doutrinária histórica da Igreja Anglicana).

João Calvino, em sua obra “Instituição da Religião Cristã” dedica uma seção para refutar o anabatismo. Pode ser vista aqui .

NOTAS


 

[1] Ireneo de Lyon, Fragmento 34. New Advent Encyclopediahttp://www.newadvent.org/fathers/0134.htm
Early Church Fathershttp://www.ccel.org/print/schaff/anf01/ix.viii.xxxiv

[2] Ireneo de Lyon, Contra las herejías 2, 22,4. Carlos Ignacio González, S.J., Ireneo de Lyon, Contra los herejes, Conferencia del Episcopado Mexicano, México 2000

[3] Orígenes In Rom. Com. 5,9: EH 249. Johannes Quasten, Patrología I, Biblioteca de Autores Cristianos 206, Quita Edición, Madrid 1995, pág. 395

[4] Orígenes, In Luc. hom. 14, 1.5
Enrique Contreras, El Bautismo, Selección de textos patrísticos, Editorial Patria Grande, Segunda Reimpresión, Buenos Aires 2005, pág. 41

[5] Orígenes, In Luc. hom. 33, 5

Ibid pág. 43

[6] Orígenes, In Lev. Hom. 8,3. Johannes Quasten, Patrología I, Biblioteca de Autores Cristianos 206, Quita Edición, Madrid 1995, pág. 394

[7] Hipólito, Tradición apostólica 20,21 . Enrique Contreras, El Bautismo, Selección de textos patrísticos, Editorial Patria Grande, Segunda Reimpresión, Buenos Aires 2005, págs. 45,47

[8] Early Church Fathers,  http://www.ccel.org/print/schaff/anf05/iv.iv.lviii

[9] Cipriano de Cartago, A Fido sobre el bautismo de infantes, Carta 58. Early Church Fathers,  http://www.ccel.org/print/schaff/anf05/iv.iv.lviii.; New Advent Encyclopediahttp://www.newadvent.org/fathers/050658.htm

[10] Gregorio Nacianceno, Sermón 40,11-17 (sobre el santo bautismo) . Carlos Etchevarne, El bautismo según los padres griegos, Adaptación Pedagógica:,Bach. Teol., pág. 14, 16-17
Early Church Fathers,  http://www.ccel.org/print/schaff/npnf207/iii.xxiii
New Advent Encyclopediahttp://www.newadvent.org/fathers/310240.htm

[11] Gregorio Nacianceno, Sermón 40,26-27 (sobre el santo bautismo)

Carlos Etchevarne, El bautismo según los padres griegos, Adaptación Pedagógica:,Bach. Teol., págs. 22-23
Early Church Fathers,  http://www.ccel.org/print/schaff/npnf207/iii.xxiii

New Advent Encyclopediahttp://www.newadvent.org/fathers/310240.htm

[12] Juan Crisóstomo, Sermón a los neófitos, 1. Carlos Etchevarne, El bautismo según los padres griegos, Adaptación Pedagógica:,Bach. Teol., pág. 57

[13] Basilio el Grande, Protríptico del Santo Bautismo, 1. Ibid pág. 4

[14] II Concilio Milevis, 416 y XVI Concilio de Cartago, 418, aprobados por los papas San Inocencio I y San Zósimo, del Pecado Original y de la gracia, canon 2 . Daniel Ruiz Bueno, DenzingerEl Magisterio de la Iglesia, Manual de Símbolos, Definiciones y Declaraciones de la Iglesia en materia de fe y costumbres, Editorial Herder 1963, D-102

[15] Agustín de Hipona, El Matrimonio y la concupiscencia, Libro I, XVIII, 20. Obras completas de San Agustín, Tomo XXXV, Biblioteca de Autores Cristianos 457, Madrid 1984, pág. 272-273

[16] Agustín de Hipona, El Matrimonio y la concupiscencia, Libro I, XX, 22 Ibid pág. 276

[17] Agustín de Hipona, El Matrimonio y la concupiscencia, Libro II, XI, 24 Ibid pág. 332

 

PARA CITAR


ARRAIZ, José Miguel. Os Pais da Igreja e o batismo das crianças. Disponível em: <http://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/estudos-patristicos/570-os-pais-da-igreja-e-o-batismo-das-criancas>. Desde 27/02/2013. Tradução: Rafael Rodrigues

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