INTRODUÇÃO
Histórica é a rejeição do episcopado monárquico pelo protestantismo, que não é senão a constituição hierárquica da Igreja em bispos, padres e diáconos. Esta organização tem suas origens nos apóstolos de Jesus Cristo, que receberam a ordem de construir e governar a Igreja. Esta hierarquia tripartida é, portanto, de instituição divina.
RAZÕES DO PROTESTANTISMO PARA A REJEIÇÃO DO EPISCOPADO MONÁRQUICO.
As razões do protestantismo para desafiar a origem apostólica do episcopado monárquico são várias. A razão óbvia é que eles não têm a sucessão legítima dos bispos, que possa ser rastreada até um apóstolo, e nessa situação quase como um desafio, tem preferido pensar que se eles não têm episcopado válido, então não existe episcopado.
Um exemplo disso é uma conversa que tive com um grupo de protestantes em um fórum católico:
“Muitos estudiosos católicos reconhecem que não existia o monoepiscopado em Roma antes de 140-150 d.C. E sem existir um episcopado monárquico em Roma e com listas de bispos inventadas no século II, os católicos têm um problema claro para o papado, ou se preferir com a primazia petrind com sucessores na Igreja romana.”
Outro participante fez o seguinte comentário:
“Querer ver uma primazia tão primitiva quanto a primeira epístola de Clemente é algo que já está superado pela pelos eruditos católicos contemporâneos. Em outras palavras, somente os católicos que permaneceram com a visão pré-científica (ou seja, um século ou mais) da história do cristianismo primitivo, insistem em ver em Clemente Romano um papa com as mesmas características essenciais dos Papas de hoje ou de tempos medievais. Penso melhor forneder evidências tomadas dos eruditos católicos contemporâneos para provar a minha afirmação.”
Neste contexto os nossos amigos protestantes começaram a mencionar e / ou citar profusamente teólogos católicos (Raymond Brown, Eamon Duffy, Klauz Schatz, Paul Johnson, Hans Küng e outros) que segundo eles “apoiavam sua visão”. Em suas próprias palavras o seu propósito “nobre” era:
“Meu objetivo é mostrar tão claramente quanto possível algo que muitas vezes está ausente nesse intercâmbio de ideias em nosso contexto latino-americano-católico. Quero dizer a descoberta de que outro grande setor do catolicismo romano que é Acadêmico e tão ignorado e às vezes torna-se até denegrido em nosso contexto.”
O argumento protestante… a falácia de autoridade
A falácia da autoridade é aquela que diz que algo é verdadeiro porque uma autoridade, afirma algo sobre a matéria. No presente caso, os católicos reconhecem como o Magistério vivo da Igreja ao invés do que um teólogo católico possa opinar. É triste dizer, mas hoje em dia você pode encontrar teólogos católicos dizendo quase tudo: negando a divindade e ressurreição de Cristo, defendendo o aborto, a eutanásia e homossexualidade, negando historicidade dos Evangelhos e muito mais.
Então, o que temos de alguns teólogos ou historiador católico, não pode ser considerado per-si como verdade, apenas pelo fato de que a opinião vem de alguém com credenciais acadêmicas. Se o que sustenta não é acompanhado de qualquer elemento de prova, não passará de uma simples opinião que pode muito bem ser questionada, debatida e até mesmo refutada. E com isso não pretendemos desqualificar eruditos católicos contemporâneos, mas destacar que o recurso utilizado aqui pelo amigo protestante é basicamente falacioso, e é acompanhado por uma atitude questionável de tomar seletivamente aquelas opiniões que eles acham que lhes favorece para então descartar o resto.
É claro que o súbito interesse de nossos amigos protestantes pela opinião dos estudiosos católicos não era casual, porque a mesma coisa acontece quando em um tópico eles percebem que seus pontos de vista podem ser usados para “trazer água para o seu próprio moinho”. Então, se o que afirmam pode servir para justificar algum postulado protestante, é nada menos que a opinião acadêmica, o ápice do conhecimento que deve ser levado em conta, pois é um “grande” e “importante” setor catolicismo “tão ignorado e às vezes denegrido” (quando li esta parte fiquei tão comovido que eu senti vontade de chorar). Mas espere só até ver quando os eruditos católicos lhes contrariam, suas opiniões de repente passam a valer um pouco menos do que uma pimenta, sendo divagações meramente humanas, uma vez que tudo o que em última análise, importa é o que vem das Escrituras somente. E se duvida, faça a experiência de ir a qualquer fórum protestante, citando opiniões teólogos católicos para ver o que acontece.
Mas se é verdade que um número crescente de teólogos adotaram esses pressupostos, é absurdo afirmar que o consenso de eruditos católicos contemporâneos concorda neste ponto com o protestantismo. A situação real é que existe uma pluralidade de posições que podem ser resumidas como:
Posição 1: O episcopado monárquico foi instituído pelos apóstolos.
Eles argumentam que o episcopado monárquico foi instituído pelos apóstolos desde o início, e cada Igreja existia um bispo ao qual estava subordinado um colégio de presbíteros. Ao longo do primeiro século, e ainda algum tempo depois, a terminologia era ambígua e as palavras bispo e presbítero eram sinônimas. Isto significa que, em alguns textos patrísticos primitivos não se fazia distinção entre ambos os ofícios, portanto cada Igreja contava com um sacerdote-chefe, o cabeça, como Tiago, em Jerusalém, Tito em Creta ou Timóteo em Éfeso.
Sobre isto comenta Daniel Ruiz Bueno (Sacerdote, teólogo e historiador, conhecido por suas versões de obras patrísticos e filosóficas):
“A primitiva e inegável confusão dos termos, intercambiáveis, presbíteros e bispos, que chega em um documento importante neste sentido, como Clemente I e ainda vai prolongar muito tempo, absolutamente desaparece em Santo Inácio. Mais a confusão de termos não implica confusão de papéis e toda a tradição interpreta unanimemente, os fatos, no sentido que revelam as cartas de Santo Inácio. A Igreja de Jerusalém, de Antioquia, ou de Roma, aparecem, uma vez que existe uma tradição histórica, governada por um único bispo assistido por seu presbitério e diáconos. O caso de Roma é exemplar” (Daniel Ruiz Bueno, Padres Apostólicos, Edição Bilingüe completa, BAC 65. Quinta Edición, Pág. 376)
Uma variação desta posição é uma que apoia que as comunidades locais não tinha um bispo, por serem muito pequenas, estando sob a supervisão direta dos apóstolos ou por qualquer outro motivo. Quando os apóstolos morreram todas as comunidades cristãs começam a adotar a hierarquia tripartida, e até meados do século II foi bastante difundida. A este respeito, diz José Orlandis:
“Muitas igrejas do primeiro século foram fundadas pelos Apóstolos e, enquanto viveram, permaneceram sob a sua autoridade superior, liderada por um colégio de presbíteros que ordenavam sua vida litúrgica e disciplina. Este esquema pode ser testemunhado em especial nas igrejas paulinas fundadas pelo Apóstolo dos Gentios. Mas, como os Apóstolos desapareceram, tornou-se difundido por todas as partes o episcopado monárquico, que havia sido introduzido em um estágio inicial em outras igrejas locais. O bispo era o chefe da Igreja, pastor dos fiéis e, como sucessor dos Apóstolos, possuía a plenitude do sacerdócio e a energia necessária para o governo da comunidade.” (José Orlandis, Breve Historia del Cristianismo, Ediciones RIALP, Sexta edición, Madrid 1999, Pág. 25-26)
Posição 2: O episcopado monárquico é o resultado de uma evolução que ocorre em meados do século II, e não foi a iniciativa dos apóstolos.
Eles argumentam que antes desta data as igrejas não tinham bispos monárquicos, mas apenas com um colégio de anciãos ou presbíteros, que mais tarde evoluiu para um episcopado monárquico. Muitos teólogos católicos que apóiam esta hipótese diferem dos protestantes, que o vêem como um desenvolvimento completamente normal da doutrina católica e não põe em causa nem o episcopado nem papado como uma instituição divina. Outros vão um pouco (ou às vezes muito) mais além e estão divididos na linha tênue entre ortodoxia e heterodoxia.
Destas duas teorias, a primeira (com variações incluídas) é perfeitamente viável e resume a posição que sempre teve o cristianismo ortodoxo. O segundo tem sérios problemas a serem analisados à luz da evidência histórica, como veremos a seguir.
Mas para não deixar sem resposta a generalização grotesca a que estão propensos nossos amigos protestantes aos eruditos católicos contemporâneos, fornecemos um conjunto de referências de opiniões autorizadas dos teólogos católicos que defendem fortemente a origem apostólica do episcopado monárquico. O Episcopado monárquico e os eruditos católicos contemporâneos.
FONTES PRIMÁRIAS
O TESTEMUNHO DE SANTO INÁCIO DE ANTIOQUIA
O depoimento de Santo Inácio é importantíssimo por ser uma testemunha privilegiada de como a Igreja estava organizada nos dias dos apóstolos. Se conservam sete cartas que ele escreveu por volta do ano 107 d.C depois de ser preso e levado por um pelotão de soldados romanos a Roma para ser martirizado.
Um estudo dessas epístolas revela que, desde esta data (início do século II) todas as igrejas de destino contavam com um bispo, e um colégio de sacerdotes e diáconos subordinados a ele. É surpreendente que apologistas protestantes como James White argumentam que Santo Inácio, quando usa a palavra bispo se refere apenas a simples sacerdotes, enquanto todas as evidências apontam para o contrário, como será discutido a seguir.
Carta aos Efésios
“Recebi, pois, toda a vossa grande comunidade em nome de Deus na pessoa de Onésimo, dotado de indizível caridade e vosso bispo segundo a carne. Peço-vos que o ameis em Jesus Cristo e que a Ele todos vos assemelheis. Bendito Aquele que vos fez a graça, já que vos mostrastes dignos de possuirdes tal bispo.”(Ináciode Antioquía, Carta a los Efesios, II, 3)
“Não vos dou ordens como se fora alguém. Mesmo que carregue os grilhões pelo Nome, ainda não cheguei à perfeição em Jesus Cristo. Pois agora é que começo a instruir-me e vos falo como a meus condiscípulos. Eu de fato deveria ser ungido por vós com fé, exortações, paciência, grandeza d’alma. Mas, desde que a caridade não me permite calar-me sobre vós, tomei a dianteira de exortar-vos a correr de acordo com o pensamento de Deus. Pois Jesus Cristo, nossa vida inseparável, é o pensamento do Pai, como por sua vez os bispos, estabelecidos até os confins da terra, estão no pensamento de Jesus Cristo.”(Carta aos Efésios III, 3)
“Segue daí, que vos convém avançar junto, de acordo com o pensamento do bispo, como aliás fazeis. Pois vosso presbitério digno de tão boa reputação, digno que é de Deus, sintoniza com o bispo como cordas com a cítara.”(Carta aos Efesios III, 4)
Carta aos Magnésios
“Portanto, já que tive a honra de vos ver na pessoa de Damas, vosso ilustre bispo, e de vossos ilustres presbíteros, Basso e Apolônio, bem como do diácono Zótio, meu companheiro de serviço, cuja amizade espero sempre possuir – já que ele é submisso ao bispo como à graça de Deus e ao presbitério como à lei de Jesus Cristo.
Não deveis tratar vosso bispo com tanta familiaridade em razão de sua juventude, mas deveis tratá-lo com toda a reverência, respeitando ao poder de Deus Pai, assim como fazem os santos presbíteros – como fiquei sabendo – que não o julgaram imprudentemente, a partir de sua aparência jovem claramente manifesta, mas, sendo prudentes em Deus, submeteram-se a ele, ou melhor, não a ele, mas ao Pai de Jesus Cristo, que é o Bispo de todos nós.” (Carta aos Magnésios II; III,1)
“Nas pessoas acima mencionadas, pude observar, na fé e no amor, toda a vossa comunidade; assim, exorto-vos a estudarem todas as coisas com divina harmonia, tendo vosso bispo presidindo no lugar de Deus e vossos presbíteros no lugar da assembleia dos apóstolos, junto com seus diáconos – que são muito queridos para mim – aos quais foi confiado o serviço de Jesus Cristo, que estava com o Pai antes do início dos tempos e que por fim se manifestou. Fazei tudo, então, imitando a mesma conduta divina, mantendo o respeito uns pelos outros, não olhando para o seu próximo segundo a carne, mas amando-o continuamente em Jesus Cristo. Que nada exista entre vós causando divisão, mas sejais unidos ao vosso bispo e àqueles que vos presidem, como um sinal evidente da vossa imortalidade.” (Carta aos Magnesios VI,1)
“Assim como o Senhor nada fez sem o Pai, ainda que estivesse unido a Ele, nem por si mesmo e nem pelos apóstolos, também vós não deveis fazer nada sem o bispo e os presbíteros. Nem deveis tentar fazer com que algo pareça razoável e justo para vós mesmos; mas, reunindo-vos num mesmo lugar, orai uma única prece, fazei uma única súplica, tenham uma única mente e esperança, no amor e na alegria imaculada. Há um só Jesus Cristo e nada é melhor que Ele. Então, correi todos juntos ao único templo de Deus, ao único altar, ao único Jesus Cristo, que procede do único Pai, está com Ele e a Ele retornou.” (Carta aos Magnésios VII,1)
“… unidos com o vosso admirável bispo, com toda a preciosa coroa espiritual do vosso presbitério e com os diáconos que estão em conformidade com Deus.” (Carta a os Magnesios XIII,1)
“Os efésios que habitam em Esmirna – de onde eu vos escrevo – estão aqui para a glória de Deus, como vós também fizestes; eles me reconfortam e vos saúdam juntamente com Policarpo, bispo dos esmirniotas.” (Carta a los Magnesios XV,1)
Carta aos Tralianos
“Convenci-me de vossos sentimentos puros e intocáveis na paciência; vós os tendes não apenas para uso mas por natureza, como me esclareceu Políbio, vosso bispo, que compareceu por vontade de Deus e Jesus Cristo, em Esmirna, para regozijar-se desta forma comigo prisioneiro em Jesus Cristo.”(Carta a los Tralianos I,1)
“É mesmo necessário, como alias e de vosso feitio, nada empreender sem o bispo, mas submeter-vos também ao presbitero como aos apóstolos de Jesus Cristo nossa Esperança, no qual nos encontraremos se assim nos portarmos.” (Carta aos Tralianos II, 1)
“Da mesma forma deverão todos respeitar os diáconos como a Jesus Cristo, como também ao bispo que é a imagem do Pai, aos presbíteros, porém como ao se nado de Deus e ao colégio dos apóstolos. Sem eles, já não se pode falar de Igreja.”(Carta a los Tralianos III,1)
“Saúdo-vos de Esmirna, em companhia das Igrejas de Deus que estão comigo, elas que em todo sentido me confortaram na carne e no espírito. Meus grilhões, que carrego por amor de Jesus Cristo com o pedido de que encontre a Deus, vos conclamam: perseverai em vossa concórdia e na oração comum! Convém que cada um de vós, e de modo particular os presbíteros, confortem o bispo para a honra do Pai, de Jesus Cristo e dos Apóstolos.”(Carta a los Tralianos XII,2)
Carta aos Filadelfienses
“Saúdo-a no sangue de Jesus Cristo, pois ela é minha perene e constante alegria, sobretudo se continuarem unidos ao Bispo, aos Presbíteros e Diáconos que estão com ele, instituídos segundo o plano de Jesus Cristo, que por Sua própria vontade os fortaleceu no Seu Espírito Santo.
Sei que não foi por si mesmo, nem por meios humanos, nem tampouco por ambição, mas na caridade de Deus Pai e do Senhor Jesus Cristo, que o Bispo obteve a incumbência de estar a serviço da comunidade.” (Carta aos Filadelfienses, Saudação e Elogio)
“Sede solícitos em tomar parte numa só Eucaristia, porquanto uma é a carne de Nosso Senhor Jesus Cristo, um o cálice para a união com Seu sangue; um o altar, assim como também um é o Bispo, junto com seu presbitério e diáconos, aliás meus colegas de serviço. E isso, para fazerdes segundo Deus o que fizerdes.” (Carta aos Filadelfienses III,2)
Carta a São Policarpo
“Inácio, também chamado Teóforo, a Policarpo, bispo da Igreja dos esmirnenses, ou antes àquele que tem a Deus-Pai e ao Senhor Jesus Cristo como o bispo os melhores votos de felicidades.” (Carta a São Policarpo – Introdução)
“Atendei ao bispo para que Deus vos atenda. Ofereço-me como resgate daqueles que se sujeitam ao bispo, aos presbíteros e diáconos. Com eles me seja concedido ter parte em Deus.”(Carta a São Policarpo, VI,1)
Carta aos Esmirniotas
“Sigam todos ao bispo, como Jesus Cristo ao Pai; sigam ao presbitério como aos apóstolos. Acatem os diáconos, como à lei de Deus. Ninguém faça sem o bispo coisa alguma que diga respeito à Igreja. Por legítima seja tida tão-somente a Eucaristia, feita sob a presidência do bispo ou por delegado seu. Onde quer que se apresente o bispo, ali também esteja a comunidade, assim como a presença de Cristo Jesus também nos assegura a presença da Igreja Católica. Sem o bispo, não é permitido nem batizar nem celebrar o ágape. Tudo, porém, o que ele aprovar será também agradável a Deus, para que tudo quanto se fizer seja seguro e legítimo.”(Carta a los Esmirniotas VIII,1-2)
“Saudações ao bispo, digno de Deus, a vosso presbitério tão agradável a Deus, aos diáconos, meus companheiros de serviço a cada um em particular e a todos em geral, em nome de Jesus Cristo, na Sua carne e no Seu sangue, na Paixão e na Ressurreição, em corpo e alma, na unidade de Deus e na vossa. Para vós a graça, a misericórdia, a paz, e a paciência para todo sempre.” (Carta aos Esmirniotas XII, 2)
A razão de James White não reconhecer que Inácio se refere aos bispos que exercem episcopado monárquico é porque isso seria reconhecer que o primeiro século já havia uma hierarquia tripartida bem definida. Suas tentativas de separar o episcopado monárquico da era apostólica e atribuí-lo a uma evolução posterior é para fazer com que o episcopado monárquico seja menos crível. A este respeito, diz Daniel Ruiz Bueno:
“Este tem sido um dos obstáculos críticos para apoiar a autenticidade das cartas de Santo Inácio, pois eles tem que engolir um episcopado monárquico e uma hierarquia bem definida no final do primeiro século, que faz cair por terra muitas teorias. Mas as teorias são teorias e textos são textos. No entanto, os textos das cartas de Santo Inácio nos atestam com clareza absoluta e insistência cansativa que cada Igreja incluindo Antioquia, Esmirna, Éfeso, Trália, Filadelfia – tem em sua cabeça um ἐπίσκοπος, “intendente, Inspetor”, autoridade suprema na comunidade, que é adicionado como seu subordinado e dependente um πρεσβυτέριον, colégio de “anciãos”, que o auxilia como um “Senado” e um terceiro corpo de diáconos ou ministros.” (Daniel Ruiz Bueno, Padres Apostólicos, Edición Bilingüe completa, BAC 65. Quinta Edición, Pág. 376)
É também notório que, nos textos das cartas não se ver qualquer tentativa de se impor o episcopado monárquico nenhuma Igreja. Sua exortação não tem a intenção de motivá-las a se organizarem dessa maneira, mas reconhecendo a Constituição existente das igrejas, instando-os a reforçar os seus laços com o bispo para se afastar das heresias gnósticas que representavam um perigo para a fé cristã. A este respeito afirma Daniel Ruiz Bueno:
“Não há nenhum vestígio em suas cartas que o regime monárquico episcopado foi imposto por uma revolução que se houve de acatar para o bem da Igreja. Nem tampouco se percebe a tentativa apologética de uma instituição contestada sobre as origens divinas, como fez o bispo de Roma aos Coríntios sediciosos, lembre-se a quem não têm conhecimento ou esquecer. É um fato que se justifica por ser parte da consciência cristã; mas um fato é o bispo, como um fato é a escola de “anciãos” ou sacerdotes, um fato os diáconos e um fato a subordinação tão bem expressa nas imagens mais nítidas destes três níveis da hierarquia da Igreja. Este fato não é contestado por ninguém e não é uma nova ordem e a apontá-la apologéticamente” (Daniel Ruiz Bueno, Padres Apostólicos, Edición Bilingüe completa, BAC 65. Quinta Edición, Pág. 376)
O fato de Santo Inácio reconhecer já no início do segundo século, um episcopado monárquico em todas as igrejas que escreve, não é hipótese muito viável que foi algo simplesmente imposto. A este respeito afirma Jesús Alvarez Gómez (Missionário Claretiano, Doutor em História da Igreja na Universidade Gregoriana (Roma) e professor de Arqueologia Cristã, na Faculdade de Teologia “San Dámaso” de Madrid):
“Como Santo Inácio de Antioquia não se destina a introduzir qualquer inovação deve-se concluir que a hierarquia tripla já era admitida algumas décadas antes, pelo menos nas comunidades da Síria” (Historia de la Iglesia, I. Edad Antigua, BAC, Madrid 2001, Pág. 121).
Mas se este é o caso surge a pergunta: Quem colocou em seus cargos todos estes bispos? Sabemos que muitas dessas igrejas, como Filadélfia, Éfeso ou Esmirna estavam sob a supervisão do apóstolo João, que pessoalmente nomeou Policarpo, um dos bispos destinatários. Santo Inácio, também foi nomeado pelo apóstolos (Pedro e Paulo). Não parece muito plausível a hipótese de que a “evolução” ocorreu repentinamente na cara dos próprios apóstolos, sem que eles soubesse ou fizessem parte disto.
Nem parece muito plausível que o episcopado monárquico é algo que eles adotaram exclusivamente nas igrejas específicas, Santo Inácio, pelo contrário, expressa a crença de que esta é a situação de todas as igrejas do mundo quando se refere a “os Bispos, estabelecidos pelo confins da terra” (Carta aos Efésios III,2) . E vimos como para ele a palavra bispo tem um sentido monarquista inegável.
Além disso, não é possível encontrar vestígios que essa instituição tenha sido contestada de alguma forma. A este respeito, explica historiador Afonso Van Hove:
“A melhor evidência para a existência, nesta fase inicial do episcopado monárquico é o fato de que no final do segundo século não há nenhum vestígio de qualquer mudança na organização. Essa mudança teria levado o colégio presbítero-bispos a sua de autoridade soberana, e é quase impossível compreender como este corpo teria permitido ser privado de sua autoridade em todos os lugares, sem deixar em documentos contemporâneos a menor evidência de um protesto contra a mudança importante. Se o episcopado monárquico só começou em meados do século II, é impossível compreender como no final do segundo século eram geralmente conhecidas e aceitas as listas episcopais muitos importantes de sucessão diocesana de bispos que datam do século I. Tal como, por exemplo, foi o caso de Roma.” (Van Hove, Alphonse. “Bishop.” The Catholic Encyclopedia. Vol. 2. New York: Robert Appleton Company, 1907)
Santo Inácio e a Igreja de Roma
Em todas as suas epístolas Santo Inácio chama quase todos os bispos por nomes (Onesimus em Éfeso, Policarpo de Esmirna, Magnésia Damas, Políbio Trales), mas em sua carta à Igreja romana não nomeia qualquer bispo. Os protestantes tendem a ver nesta omissão como prova de que não havia um episcopado monárquico em Roma. No entanto, também não fala de um colégio dos presbíteros, nem mesmo dirige sua carta a alguém que ocupa uma posição de autoridade na Igreja de Roma. Para encontrar a razão você tem que estudar o contexto da situação: O Império Romano já tinha martirizado um dos chefes da cristandade. O célebre Inácio, Bispo da primeira Sé de São Pedro, para quem todos os bispos destinatários ao contrário do Bispo de Roma seriam considerados pequenos peixes. Não seria prudente identificar pelo nome em uma carta o bispo de Roma, precisamente, a principal Igreja da cristandade localizada na cidade onde ele foi levado para ser martirizado.
Também não se pode esquecer que o tom que Santo Inácio para dirigir-se a Igreja Romana é substancialmente diferente das outras. Para ele, Roma é:
“Inácio, também chamado Teóforo, à Igreja que recebeu misericórdia pela grandeza do Pai altíssimo e de Jesus Cristo Seu Filho único, Igreja amada e iluminada pela vontade d’Aquele que escolheu todos os seres, isto é, segundo a fé e a caridade de Jesus Cristo nosso Deus, ela que também preside na região da terra dos romanos, digna de Deus, digna de honra, digna de ser chamada bem-aventurada, digna de louvor, digna de êxito, digna de pureza, e que preside à caridade na observância da lei de Cristo e que leva o nome do Pai. Saúdo-a também em nome de Jesus Cristo, filho do Pai. Aos que aderem a todos os seus mandamentos segundo a carne e o espírito, inabalavelmente cumulados e confirmados pela graça de Deus, purificados de todo colorido estranho, desejo todo o bem e irrepreensível alegria em Cristo Jesus nosso Deus.” (Carta aos Romanos – Introdução.)
Assim, enquanto pede a todas as igrejas a que escreve para orarem por sua igreja de Antioquia, ele nunca confia esta ao cuidado de nenhuma outra igreja, mas só a Roma, que em suas palavras “preside na caridade”.
O TESTEMUNHO DE IRENEU DE LION
Não é pouco relevante o testemunho do teólogo mais importante de sua época (140 – 160 d.C), particularmente se seu contato com a era apostólica por ter conhecido São Policarpo, discípulo direto de São João. Garante que todas as Igrejas Apostólicas podem listar suas sucessões de bispos, mas não estender apenas ecoa a sucessão da Igreja de Roma:
“Mas visto que seria coisa bastante longa elencar, numa obra como esta, as sucessões de todas as igrejas, limitar-nos-emos à maior e mais antiga e conhecida por todos, à igreja fundada e constituída em Roma, pelos dois gloriosíssimos apóstolos, Pedro e Paulo, e, indicando a sua tradição recebida dos apóstolos e a fé anunciada aos homens, que chegou até nós pelas sucessões dos bispos, refutaremos todos os que de alguma forma, quer por enfatuação ou vanglória, quer por cegueira ou por doutrina errada, se reúnem prescindindo de qualquer legitimidade. Com efeito, deve necessariamente estar de acordo com ela, por causa da sua origem mais excelente, toda a igreja, isto é, os fiéis de todos os lugares, porque nela sempre foi conservada, de maneira especial, a tradição que deriva dos apóstolo.”(Contra as Heresias III, 3, 2)
TERTULIANO
Da mesma forma que os pais, para Tertuliano encontra na sucessão bispos a garantia segura para encontrar a doutrina ortodoxa, uma vez que estes transmitir integralmente o ensinamento que receberam dos apóstolos.
Com efeito, desta forma revelam suas origens as igrejas apostólicas, como a Igreja dos esmiornitas que Policarpo foi colocado por João, como Clemente Romano foi ordenado por Pedro. Da mesma forma, certamente também nos mostram as outras igrejas tem sementes de raizes apostólicas no episcopado pelos colocadas pelos Apóstolos. Inventem algo semelhante hereges. Bem, depois de tanta blasfêmia, o que é ilegal para eles?”(Prescrições contra todas as heresias, XXXII,1-2)
EUSÉBIO DE CESÁREA E O TESTEMUNHO DE HEGÉSIPO
Considerado o pai da história da Igreja, em sua História Eclesiástica dá a sucessão de bispos dos quatro principais centros da Igreja primitiva: Jerusalém, Antioquia, Alexandria e Roma. Graças a ele também foram preservados extratos de escritos antigos perdidos que de outra forma teriam desaparecido. Fontes compiladas por Eusébio são extratos dos escritos de Hegesipo, que não só dá testemunho do episcopado monárquico nos tempos apostólicos, mencionando Tiago como líder da Igreja de Jerusalém, mas recompila a sucessão dos bispos de Roma.
“Depois de chegar em Roma eu reconpilei a sucessão até Aniceto, cujo diácono era Eleutério. Aniceto foi sucedido por Sotéro e ele por sua vez, por Eleuterio.” (Historia Eclesiástica IV,22)
Que Hegesipo nessa época tão precoce refere-se à sucessão de bispos de forma singular não é de se estranhar, então simplesmente está de acordo com as alegações de Santo Inácio, Santo Irineu e toda a Tradição. Assim como não há nenhum vestígio de qualquer pessoa de qualquer forma tenha disputado a instituição do episcopado monárquico, não há um ponto assente que os bispos de Roma não eram realmente bispos, muito menos sucessores de Pedro.
O EPISCOPADO MONÁRQUICO NA BÍBLIA
Já foi dito que tanto no Novo Testamento quanto em alguns textos patrísticos primitivos as palavras bispo e presbítero foram usados como sinônimos, e foi a partir de Inácio de Antioquia que a palavra bispo foi sendo aplicada ao sacerdote encarregado da comunidade. No entanto, na Bíblia há provas suficientes para encontrar a instituição dos apóstolos do episcopado monárquico.
Uma explicação didática, temos através do historiador George Hayward Joyce:
“Queria ponderar aqui se o chamado “episcopado monárquico” foi instituído pelos Apóstolos. Além de estabelecer um colégio de presbítero-bispos, eles puseram um homem na posição de supremacia, confiando o governo da Igreja, e dotando-o de autoridade apostólica sobre a comunidade cristã? Mesmo se levarmos em conta a evidência da Escritura somente, há base suficiente para responder a essa pergunta afirmativamente. A partir do momento da dispersão dos Apóstolos, Tiago aparece em uma relação episcopal com a Igreja de Jerusalém (Atos 12, 17, 15,13,. Gal 2:12). Em outras comunidades cristãs a instituição de bispos “monarquistas” foi um desenvolvimento um pouco mais tardio. No começo os próprios Apóstolos comandavam, aparentemente, todas as tarefas de vigilância supremas. Eles estabeleceram o ofício quando demandavam as crescentes necessidades da Igreja. Epístolas Pastorais não deixam margem para dúvidas de que Timóteo e Tito foram enviados como bispos de Éfeso e de Creta, respectivamente. A Timóteo foi concedido poderes apostólicos completos. Apesar de sua juventude tem autoridade sobre ambos os clérigos e leigos. Para ele, a tarefa de guardar a pureza da fé da Igreja, para ordenar sacerdotes de exercer a sua jurisdição. Além disso, a exortação a ele de São Paulo “conserve o mandamento sem mácula, irrepreensível, até a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo.” mostra que não é uma missão temporária. Tal pedido expresso inclui no seu âmbito não só Timóteo, mas seus sucessores em uma posição que vai durar até a Segunda Vinda. A tradição local, sem dúvida, o reconheceu entre os ocupantes da sede episcopal. No Concílio de Calcedônia, a Igreja de Éfeso teve uma sucessão de vinte de sete bispos começa com Timóteo (Mansi, VII, 293; cf. Eusebio, Hist. Eccl., II, iv,v).
Estes não são as únicas evidências que o Novo Testamento fornece para o episcopado monárquico. Em Apocalipse os “anjos” a quem as cartas das sete igrejas se dirigirem são quase certamente aos bispos das respectivas comunidades. Alguns comentaristas, de fato, têm argumentado que eles eram personificações das próprias comunidades. Mas esta explicação dificilmente pode se sustentar. São João, em toda parte refere-se ao anjo responsável pela comunidade precisamente como se se referisse a seu governante. Além disso, o simbolismo do Capítulo 1, os dois são representados em imagens diferentes: os anjos são as estrelas na mão direita do Filho do Homem; os sete castiçais são a imagem representativa das comunidades. O termo anjo deve ser notado, é praticamente sinônimo de apóstolo, e tão bem escolhido para designar o gabinete episcopal. De novo as mensagens para Arquipo (Cl, 4, 17, Filemon 2) implica que ele tinha uma posição de dignidade especial, superior à de outros sacerdotes. Sua menção em uma carta referindo-se inteiramente a uma questão totalmente privada, como é a de Filemon, é dificilmente explicável a menos que ele fosse o chefe oficial da Igreja de Colosso. Temos, portanto, quatro importantes indícios da existência de um cargo nas igrejas locais, ocupados por uma única pessoa, e carregando da autoridade apostólica. Nenhuma dificuldade pode levar ao fato de que até agora nenhum título especial distingue estes sucessores dos apóstolos dos sacerdotes comuns. É da natureza das coisas que o ofício existia antes de ser lhe atribuído um título. O nome de um apóstolo, como vimos, não se limitava aos Doze. São Pedro (I Pedro 5, 1) e San Juan (II e III, João 1, 1) tanto falam de si próprios como “sacerdotes”. São Paulo fala do Apostolado como uma diakonia. Um caso paralelo na história eclesiástica posterior é oferecido pela palavra papa. Este título não é atribuído ao uso exclusivo da Santa Sé até o século XI. Embora ninguém argumenta que o supremo pontificado do bispo de Roma não foi reconhecido até então. Não é de estranhar que a terminologia precisa, que distingue bispos, no verdadeiro sentido, dos presbítero, não é encontrada no Novo Testamento.” (G. H. Joyce, Enciclopedia Católica, Artículo Iglesia.)
CONCLUSÃO
Depois de tudo isto o que os protestantes argumentam? Basicamente que os primeiros cristãos, incluindo os Padres ilustres da Igreja e discípulos diretos dos apóstolos ou os seus sucessores, são mentirosos que não tinham escrúpulos em forjar e inventar listas bispos. É claro que alguns gostariam de envernizar estas hipóteses com as opiniões de teólogos e historiadores escolhidos seletivamente, mas isso não nos impede de irmos às fontes primárias e tiramos nossas próprias conclusões.
PARA CITAR
ARRAIZ, José Miguel. O Episcopado Monárquico na Igreja Primitiva. Disponível em: <http://apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/estudos-patristicos/724-o-episcopado-monarquico-na-igreja-primitiva> Desde:15/09/2014 Tradutor: Rafael Rodrigues.