Neste trabalho descrevo a gênese e desenvolvimento da doutrina da Igreja¹ sobre a liberdade religiosa a partir da Revolução Francesa².
O fruto maior desse desenvolvimento se encontra na Declaração Dignitatis Humanae (a partir de agora DH), promulgada em 7 de dezembro de 1965 na sessão final do Concílio Vaticano II. E o ensinamento central da DH se encontra no n. 2: “Este Sínodo Vaticano declara que a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa. Consiste tal liberdade no seguinte: os homens todos devem ser imunes da coação tanto por parte de pessoas particulares quanto de grupos sociais e de qualquer poder humano, de tal sorte quem em assuntos religiosos ninguém seja obrigado a agir contra a própria consciência, nem se implica de agir de acordo com ela, em particular e em público, só ou associado a outrem, dentro dos devidos limites. Além disso, declara que o direito à liberdade religiosa se funda realmente na própria dignidade da pessoa humana, como a conhecemos pela palavra revelada de Deus e pela própria razão natural. Este direito da pessoa humana à liberdade religiosa na organização jurídica da sociedade deve ser de tal forma reconhecido, que chegue a converter-se em direito civil.”
Trata-se, pois, de descrever o caminho percorrido pelo magistério da Igreja desde a Revolução Francesa para este ensinamento da DH. Primeiro analiso as condenações que os papas Pio VI, Gregório XVI e Pio IX fizeram do sistema liberal da liberdade de consciência e cultos que se deriva da Declaração dos direitos do homem e do cidadão de 1789; logo o mostro como Leão XIII, Pio XI e Pio XII, ao mesmo tempo que precisam as condenações de seus predecessores, ampliam as perspectivas desde as que contemplam a liberdade de consciência e de cultos, e vai pondo as bases para a compreensão da verdadeira liberdade religiosa; e finalmente explico a assunção crítica por João XXIII do direito à liberdade religiosa proclamado na Declaração Universal dos direitos do homem de 1948 e apresento os conteúdos essenciais da DH do Vaticano II, que prossegue o caminho iniciado por João XXIII, declara o direito universal à liberdade religiosa e o explica à luz da tradição eclesial.
1. Pio VI, Gregório XVI e Pio IX condenam o sistema liberal da liberdade de consciência e de cultos que nasce da Declaração francesa de 1789
Os Papas começam a ocupar-se da liberdade de consciência e da religião a partir da Declaração dos direitos do homem e do cidadão aprovada pela Assembléia Nacional Francesa em 26 de agosto de 1789³ e das medidas totalitárias que inspiradas nela vão adotando essa Assembléia em relação à Igreja. Dessa Declaração agora interessa sobre todo o artigo 10: “Ninguém pode ser inquietado pelas suas opiniões, nem sequer de caráter religioso, contando que a manifestação delas não perturbe a ordem pública estabelecida pela Lei.”, e o artigo 11: “A livre comunicação das idéias e opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem; todo o cidadão pode, portanto, falar, escrever, publicar livremente, porém será responsável nos casos em que a lei reconhece um abuso desta liberdade.”
Em princípio o artigo 10 parece garantir o livre exercício da liberdade religiosa dentro dos limites da ordem pública. Porém sua formulação pode emprestar-se a interpretações muito diversas⁴.
Não fala de um direito humano inalienável e prévio ao Estado. Por isso, pode se interpretar – na linha de Rousseau – como um direito dentro do Estado. Nesse caso, por exemplo, a liberdade de opinião e expressão em matéria religiosa do que falam estes artigos da Declaração, seria uma liberdade no sentido do Contrato Social: liberdade para a fé e o culto enquanto não se intromete nem se opõe ao culto civil que está a serviço da ordem do Estado⁵. Deste modo, o conflito entre o Estado e a Igreja estava quase programado.
Quando os Constituintes revolucionários tiveram claro que a Igreja não podia nem queria exercer a função subordinada à vontade geral expressa na lei que eles lhe atribuíam, se guiarão pelos princípios de Rousseau e substituirão (resp. a Igreja) católica por um novo culto revolucionário: o culto da deusa razão. O passo decisivo que devia introduzir a desejada unidade política-religiosa baseada na vontade geral foi a Constituição Civil do Clero que foi votada pela Assembléia Nacional Francesa em 12 de julho de 1790. Com ela a Assembléia Nacional Francesa pretendia democratizar totalmente a Igreja e submetê-la a vontade geral expressada nos acordos e estatutos surgidos da Revolução.
Pio VI condena a Constituição Civil do Clero e a liberdade omnímoda em matéria religiosa no Breve a carta Quod aliquantum de 10 de Março de 1791 dirigida aos bispos participantes na Assembléia Nacional Francesa⁶. Aqui interessa subtrair o fato de que nela o Papa relaciona a intromissão indevida no governo da Igreja com a proclamação dos direitos de liberdade e igualdade na Declaração de 1789. Condena em primeiro lugar a intervenção e efeito primeiro perseguido pela Assembléia com a Declaração de 1789: “Abolir a religião católica, e com ela a obediência devida aos reis”⁷.
Logo condenada o ato posto por esta intervenção: “Com esta finalidade se decide estabelecer por lei (in jure positum esse) que o homem constituído em sociedade goze de uma liberdade omnímoda, que não deva ser inquietado em matéria religiosa e que está em seu arbítrio, nessa matéria religiosa, opinar, falar, escrever e imprimir o que quiser; a Assembléia declarou também que estes direitos monstruosos derivam e emanam da igualdade e liberdade da natureza entre os homens⁸”.
Assim, pois, Pio VI condena uma liberdade omnímoda em matéria religiosa, reivindicada e proclamada pela Assembléia Nacional Francesa como um direito do homem em sociedade. Distingue duas partes nela: não ser inquietado e fazer não importa o que em matéria religiosa. Seu critério de determinação intrínseca é o que o homem quer. Rejeita igualmente a idéia de que a natureza tem dado ao homem uma autorização positiva de fazer o que ele quer em matéria religiosa e que a lei tem que refletir essa autorização positiva.
Trata-se de uma autorização positiva. Por isso, continua o Papa dizendo que a proclamação positiva de uma liberdade omnímoda em matéria religiosa (e de uma igualdade entre os homens) se opõe: a razão, o dom mais precioso que a natureza tem dado ao gênero humano: “Mas que poderia haver de mais insensato do que estabelecer entre todos esta igualdade e liberdade sem atribuir nada a razão, de que a natureza principalmente tem dotado ao gênero humano, pelo qual se distingue dos outros animais? Opõe-se aos direitos e preceitos de Deus Criador, aos que são inerentes a submissão e deveres do homem: Havendo Deus criado ao homem e colocado em um paraíso de delicio, não lhe intimou ao mesmo tempo a pena de morte se comesse da árvore da ciência do bem e do mal, e não restringiu com este preceito sua liberdade? E havendo depois feito réu pela desobediência, não lhe impôs muitos mandamentos por Moisés? E embora deixou depois entregado a seu conselho para que pudesse fazer bem ou mal, contudo, impôs-lhe mandamentos e preceitos para que se salvasse se quisesse guardá-los.
Onde está essa liberdade de pensar e de obrar que os direitos da Assembléia atribuem ao homem constituído em sociedade como um imutável direito da natureza? Concordarão, pois segundo a doutrina destes decretos, contradizem o decreto do criador por quem existimos, e que cuja liberdade devemos atribuir, como Dele recebido, tudo quando somos e temos”⁹. E se opõe ao ato da fraqueza da natureza individual do homem, por sua necessidade tanto da vida social como de sua submissão a autoridade tanto na vida civil como na eclesial¹⁰.
Pio VI contrapõe a liberdade de pensar e agir proclamada pela Assembléia aos preceitos que Deus deu a Moisés. Logo parece que a idéia de liberdade de obrigação moral, isto é, de autonomia moral do homem em relação a Deus, está incluída neste direito a liberdade religiosa condenada por Pio VI. Como se trata de uma liberdade moral de atuar externamente na sociedade, tem que ser certamente uma liberdade civil. Porém Pio VI não se refere à liberdade civil no sentido de exclusão de coerção externa nas relações sociais, sem a liberdade moral perante a autoridade do Estado e da Igreja, baseada em sua liberdade moral diante Deus mesmo. Dito de outra maneira: do que se trata é a liberdade perante a autoridade, da liberdade e da obediência, e não diretamente da coerção do Estado em matéria religiosa.
Pio VI não quer que a lei civil proclame como objeto de um direito esta liberdade independente da norma da verdade religiosa. Ao fazê-lo assim, esse direito implicaria uma autorização positiva para pensar e atuar como se quer em matéria religiosa. Até o século XX se considerava que a proclamação de um direito em uma lei positiva (e mais numa Declaração dos direitos e numa Constituição) levaria a afirmação de um direito de permissão moral de realizar os atos assim autorizados. Daqui provém a dificuldade de distinguir uma autorização positiva de uma permissão negativa sobre tudo quanto esta última é legal, e não simplesmente um feito.
É a razão pela qual se tem vindo sustentando que o erro e o mal não têm direitos e que só podem ser tolerados, isto é, um Estado só pode permiti-los negativamente, porém não autorizar a fazer o mal¹¹. Assim, por exemplo, Pio XII sustentava que “nenhuma autoridade humana, nenhum Estado, nenhuma Comunidade de Estados, seja o que seja seu caráter religioso, pode dar um mandato positivo ou uma positiva autorização de ensinar ou de fazer o que seja contrário a verdade religiosa ou o bem moral. Um mandato ou uma
autorização deste gênero não teria força de obrigação e seria sem valor”¹².
Pio VI tem diante a Declaração francesa de 1789. Dela diz que não pode proclamar que o homem não tem obrigação moral de pensar interiormente (opinar) nem de realizar exteriormente na sociedade atos (falar, escrever e publicar) religiosos especificamente impostos por uma autoridade independente da vontade humana; nem proclamar que uma liberdade deste tipo brote da igualdade e liberdade da natureza humana; nem outorgar na prática um direito a liberdade civil em matéria religiosa que brota de tal concepção da liberdade moral e que é uma liberdade absoluta de não ser incomodado em matéria religiosa e de pensar, dizer, escrever, publicar o que quer.
Em definitivo, Pio VI condena a idéia de que se pode construir um sistema jurídico sobre a permissão moral de fazer o que se quer, especificamente em matéria religiosa¹³.
Gregório XVI condena a liberdade ilimitada de consciência na Mirari vos de 15 de agosto de 1832¹⁴. Segundo ele, o liberalismo político é a causa primeira dos males sociais que em seu tempo afligiam a Igreja. Outra causa é a opinião que defende o indiferentismo no âmbito religioso e que o Papa explica do seguinte modo: “o indiferentismo, ou seja, aquela perversa opinião estendida por todas as partes, graças à astúcia dos maus, e que ensina que pode conseguir a salvação eterna da alma em qualquer religião, desde que haja integridade e honradez nos costumes”¹⁵.
A este indiferentismo, isto é, a pretendida eficácia salvífica em qualquer religião, o Papa opõe a doutrina católica, segundo a qual, para alcançar a salvação, é necessário conservar íntegra e inviolável a fé católica: “Posto que o apóstolo nos adverte que há um só Deus, uma só fé, um só batismo (Ef 4,5), os que imaginam que toda religião nos oferece os meios para chegar a felicidade eterna devem temer e compreender que, segundo o testemunho do mesmo Salvador, estão contra Cristo porque não estão com Cristo (Lc 11,23) e que desgraçadamente os que não recolhem com ele dispersam-se, e que, portanto, sem dúvida alguma perecerão, se não tiverem a fé católica e não a conservar íntegra e inviolável”¹⁶.
Logo o Papa faz a afirmação central sobre a liberdade de consciência: Desta imunda fonte do indiferentismo sai àquela absurda e errônea sentença ou, melher dizendo, loucura, segundo a qual há de afirmar e reivindicar para todos a liberdade de consciência. (asserendam esse ac vindicandam cuilibet libertatem conscientiae)”¹⁷.
O Papa faz dos juízos sobre a sentença que sustenta que tem que afirmar e garantir para todos a liberdade de consciência. Primeiro diz que brota da fonte do indiferentismo no âmbito religioso (especialmente em relação à crença doutrinal, distinta da moral). Logo classifica esta opinião como absurda, errônea e loucura. Gregório XVI condena a liberdade de consciência porque deriva do indiferentismo. Porém o Papa dá a entender que a sentença sobre a liberdade de consciência é rejeitável também em si mesma. Classifica-a de absurda, errônea e loucura em si mesma¹⁸.
Mas por que é errônea e perversa? A resposta de Gregório se contém neste texto: “Este pestilentíssimo (pestilentissimo errori) que tem que afirmar e reivindicar para todos a liberdade de consciência abre caminho seguro na liberdade plena e imoderada de opiniões (plena illa, atque inmoderata libertas opinionum) que, para ruína da sociedade religiosa e civil se entende cada dia mais por todas as partes, chegando a imprudência de alguns de assegurar que dela se segue grande proveito para a causa da religião. E que pior morte para a alma que a liberdade do erro!, dizia Santo Agostinho. E certamente que, quebrado o freio que contém os homens nos caminhos da verdade, e inclinando-se precitadamente ao mal por sua natureza corrompida, consideramos já aberto aquele abismo do que, segundo viu São João, subia um homem que escurecia o sol e jogava gafanhotos que devastavam a terra”¹⁹.
Primeiro se refere à sentença sobre a liberdade de consciência como um erro pernicioso e diz que o ambiente liberal de seu tempo, isto é, a liberdade ilimitada e desenfreada de opiniões, favorece a difusão do dito erro. Influenciados por esse ambiente, alguns chegam inclusive dizer que desta liberdade se segue um grande bem para a religião. É óbvio que aqui se está referindo a Lamennais e seus amigos de L’Avenir, que é contra os que imediatamente foi escrita a encíclica²⁰.
Segundo Lucien Bernard, o Papa sustenta neste texto que a sentença relativa à liberdade de consciência no âmbito religioso é funesta porque leva a liberdade do erro, que, segundo Santo Agostinho, causa a morte da alma. O Papa condenaria, segundo ele, a sentença sobre a liberdade religiosa porque estabelece um princípio válido sempre e não só em determinadas circunstâncias concretas: a realização dum estado da sociedade que inclusive formalmente deixa livre a difusão do erro em matéria religiosa. O Papa fala de um freio para manter os homens nos caminhos da verdade. Embora não o disse, Lucien Bernard interpreta que este freio teria que ser a autoridade com seu poder coercitivo²¹. Esforça-se também em dar um sentido unívoco a expressão “liberdade de consciência” condenada por Gregório XVI e chega à conclusão de que “se trata de uma liberdade por relação aos demais homens, aos poderes humanos de coerção (…) que podemos denominar ‘civil’ e que se trata de uma liberdade no domínio religioso”²².
Em conseqüência, Gregório XVI havia condenado o sistema de liberdade civil em matéria religiosa porque inclui formalmente a liberdade do erro religioso e das falsas religiões. Ao condenar isto e para rejeitar esse falso princípio, o Papa tinha negado que exista uma exigência (independentemente de considerações circunstanciais) de atribuir a qualquer a liberdade de consciência, que o mesmo Bernard Lucien interpreta como liberdade civil em matéria religiosa. O Papa não havia desconhecido o ponto de vista da dignidade pessoal, porém havia definido um elemento não exigido por esta dignidade.
Que dizer disto? O primeiro é que o vínculo entre o indiferentismo e a sentença que defende a liberdade de consciência para todos não é só um fato ou algo que sustentam os defensores, mas algo que o mesmo Gregório XVI reconhece que é assim. Dele se deduz que a liberdade de consciência que o tem diante e condena é a que se deriva do indiferentismo. No entanto, a liberdade de consciência que sai do indiferentismo é uma liberdade omnímoda e imoderada por falta de critérios ou limites internos e externos. Por isso concordo com os que afirmam que Gregório XVI condenou só o direito a liberdade omnímoda de consciência²⁴.
O mesmo Papa o disse em sua posterior encíclica Singularis Nos: “a doutrina católica que definimos em nossa memorável carta (Mirari vos) por a autoridade confiada a nossa humildade bem seja em torno à devida submissão ao poder (…) bem seja a condenação da liberdade omnímoda de consciência”²⁵.
Pio IX (1846-1878) repropõe as condenações de seus predecessores, sobre tudo, na Quanta cura²⁶ e no Syllabus²⁷, publicados conjuntamente em 8 de dezembro de 1864. Neles Pio IX condena a liberdade de consciência e de cultos que considera uma conseqüência do naturalismo político, que por sua vez se fundamente no naturalismo filosófico.
Havendo condenado já os principais erros de seu tempo em outros documentos²⁸, Pio IX declara que é necessário condenar de modo especial “outras falsas opiniões, que brotam daqueles erros como de sua fonte natural”²⁹. Estas falsas opiniões devem ser objeto de uma condenação especial porque buscam um duplo objetivo: por uma parte, impedir e suprimir a influência saudável que corresponde a Igreja em relação aos indivíduos, as nações e a seus soberanos; e, por outra, destruir a união e concórdia do sacerdócio e do império³⁰.
Na continuação Pio IX condena das opiniões que provém da aplicação a sociedade civil do princípio ímpio e absurdo do naturalismo. Este é um erro fonte e aparece implicitamente condenado; as opiniões explicitamente condenadas e declaradas errôneas se referem à natureza do governo civil. A primeira vem expressa nestes termos: “os que aplicam ao Estado o princípio do naturalismo tem a ousadia de ensinar que a forma mais perfeita de Estado e progresso civil exigem imperiosamente que a sociedade humana seja constituída e governada sem consideração alguma a religião, e que como se esta não existisse, ou por menos, sem fazer diferença alguma entre a verdadeira religião e as religiões falsas”³¹.
A segunda opinião vem apresentada nos seguintes termos: “tem a ousadia de ensinar que a forma mais perfeita de Estado e progresso civil exigem imperiosamente que a sociedade humana seja constituída e governada sem consideração alguma a religião, e como se esta não existisse, ou por menos, sem fazer diferenciação alguma entre a verdadeira e as religiões falsas”³²
Na primeira condenação Pio IX recorda indiretamente o dever moral dos homens e as sociedades para com a verdadeira religião. Ao declarar falsa a teoria segunda, ensina implicitamente que é officium ou tarefa do bom governo reprimir aos violadores da religião, que existam na sociedade de seu tempo. Em todo caso, não se deduz da condenação que dito governo deva reprimi-los sempre e em todo caso. Trata-se de uma tarefa positiva que pode admitir dispensa em função das circunstâncias.
Os violadores da religião católica são os que não respeitam, mas que atentam contra os direitos da religião católica. O liberal condenado é o que sustenta que o Estado ideal é aquele em que se pode ofender e atacar a Igreja quanto se queira, com tal que não se turbe a tranqüilidade pública estabelecida pela lei. E como se tem que entender esta paz pública? A expressão forma parte da citação do autor condenado e, portanto, há de ser entendida, não no sentido no que se pode entendê-la o Papa, mas em o sentido que a entende o autor condenado. Isto é, que o sentido do artículo 10 da Declaração de 1789: a ordem pública estabelecidade pela lei enquanto expressão da vontade geral. O pensamento liberal não reconhece mais limites à liberdade que os ensinados pela lei positiva. E na ordem pública liberal não se reconhece nenhum critério externo natural nem sobrenatural. Por isso, a dita ordem pública liberal não equivale à justa ordem pública do que fala DH³³.
Pois bem, segundo Pio IX, partindo desse princípio falso do regime político, alguns autores defendem uma teoria errônea sobre a liberdade religiosa que sintetiza em três afirmações básicas: “Desta idéia absolutamente falsa (ex qua omnino falsa (…) Idea) do regime político [esses autores] passam sem escrúpulo a defender aquela teoria errônea (illam opinionem), fatal para a Igreja católica e a salvação das almas, que nosso predecessor, de feliz memória, Gregório XVI chamava loucura, isto é, (a) que a liberdade de consciência e de cultos é um direito livre de cada homem, (b) que deve ser proclamado e garantido legalmente em todo Estado bem constituído e (c) que os cidadão tem direitos a mais absoluta liberdade (omnimodam) para manifestar e defender publicamente suas opiniões, quaisquer que sejam (conceptus quoscumque), de palavra, por escrito ou de outro modo qualquer, mas que a autoridade eclesiástica ou a autoridade civil podem limitar esta liberdade (nulla vel ecclesiastica, vel civile auctoritate)”³⁴.
Chama a atenção que na frase introdutória reduza todas as condenações feitas antes separadas a uma idéia e que reprove aos que já condenados a ousadia de sustentar aquela opinião (também em singular) condenada por Gregório XVI, quando na realidade são várias as proposições condenadas. Este detalhe põe de relevo que o Papa contempla ditas proposições formando um todo sistemático desde o que se explicam e esclarecem mutuamente³⁵.
Pio IX tinha querido referir-se a condenação de Gregório XVI, mas não a tinha reproduzido literalmente, mas tinha introduzido várias precisões. Em primeiro lugar, enquanto Gregório XVI falava só de liberdade de consciência, Pio IX fala de liberdade de consciência e de cultos. Portanto, a liberdade condenada se refere ao âmbito do religioso em sua integridade: tanto as atividades individuais como as coletivas, atos de cultos e difusão de idéias, inclusive em público e por todos os meios possíveis. Em segundo lugar, enquanto Gregório XVI se limita a condenar a idéia de que se devia afirmar e reivindicar para cada homem diz liberdade sem precisar se era um direito, Pio IX precisa que se trata de não reivindicar que seja um direito livre de cada homem. Em terceiro lugar, enquanto Gregório XVI não fazia referência alguma a lei positiva da sociedade, Pio IX condena também que este direito de consciência e de cultos deva ser proclamado e afirmado pela lei. Em quarto lugar, enquanto Gregório XVI condena uma prática que se deixava sem freio a expansão do erro, Pio IX explicita que esses freios seriam a autoridade eclesiástica ou a civil.
Condena Pio IX a liberdade de consciência e opinião que havia condenado Gregório XVI ou condena outra coisa distinta? Como se deduz do texto, Pio IX quis condenar a mesma liberdade de consciência e de opinião condenada por Gregório XVI, embora precisando seu significado. Gregório XVI havia condenado estas liberdades enquanto formavam parte de um sistema em que as propriedades de uma liberdade condicionam as da outra. Portanto, se a liberdade de opinião por ele condenada era ilimitada, também o seria a liberdade de consciência, embora não o havia dito explicitamente ao falar dela. Em todo caso, Pio IX não se tinha limitado a combinar uma série de doutrinas e condenações de diversos predecessores, sem ter vinculado estritamente umas com outras e tinha tentado apresentar em resumo a globalidade de um sistema em que as idéias estão estritamente imbricadas e que não pode ser outro que o que dimana da Declaração de 1789.
Que Pio IX havia querido condenar o sistema liberal em sua globalidade e que, dentro desse sistema, o direito a liberdade de consciência e de liberdade de opinião são inseparáveis não significa que não havia querido condenar cada uma das partes desta opinião. Trata-se de uma opinião complexa que inclui um conjunto de proposições: a reivindicação da liberdade de consciência e de cultos como um direito próprio de cada homem; a necessidade de que toda a sociedade bem ordenada reconheça esta reivindicação na lei, e o direito a uma liberdade absoluta e ilimitada de manifestar suas opiniões.
Mas, apesar desta diversidade de sentenças, o conjunto delas forma um todo unitário. Por isso, se condena a liberdade de opinião e expressão só enquanto omnímoda e ilimitada, se há de entender também que condena a liberdade de consciência e de cultos só enquanto é omnímoda e ilimitada. Não condena só a anarquia, isto é, a falta absoluta de todo limite, mas o liberalismo, isto é, a liberdade limitada só pela paz pública estabelecida pela lei, e, portanto, insuficientemente limitada internamente (sejam quais sejam suas opiniões) e externamente (não a pode limitar nenhuma autoridade nem eclesiástica nem civil)³⁶.
Pio IX condena uma liberdade de consciência e de cultos que consiste em um direito natural de pensar, atuar, dizer, escrever e publicar não importa o que em matéria religiosa. Como é natural, este direito não pode ser limitado pela Igreja nem a autoridade civil. Não há possibilidade de pôr limite algum nem intrínseco nem extrínseco a este direito: “E, quando na sociedade civil é desterrada a religião e ainda repudiada a doutrina e autoridade da mesma revelação, também se obscurece e até se perde a verdadeira idéia da justiça e do direito, em qual lugar triunfam a força e a violência, claramente se vê porque certos homens, depreciando em absoluto e desejando a um lado os princípios mais firmes da sã razão, se atrevem a proclamar que "a vontade do povo manifestada pela chamada opinião pública ou de outro modo, constitui uma suprema lei, livre de todo direito divino ou humano; e que na ordem política os fatos consumados, pelo mesmo que são consumados, têm já valor de direito"³⁷.
Assim, pois, o marco da condenação de Pio IX faz da liberdade de consciência e de cultos vem dado pelo positivismo jurídico, mas também pelo Contrato Social e a Declaração de 1789 em que “a vontade do povo (…) a opinião pública constitui a lei suprema, independente de todo direito divino e humano”. Como Pio VI, tampouco Pio IX se preocupam de uma liberdade de consciência e de cultos que seria só a exigência natural a um direito civil puramente negativo, isto é, não ser obrigado a atuar contra a consciência ou não ser impedido de atuar conforme ela. Não condena a idéia de converter em lei positiva uma exigência natural negativa respeito a uma liberdade civil.
O que condena é que seja proclamada e declarada por lei uma autorização positiva para que o homem possa fazer o que queira em matéria de consciência e de cultos³⁸. Em qualquer caso, como Gregório XVI não definia o que entendia por liberdade de consciência, tampouco Pio IX define o que entende por liberdade de consciência e de cultos.
Junto a Quanta cura Pio IX publicou o Syllabus, uma lista de oitenta proposições condenada. As condenações contidas coincidem com as já mencionadas da encíclica. Basta assinalar aqui que o naturalismo político antes mencionado se baseia no naturalismo filosófico, segundo o qual “a razão humana, sem ter em conta a relação alguma com Deus, é o arbítrio único da verdade e da mentira, e do bem e do mal; é a lei de si mesma, e com suas forças naturais se basta para procurar o bem dos homens e dos povos”³⁹. Afirmar, pois, que a consciência é livre significa que não há ordem moral que transcenda o homem. É o que posteriormente Leão XIII denominará consciência sem lei.
2. Leão XIII, Pio XI e Pio XII põem em primeiro plano de sua preocupações a dignidade, liberdade e direitos fundamentais da pessoa humana
Com Leão XIII se inicia na Igreja um lento processo de discernimento das liberdades modernas a luz da própria tradição. Em sua encíclica Inmortale Dei (1 de novembro de 1885) repropõe as condenações das liberdades modernas feitas por Gregório XVI e Pio IX, mas introduz algumas precisões importantes das mesmas a partir de uma reflexão mais detido e ampliado sobre a liberdade⁴⁰. O objeto de sua preocupação é a permissão positiva de pensar o que se quer em matéria religiosa que se havia introduzido nas constituições dos povos como conseqüência da teoria da soberania popular absoluta⁴¹. Segundo Leão XIII, da soberania popular absoluta se segue que é permitido positivamente pensar o que se quer em matéria religiosa. E desta autorização positiva se segue três conseqüências: uma liberdade absoluta no juízo da consciência individual, umas opiniões libérrimas no relativo ao dever de dar ou não dar culto a Deus, e uma liberdade ilimitada de opinião e de pensar, fonte de tantos males⁴².
Porém Leão XIII não se limita a apresenta a concepção moderna do direito, mas tenta refutá-la a partir de uma hermenêutica cristã da liberdade humana de marca tomista. Considera que a liberdade é um elemento da perfeição do homem, mas aponta que dita perfeição procede da vinculação natural e originária do entendimento e a vontade a verdade e ao bem. A razão é sempre a mesma e não é menos imutável que a mesma natureza das coisas. Se a inteligência se adere a opiniões errôneas, se a vontade escolhe o mal e se adere a ele, nem a inteligência e nem a vontade alcançam a sua perfeição, mas abdicam de sua dignidade natural e ficam corrompidas.
Não é, pois, justo publicar e pôr a luz dos olhos dos homens as coisas contrárias a virtude e a verdade, e muito menos defendê-las com o favor e tutela das lei; e se aparta da norma ensinada pela natureza toda sociedade que permita uma liberdade de pensamento e de ação que com seus excessos podem extraviar impunemente as inteligências da verdade e as almas da virtude, e exclui a Igreja da vida social, das leis, e da educação da juventude e das famílias⁴³.
Leão XIII recorda a continuação das condenações de Gregório XVI, mas com as precisões pertinentes que esclarecem o significado em certo modo indeterminado que nelas tinham: a) em matéria de religião o homem não está obrigado a fazer uma escolha concreta; b) cada um é livre para julgar segundo seus gostos em matéria religiosa; c) cada um, está submetido ao juízo de sua consciência; cada um tem liberdade plena para divulgar suas opiniões; e d) está permitido organizar a revolução na sociedade⁴⁴.
Os dois primeiros erros se referem ao indiferentismo; o terceiro a liberdade de consciência; e o quarto, a liberdade de opiniões e de pensar. Conclui fazendo uma espécie de resumo das doutrinas condenadas por Pio IX e seus predecessores. Entre elas inclusive a de que negam a obrigação moral do indivíduo e das sociedades em matéria religiosa, e a de quem defendem uma liberdade imoderada de pensamento e expressão⁴⁵.
Leão XIII recorda que “é costume da Igreja vigiar com muito cuidado para que ninguém seja forçado a abraça a fé católica contra sua vontade, porque, como observa Santo Agostinho, “o homem não pode crer mais que de boa vontade”⁴⁶.
Mas, por outra, escreve que “a Igreja não pode aprovar uma liberdade que leva ao desprezo das leis santíssimas de Deus”⁴⁷, liberdade que Santo Agostinho chamava de liberdade de perdição e São Pedro, véu de malícia. Essa liberdade, ao ser contrária a razão, é uma verdadeira escravidão, porque o que faz o pecado é escravo do pecado. Em contrário, a autêntica liberdade vem da verdade e do bem, e “a Igreja é a primeira em aprovar essa liberdade justa e digna dos homens”⁴⁸. Por esta “os católicos dignos deste nome (…) hão de esforçar-se para que a liberdade de obrar não ultrapasse os limites assinalados pela natureza e lei de Deus”⁴⁹.
Em definitivo, vemos que Leão XIII não se limita a repetir as condenações que seus predecessores fizeram das chamadas liberdades modernas, mas que emoldura em uma reflexão ampliada sobre a liberdade humana. Deste quadro, faz uma apresentação – e interpretação – das mesmas que reforça os que vínhamos dizendo: os Papas anteriores condenam a liberdade de obrigação moral – isto é, que não havia nenhuma obrigação religiosa específica -, sua proclamação por via de autorização positiva de indiferença; e a liberdade civil imoderada em matéria religiosa que dela se segue.
Leão XIII prossegue sua reflexão sobre a liberdade em geral e sobre as liberdades modernas em particular em sua encíclica Libertas praestantissimum de 1888⁵⁰. Mas o que interessa agora desta encíclica é a precisão da liberdade de consciência condenada por seus predecessores e a definição que dá a verdadeira liberdade de consciência, definição que supõe o início de uma interpretação autêntico do que se há de entender da mesma.
Por o que se refere a liberdade de cultos, Leão XIII não a define. Limita-se a condená-la em seu fundamento, e porque é contrária a Deus Criador. Ademais, concedê-la seria autorizar positivamente que um pode atuar impunemente contra a religião: “Em primeiro lugar examinaremos em relação com os particulares, essa liberdade tão contrária a virtude da religião a chamada liberdade de cultos, liberdade fundada na tese de que cada um pode, a seu arbítrio, professar a religião que prefere ou não professar nenhuma. Esta tese é contrária a verdade. Porque de todas as obrigações do homem, a maior e mais sagrada é, sem dúvida alguma, a que nos manda dar a Deus o culto da religião e da piedade (…) Por isto, conceder ao homem esta liberdade de cultos de que estamos falando equivale a conceder-lhe o direito de desnaturalizar impunemente uma obrigação santíssima e de ser infiel a ela, abandonando o bem para entregar-se ao mal.”⁵¹.
Depois de falar da liberdade de expressão, imprensa e ensinar, refere-se à liberdade de consciência que a primeira vista apresenta como distinta da liberdade de cultos. Mas distingue dois modos de entendê-la. Vale a pena reproduzirmos o texto: “Muito se fala também da chamada liberdade de consciência. Se esta liberdade se entende no sentido de que é lícito a cada um, segundo lhe pareça, dar ou não dar culto a Deus, está suficientemente refutada com os argumentos anteriores [contra a liberdade de cultos]”⁵².
Encontramos aqui, pela primeira vez no magistério pontifício do século XIX, uma definição da sentença sobre a liberdade de consciência condenada pelos Papas. É a sentença defendida pelos liberais e que identifica a liberdade de consciência com a liberdade de cultos considerada em seu fundamento, isto é, a que sustenta que cada um é lícito dar ou não dar culto a Deus segundo lhe pareça. Pois bem, dita liberdade leva consigo uma autorização positiva de atuar como quer em matéria de religião. Supera os limites da tolerância, posto que não distingue entre o bem e o mal.
Esta liberdade não é um direito natural: “Das considerações expostas se segue que é totalmente ilícito pedir, defender, conceder a liberdade de pensamento, de imprensa, de ensinar, de cultos, como outros tantos direitos dados pela natureza ao homem. Porque se o homem tivesse recebido estes direitos da natureza, teria direito a rejeitar a autoridade de Deus e a liberdade humana não poderia ser limitada por lei alguma.”⁵³
Mas acrescenta que há outra verdadeira liberdade de consciência, que forma parte da liberdade cristã, protege a dignidade humana e tem sido sempre defendida pela Igreja. É o que explica a continuação: “Mas [a liberdade de consciência] pode entender-se também no sentido de que o homem na sociedade se lhe permite seguir, segundo sua consciência, a vontade de Deus e de cumprir seus mandamentos sem impedimento algum (nulla re impediente, in civitate liceat).
Esta liberdade, a liberdade verdadeira, a liberdade digna dos filhos de Deus que protege tão gloriosamente a dignidade da pessoa humana (quae humanae dignitatem personae honestissime tuetur), está além de toda violência e de toda opressão e tem sido sempre o objeto dos desejos e do amor da Igreja. Esta é a liberdade que reivindicaram constantemente para si os apóstolos, esta é a liberdade que confirmaram com seus escritos os apologistas, esta é a liberdade que consagraram com seu sangue os inumeráveis mártires cristãos. E com razão, porque a suprema autoridade de Deus sobre os homens e o supremo dever do homem para com Deus encontra nesta liberdade cristã um testemunho definitivo (…) Pelo contrário, os partidários do liberalismo que fazem ao Soberano um senhor despótico e com poder ilimitado e afirmam que temos de viver sem ter em conta para nada a Deus, rejeita totalmente esta liberdade”⁵⁴.
Esta liberdade de consciência que forma parte da liberdade cristã tem uma dimensão de permissão na vida civil. Portanto, tem que entendê-la no sentido não só moral, mas também jurídico. O objeto desta permissão é seguir a vontade de Deus e cumprir os mandamentos sem ser impedido. Obviamente, Leão XIII se move, todavia nos esquemas da doutrina tradicional da tolerância. Mas, na medida em que valoriza a liberdade consciência nesse sentido feito, prepara o caminho para a DH do Vaticano II.
Leão XIII põe também no centro de suas preocupações alguns ensinamentos da tradição cristã que vão preparando o caminho para o Vaticano II. O primeiro é que todo homem é a imagem de Deus, isto é, pessoa livre, responsável e dotada de uma dignidade que Deus mesmo respeita. Essa dignidade é a raiz de direitos naturais, universais, invioláveis e indeclináveis⁵⁵. Refere-se principalmente aos direitos do homem no mundo econômico.
O segundo é o que os direitos estão unidos a outros tantos deveres e, portanto, o homem não pode renunciá-los. O direito a uma justa retribuição está unido ao dever de viver dignamente e, portanto, de prover para eles os meios necessários. Por isso, não se pode renunciar a esse direito⁵⁶. O direito ao descanso festivo unido ao dever de dar culto a Deus. Não é, pois, um direito ao que se pode renunciar⁵⁷. Em todo caso se trata de direitos fundamentos na ordem moral: ordem objetiva, universal e absoluta.
O terceiro ensinamento é que o homem é anterior e superior ao Estado⁵⁸. A tarefa deste não é eliminar, mas receber, reconhecer, garantir, defender, harmonizar e promover os direitos dos cidadãos e facilitar o cumprimento de seus deveres⁵⁹.
Pio XI é o primeiro Papa que não só apela aos direitos da pessoa, mas que o faz de uma maneira mais orgânica e sistemática. O marco de seu magistério vem determinado por o que foi sua missão histórica: defender a liberdade da Igreja, assim como a dignidade, liberdade e direitos da pessoa humana frente a estatolatría e os totalitarismos (fascismo, nazismo e comunismo)⁶⁰. Os seres humanos são sociais por natureza. Mas essa relação entre os particulares e a sociedade corresponde à prioridade a pessoa humana: sua razão de ser da sociedade e da comunidade política é contribuir ao aperfeiçoamento das pessoas particulares⁶¹. As relações entre os particulares e a sociedade se determinam a partir dos direitos e deveres respectivos. Certamente, os poderes públicos têm o direito de exigir – inclusive coercitivamente – dos cidadãos o cumprimento de seus deveres para com a sociedade, mas também tem o dever de reconhecer e respeitar os direitos que eles têm como pessoas⁶². Além disso, os poderes públicos têm o direito não só de reconhecer e respeitar, mas também de tutelar esses direitos⁶³.
Pio XI distingue entre a relação dos seres humanos com a ordem moral objetiva, e a relação dos seres humanos entre si na convivência e com os poderes públicos na sociedade civil. No que se refere à relação dos seres humanos com a ordem moral objetiva, condena a expressão “liberdade de consciência” porque “é uma frase equivocada e de que se há abusado demasiadamente para significar a absoluta independência da consciência, coisa absurda na alma criada e redimida por Deus”⁶⁴. Isto é, rejeita a expressão “liberdade de consciência” porque implica o indiferentismo moral e religioso. Em contrário, Pio XI se declara “alegre e orgulhoso de combater a boa batalha pela liberdade das consciências”, isto é, “o direito das almas a procurar o maior bem espiritual sob o magistério e a obra formativa da Igreja (…) e o direito das almas assim informadas de fazer que participem dos tesouros da redenção outras almas, colaborando desta maneira na atividade do apostolado hierárquico”⁶⁵.
Na encíclica Divini Redemptoris defende, frente ao comunismo ateu, que Deus tinha conferido ao homem “o direito de ir a seu fim último por o caminho traçado por Ele”⁶⁶ Na carta Firmissimam constantiam ao episcopado mexicano declara: “Deve se admitir que a vida cristã necessita apoiar-se, para seu desenvolvimento, em meios externos e sensíveis; que a Igreja, por ser uma sociedade de homens, não pode existir nem desenvolver se não goza de liberdade de ação, e que seus filhos tem direitos a encontrar na sociedade civil possibilidades de viver em conformidade com os ditames da consciência”.⁶⁷ Na encíclica Mit brennender Sorge sustenta que o crente tem um direito inalienável de professar sua própria fé e praticar na forma a ele que convém. As leis que suprimem ou fazem difícil a profissão e a prática desta fé se opõe ao direito natural”⁶⁸. Como diz Pietro Pavan, não está claro pelo contexto se se refere aos cristãos, aos católicos ou a todos os que vivem em conformidade com sua consciência⁶⁹.
Pio XII tinha que enfrentar não só aos totalitarismos, mas também a ameaça e explosão da Segunda Guerra Mundial. Como o de Leão XIII e Pio XI, seu magistério social se articula em torno das afirmações: a existência de uma ordem moral universal e a centralidade, dignidade e direitos do homem como pessoa. Esse quadro, a experiência do totalitarismo e as aspirações dos homens diante a catástrofe da Segunda Guerra Mundial lhe permitam dar alguns passos doutrinais que abrem o caminho a afirmação do direito universal a liberdade religiosa: a centralidade da pessoa, a assunção da concepção jurídica do Estado, a exigência da liberdade para que a Igreja pode cumprir sua própria missão e a afirmação de que se há de reprimir o erro e o mal só em caso de oposição as leis penais.
A catástrofe da guerra leva aos homens e aos povos a desejar uma nova ordem nacional e internacional. Pio XII quer contribuir com seu magistério a assentar as bases do mesmo. Pois bem, adverte que “essa nova ordem (…) tem que alcançar sobre a rocha indestrutível e imutável da lei moral, manifestada por o mesmo Criador mediante a ordem natural e esculpida por Ele nos corações dos homens com caracteres indeléveis; a lei moral, cuja observância deve ser incluída e promovida pela opinião pública em todas as nações e em todos os Estados com unanimidade de voz e de força, que ninguém pode atrever-se a pô-la em dúvida ou a debilitar sua força obrigatória”⁷⁰. Pio XII reafirma a existência de uma ordem moral objetiva, transcendente e universal segundo a qual há de regular todas as relações da convivência. Apesar de todas as mudanças sociais e políticas, “o fim de toda vida social permanece idêntico, sagrado e obrigatório: o desenvolvimento dos valores pessoais do homem como imagem de Deus”⁷¹.
Mas Pio XII contribui para descobrir a centralidade da pessoa humana com esta ordem moral. Na realidade, o motivo constante de seu magistério social e político é a centralidade do “homem como pessoa autônoma, isto é, como sujeito de deveres e direitos invioláveis, raiz e fim de sua própria vida social”⁷². Quando empreendeu a tarefa de elaborar um corpo doutrinal e pastoral para fazer frente aos problemas da guerra, tinha declarado que a finalidade, que ele atribuía a todos os homens de boa vontade, era de “devolver a pessoa humana a dignidade que Deus lhe concedeu desde o princípio”⁷³. Concluiu esse corpo doutrinal com a radiomensagem de natividade de 1942 Benignitas et humanitas, nela que levanta o problema da democracia e reconhece que a finalidade de seu magistério coincidia com as aspirações da humanidade, que escolarizados por os excessos da tirania totalitária havia despertado a uma nova consciência pessoal e política⁷⁴.
A ideologia e a prática totalitária haviam convertido o homem em massa manipulada ao serviço dos fins do poder totalitário. Ele considerava que celebração da Natividade comemora a seu tempo “a benevolência do Verbo encarnado e a dignidade do homem”⁷⁵, dignidade entendida não no aspecto pessoa, mas também na vida social. Por isso, ele se ocupa do tema da democracia, não o faz atendendo a sua “estrutura e organização exterior, as quais dependem de as aspirações peculiares de cada povo, mas ao homem como tal, tão longe de ser o objeto e o elemento puramente passivo da vida social, é, por o contrário, e deve ser e permanecer, seu sujeito, seu fundamento, e seu fim”⁷⁶.
Em relação com a centralidade moral e política da dignidade da pessoa humana está a concepção jurídica e constitucional do Estado e do poder político⁷⁷. Na realidade, partindo da centralidade social do homem como pessoa e desenvolvida a idéia de segurança legal, já expressa por Leão XIII na Rerum novarum, Pio XII assume e descreve a concepção jurídica do Estado ao serviço dos direitos da pessoa humana⁷⁸. Na radiomensagem de Pentecostes de 1941 infere deste direito o que há de ser a função primordial do governo: “Tutelar o campo intangível dos direitos da pessoa humana e fazer levar o cumprimento de seus deveres, deve ser ofício essencial de todo poder público”⁷⁹.
Esta aceitação da concepção jurídica do Estado, isto é, a idéia de um governo constitucional, cujos poderes estão limitados por uma lei fundamental e cuja função primordial é proteger os direitos do homem e facilitar o cumprimento de seus deveres constitui um passo imprescindível para chegar a noção de liberdade religiosa como direito humano, civil, pessoal e comunitário, tal como o proclama o Vaticano II na DH.
Em 10 de dezembro de 1948 a Assembléia Geral das Nações Unidas havia proclamado a Declaração Universal dos direitos humanos. O artigo 18 da mesma disse: “Toda pessoa tem o direito a liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito inclui a liberdade de escolha de religião ou de crenças e a de confessar sua religião ou sua fé, individual ou coletivamente, assim em público como em privado, mediante o ensinamento, a prática, o culto e o cumprimento de prescrições religiosas”. No discurso Ci riesce de 1953 Pio XII levanta a questão da regularização jurídica da matéria religiosa na comunidade internacional⁸⁰. O Papa não menciona nela a Declaração das Nações Unidas, mas é óbvio que a tinha em conta. Para entender o que disse, há de se ter em conta também a teoria das teses e hipóteses sobre as obrigações dos governantes católicos em relação à fé cristã. Esta teoria mantinha como regra comportamento moral que o governo devia reprimir o erro e o mal, onde a medida em que esta repressão fosse possível, e devia ser tolerada só onde e na medida onde a tolerância seja necessária. Isto é, o critério da repressão era a possibilidade. Portanto, quando um governante cristão pode reprimir e não o faz descumpre seus deveres. Em contraste, Pio XII aponta que o critério da repressão não deve ser a possibilidade, mas a necessidade, e esta vem determinada por a oposição às leis penais do Estado.⁸¹ Pio XII pensa no problema moral que as Nações Unidas tem vindo a criar com esta Declaração a um governante ou jurista católico em relação a repreensão ou não do livre exercício de uma crença ou prática religiosa ou moral dentro de um Estado constitucionalmente cristão ou católico. Pergunta-se ele não impedir ou tolerar está permitido em tais circunstâncias e, por o mesmo, se a repreensão positiva não é sempre um dever. Pois bem, em sua resposta Pio XII não põe o critério na possibilidade (teoria das teses e hipóteses), mas na necessidade de reprimir, e, mais concretamente, nas exigências da ordem pública: todos os Estados deveriam permitir a seus cidadãos o exercício de suas crenças e práticas morais e religiosas na medida em que não infrinjam as leis penais do Estado⁸². Embora, Pio XII continua firme na tese que vincula objetivamente o direito a verdade e nega todo direito ao erro: “o que não responde a verdade e a norma moral não tem objetivamente direito algum nem a existência nem a propaganda nem a ação”⁸³
3. A Igreja abraça a liberdade religiosa fundada na dignadade da pessoa
O abraço da Igreja com a liberdade religiosa se realiza em dois passos. O primeiro foi dado por João XXIII em sua encíclica Pacem in terris; o segundo, pelo Vaticano II na DH.
1) João XXIII assume o conteúdo da Declaração Universal dos direitos humanos de 1948 e inclusive entre eles a liberdade religiosa: João XXIII dá um passo histórico na encíclica Pacem in terris (11 de abril de 1963) ao assumir o conteúdo da Declaração Universal dos direitos humanos das Nações Unidas de 1948⁸⁴ e incluindo a liberdade religiosa entre os direitos humanos: “Entre os direitos do homem deve-se enumerar também o de poder venerar a Deus, segundo a reta norma da consciência e professar a religião em privado e em público”⁸⁵. João XXIII fundamenta o direito a liberdade religiosa na reta consciência. Deste modo rompe a linha tradicional que afirmava oficialmente e oficiosamente que só os crentes (ou católicos) tinham direito a liberdade em matéria religiosa, porque só eles professavam a religião verdadeira. Em vez de referir-se a verdadeira religião, João XXIII se refere à rectitude da consciência. Deve-se, pois, afirmar este direito como inerente a todas as pessoas que tem consciência reta.
2) Ele abraçou entre a Igreja e a liberdade religiosa culminada na DH: A DH do Vaticano II é a fruta romã do desenvolvimento do magistério da Igreja sobre a liberdade religiosa⁸⁶. Com ela se termina o abraço entre a Igreja e a liberdade religiosa. Limito-me a comentar os elementos essenciais (sujeito, natureza, objeto, e fundamento) do direito a liberdade religiosa no âmbito social e civil, tal como aparecem no texto de DH 2 reproduzido ao princípio deste trabalho⁸⁷.
A.- O sujeito do direito a liberdade religiosa: Os sujeitos do direitos a liberdade religiosa são, em primeiro lugar, todos os homens enquanto pessoas, sendo ou não crentes. Este direito permanece mesmo naqueles que não cumprem com a obrigação de buscar a verdade e aderir-se a ela e não se pode impedir seu exercício com tal que guarde a justa ordem pública⁸⁸. Quando fala do âmbito no que o direito se pode exercer, os Padres conciliares utilizam a expressão “in re religiosa, quer dizer, em matéria religiosa. O ateu dá ao problema religioso uma solução negativa. Embora, também esta solução entra dentro da matéria religiosa. Mais adiante que também são sujeitos de direitos a liberdade religiosa as pessoas jurídicas, quer dizer, as comunidades religiosas enquanto dotadas de uma personalidade jurídica própria: “A liberdade ou imunidade de coação em matéria religiosa, que compete às pessoas tomadas individualmente, também lhes deve ser reconhecida quando atuam em conjunto. Com efeito, as comunidades religiosas são exigidas pela natureza social tanto do homem como da própria sociedade” ⁸⁹.
Pois bem, o direito a liberdade religiosa implica que não se impeça coativamente as comunidades de organizar sua própria vida segundo suas próprias normas no âmbito de culto, a educação de seus membros, a criação das instituições com este fim, a formação, o nomeamento e transferência de seus ministros. E, em terceiro lugar, são também sujeitos deste direito as famílias dentro do qual a vida religiosa depende normalmente dos pais. A estes lhes correspondem também o direito de decidir sobre a educação religiosa dos filhos e, portanto, de escolher com este fim as escolas e demais meios. Os poderes públicos estão obrigados a reconhecer e respeitar este direito, sem fazer seu exercício demasiado pesado com cargas injustas⁹⁰.
B.- Natureza: direito natural que deve ser reconhecido com o direito civil: Na última fase do debates, os Padres conciliares, quase unanimemente, haviam chegado ao convencimento de que hoje se devia reconhecer a todos os homens o direito a liberdade em matéria religiosa. Mas havia divergências em relação a motivação e a natureza desse direito. Uma minoria sustentava que a liberdade religiosa pode ser considerada um simples direito civil positivo, outorgado em consideração as exigências atuais do bem comum: o pluralismo religioso reinante em todas ou em quase todas comunidades políticas; a crescente interdependência entre as diversas comunidades políticas que faz que o que suceda numa repercutida imediatamente nas demais; e a maior consciência que os seres humanos vão adquirindo de sua dignidade pessoal e que os levam a não tolerar, em matéria religiosa, interferências de pessoas ou outros poderes⁹¹.
Tratar-se-ia só de um direito positivo ou civil, e nem mesmo um direito civil que concretizaria um direito natural ou um direito fundamental da pessoa. Por isso, poderia desaparecer no futuro. Apoiavam-se na já mencionada concepção do direito segundo o qual só a verdade tem direitos, enquanto o erro não pode ter nenhum direito nem a existência, nem a propaganda, nem a ação. Não obstante, a maioria dos Padres se inclinavam por uma concepção da liberdade religiosa como direito natural ou direito fundamental da pessoa. Durante a fase final, a maioria aumentou fazendo converter-se quase em unanimidade. A DH consagra a posição doutrinal da maioria: “Este direito da pessoa humana a liberdade religiosa deve ser reconhecido no ordenamento jurídico da sociedade, de forma que se converta em direito civil”⁹².
Não se trata, pois, de um direito positivo conferido pelo Estado, mas um direito natural inserido na natureza dos homens (por Deus Criador), um direito, pois, que compete a todos e sempre, e que o Estado tem que reconhecer.
C.- Objeto e extensão do direito, a imunidade de coerção nas relações do homem com outros indivíduos, grupo sociais ou poderes públicos: O objeto do direito a liberdade religiosa é a exclusão de coação externa nas relações do homem com os outros homens, com os grupos sociais e com os poderes públicos. Muitos Padres que se opunham ao que finalmente se incluiu na Declaração persistiram em sua postura porque davam por suposto que o objeto do direito a liberdade religiosa eram as crenças. Dele deduziam que com a Declaração da liberdade religiosa se pretendia reconhecer direitos a possíveis doutrinas errôneas.
Mas devo dizer que o objeto do direito a liberdade religiosa não é o conteúdo das crenças religiosas, porque a relação entre uma pessoa e um valor (por exemplo, a verdade) não são relações jurídicas. Estas se dão sempre entre pessoas. Por isso, na redação final do título introdutório a expressão “liberdade religiosa” se adicionou dois adjetivos que não pareciam nos rascunhos: “liberdade religiosa civil e social”. Quis-se tirar assim que a liberdade religiosa que se proclama como direito não se refere às relações dos homens com Deus: se refere às relações dos homens entre si na vida social⁹³. A DH apresente o objeto de direito em forma negativa: é uma imunidade de coação entendida em duplo sentido: o homem tem o direito a não ser coagido a agir contra a própria consciência em matéria religiosa e a não ser impedido, dentro dos limites requeridos, de agir em conformidade com ela⁹⁴.
Trata-se de criar uma zona de segurança que garante a inviolabilidade de um espaço humano, no seio do qual cada um pode satisfazer sua exigência de mover-se por própria iniciativa e responsabilidade, e no que os demais não ponham obstáculos. Um espaço no qual cada pessoa humana toma consciência de que não pode subtrair a exigência de atuar por própria responsabilidade e, por ele, pedir que não se obstaculizem desde o exterior suas escolhas pessoais. Esse espaço deve incluir o cumprimento de atos exteriores de culto, individuais ou comunitários, privados ou públicos; a manifestação e difusão das próprias convicções religiosas; e o submetimento de todas as atividades de ordem terrena e temporal a sua fé religiosa, isto é, o poder comportar-se de acordo com sua própria fé em todos os âmbitos da existência humana. O espaço do direito das comunidades religiosas abarca a vida religiosa propriamente dita, a difusão da fé religiosa, e a animação religiosa das atividades e instituições de conteúdo temporal. A DH o expressa do seguinte modo: “Finalmente na natureza social do homem e na mesma índole da religião se funda o direito pelo que os homens, movidos por sua próprio sentido religioso, podem reunir-se livremente e estabelecer associações educativas, culturais, caritativas e sociais”⁹⁵
D.- O fundamento: a dignidade da pessoa humana: A DH ensina com toda claridade que o fundamento do direito à liberdade religiosa no sentido explicado não é outro que a dignidade da pessoa conhecida pela palavra de Deus, revelada e pela mesma razão. Agora, esta dignidade se identifica com o subjetivismo no sentido de que a pessoa pode dispor de si mesma de modo totalmente autônomo. A DH descarta indiretamente este subjetivismo quando diz que a lei divina, eterna, objetiva e universal é a norma suprema da vida humana, que cada homem tem o dever e o direito de buscar a verdade em matéria religiosa⁹⁶ e que seu exercício tem que estar limitado por normas jurídicas conformes a ordem moral objetiva⁹⁷. E o descarta diretamente quando diz “o direito a liberdade religiosa não se funda numa disposição subjetiva da pessoa, mas na própria natureza”⁹⁶ A DH afirma expressamente que o direito universal a liberdade religiosa se fundamente na dignidade do homem com pessoa, dotado de razão e vontade livre, exaltada por uma responsabilidade pessoal, e naturalmente inclinada e moralmente obrigada a buscar a verdade, sobre tudo a religião, e a aderi-se a ela.
Por isso, afirma também que conservam este direito quem não cumpre com a mencionada obrigação e que a estes não se pode impedir seu exercício enquanto respeitam a ordem pública justa: “Todos os homens, conforme a sua dignidade, como pessoas, isto é, dotados de razão e vontade livre, e por isso mesmo exaltados por uma responsabilidade pessoal, se vêem movidos, por sua mesma natureza, a buscar a verdade e, ademais, tem a obrigação moral de procurar, sobre tudo a verdade religiosa. Estão obrigados também a aderir a verdade conhecida e a ordenar toda sua vida segundo suas exigências (…) Pelo qual, o direito a esta imunidade permanece naqueles que não cumprem a obrigação de buscar a verdade e aderir a ela; e não se pode impedir seu exercício, desde que respeite a justa ordem pública”⁹⁹.
Finalmente, a raiz imediata da dignidade da pessoa humana se situa na natureza racional e livre que nos move a buscar a verdade e o sentido de nossa vida, a aderirmos à verdade conhecida, e a ordenar toda nossa vida segundo as exigências dessa verdade. Trata-se de uma dignidade ontológica radical dada por Deus Criador (e Redentor) e, portanto, não pode depender de ação alguma do homem. Por isso, conserva-se incluída aos que não atuam conforme ela. Os homens não podem satisfazer esta inclinação natural posta em nós por Deus Criador, se não gozamos de liberdade religiosa e imunidade de coação externa. O homem que expõe a questão de Deus e se sente intimamente e pessoalmente confrontado com Deus não deve sofrer pressão nem coação indevida alguma do exterior. Tal pressão e coação externas não podem ter influência positiva alguma neste terreno, constituem sempre um elemento perturbador e, sobre tudo, atentam contra a dignidade da pessoa¹⁰⁰.
4.
Com Paulo VI e João Paulo II, a Igreja se faz missionária da liberdade religiosa
Como a mulher do Evangelho que, quando encontra a moeda perdida, não se agüenta de alegria corre para dar a notícia as amigas, assim também a Igreja, depois de declarar e explicar a verdadeira liberdade religiosa no Concílio, no Posconcilio se faz missionária e pregadora da mesma. O dado doutrinalmente mais relevante dessa pregação é que inicia a busca da relação entre o direito a liberdade religiosa e os outros direitos da pessoa. O mérito dessa orientação doutrinal corresponde a Paulo VI, que não cessou nunca de defender que o direito a liberdade religiosa é um direito fundamental da pessoa, e que tem prioridade sobre os demais: “Desta justa liberação ligada a evangelização, que visa obter estruturas que salvaguardem as liberdades humana, não se pode separar o respeito a todos os direitos fundamentais do homem, entre os que a liberdade religiosa ocupada um posto de importância primária”¹⁰¹
Frente aos que acusam o Vaticano II e ao mesmo de separar-se da fé tradicional (Monsenhor Marcel Lefebvre, afirma com toda claridade a continuidade do Concílio com o Magistério anterior e a necessidade de interpretar o Concílio em função desta continuidade, e ensina que “o Concílio de nenhum modo fundamenta este direito a liberdade religiosa sobre o suposto dito de que todas as religiões e todas as doutrinas, inclusive errôneas, teriam um valor mais ou menos igual: o fundamenta em contrário sobre a dignidade da pessoa humana, a qual exige a consciência não ser submetida a contradições externas, que tendem a oprimir a consciência na busca da verdadeira religião e na adesão a ela”¹⁰²
Mas foi João Paulo II que considerou que a proclamação do direito a liberdade religiosa (e demais direitos humanos) forma parte da missão da Igreja no mundo contemporâneo⁰³. João Paulo II vincula a questão dos direitos humanos a missão da Igreja no mundo contemporâneo¹⁰⁴.
Obviamente inclui a liberdade religiosa e liberdade de consciência esses direitos, cuja violação ofende a dignidade do homem com independência da religião professada ou da visão de mundo que tem¹⁰⁵. O verdadeiro progresso humano depende em grande parte do respeito aos direitos da religião e da atividade da Igreja¹⁰⁶. Na Centesimus annus enumera os direitos humanos fundamentais, estabelece uma hierarquia entre eles e sustenta que o direito a liberdade religiosa é a frente e síntese dos mesmos¹⁰⁷.
Agora, a Igreja evangelizadora da liberdade religiosa mantém a condenação do indiferentismo e relativismo religioso. O Catecismo da Igreja Católica inicia o processo de recuperar o sentido das condenações do s. XIX, que interpreta como limitações do direito a liberdade religiosa¹⁰⁸. Falando da liberdade de consciência e de obrigação de buscar a verdade e de seguí-la uma vez conhecida, João Paulo II cita na Veritatis splendor as duas encíclicas nas quais se condenou o direito moderno a liberdade religiosa de consciência e a liberdade religiosa: la Mirari vos de Gregório XVI e a Quanta cura de Pio IX¹⁰⁹. Como sabemos o tema principal da Veritatis splendor é o da relação da liberdade com a verdade. Pois bem, João Paulo II recorda que continua tendo vigência os ensinamentos de Gregório XVI e Pio IX que vinculam tão estritamente as liberdade com a verdade. Mais concretamente, a Congregação para a Doutrina da Fé sustenta no documento que “a afirmação da liberdade de consciência e da liberdade religiosa (pelo Vaticano II não contradiz em nada a condenação do indiferentismo e do relativismo religioso por parte da doutrina católica, mas é totalmente coerente”¹¹⁰.
NOTAS
¹ Neste trabalho utilizo as seguintes siglas relativas as fontes do magistério da Igreja sobre a liberdade religiosa: DP I = Federico Rodríguez (ed.), Doctrina pontificia, Documentos sociales, BAC, Madrid 1964. DP II = José Luis Gutiérrez (ed.), Doctrina pontifícia II. Documentos políticos, BAC, Madrid, 1958.
² O trabalho mais amplo sobre o particular é a tese doutoral defendida no Atenep Romano de la Santa Cruz por FR. Basile (Rémi) Valuet, O.S.B., La liberte religieuse et la tradition catholique. Un cas de développement doctrinal homogène dans le magistère autbentique, t. I, Systématique, t. II, Chronologique, t. III, Alphabérique, Sainte-Madeleine, Le Barroux, 1995.
³ Uma apresentação entusiasta da gênese e conteúdo se pode ver em Marcel Gaucher,
La Révolution dês droits de l’homme, Gallimard, Paris, 1989.
⁴ Sobre a geração da Declaração cf. K. D. Erdmann, “Die Erklarung der Menschenrechte und die Privilegien der Staatsreligion”, em T. Strohm-H. D. Wendland, Kirche und moderne Demokratie, Wissenschaftliche Buchgesellschaft, Darmstadt, 1973 [75-124], 75-80. Este artigo havia aparecido primeiro como parte dum livro do mesmo autor com o seguinte título: Volssouverãnitat und Kirche. Studien uber das Verbaltnis von Staat und Religion in Frankreich vom Zusammentrill der Generalstãnde bis zum Schisma, Kolner Universitãtsverlag, Colonia, 1949, 63-109.
⁵ Cf. Erdmann, 177.
⁶Pio VI, Breve Quod aliquantum, em Colección de alocuciones consistoriales, encíclicas y demás letras apostólicas, Madrid, 1865, 63-153.
⁷ Quod aliquantum, 75.
⁸ Neste caso a tradução acima é minha. O texto latino se encontra também ali e diz assim: “Eo quippe consilio decernitur, in jure positum esse, ut homo in societate constitutus, omnimoda gaudeat libertata, ut turbari scilicet circa religionem non debeat, in ejusque arbítrio sit de ipsius religionis argumento, quidquid velit, opinari, loque, scribere, AC typis etiam evulgare; quae sane monstra ab illa hominum inter se arqualitate naturaeque libertate derivari, AC emanare declaravit”.
⁹ Quod aliquantum, 75-76.
¹⁰ Quod aliquantum, 75-78.
¹¹ Cf. Fr. Basile Valuet, La liberté religiuse et la tradition catholique, t. I, 342-343.
¹² Pio XII, Ci riesce 14, em DP II, 1012.
¹³ Cf. Fr. Basile Valuet, La Liberté religieuse et la tradition catholique, t. I, 343-344.
¹⁴ Gregório XVI, Encíclica Mirari vos arbitramur (15 agosto de1832), em Ação Católica Espanhola (ed.), Colección de encíclicas y documentos pontifícios, v. I, Publicações da Junta Nacional, Madrid, 1962, 3-11.
¹⁵ Mirari vos 9, em Colección de encíclicas, I, 7.
¹⁶ Mirari vos 9, em Colección de encíclicas, I, 7.
¹⁷ Mirari vos 10, em Colección de encíclicas, I, 7.
¹⁸ Cf. Bernard Lucien, Gregoire XVI, Pie IX et Vatican II. Études sur la liberté religieuse dans la doctrine catholique, Forts dans la foi, Tours, 1990, 16.
¹⁹ Mirari vos 10, en Colección de encíclicas, I, 8.
²⁰ Na Memoria apresentada ao Soberano Pontífice Gregório XVI pelos redatores de L’Avenir e os membros do Conselho da Agência Geral para a defesa da liberdade religiosa (3 de fevereiro de 1832) (cf. M. J. Le Guillou-Louis Le Guillou, La condamnation de Lammenais (dossiê), Beauchesne, Paris, 1982, 541-592) se disse que não tem outra defesa possível para a Igreja que “reclamar a separação da Igreja e do Estado (…) Era preciso além disso reconhecer com boa fé que a religião católica não é incompatível com a liberdade de cultos nem com a liberdade de ensinamento, nem com a liberdade de imprensa, nem com nenhuma outra forma de governo, e que inclusive estas diversas liberdades eram na França única força que pode preservar a Igreja de uma catástrofe semelhante a que tem perdido ao catolicismo na Inglaterra. Na realidade, suponhamos a liberdade de cultos, isto é, a tolerância civil, aniquilada na França, qual será o culto proscrito? Evidentemente, o culto católico” (ib., 562, 565).
²¹ Cf. Bernard Lucien, Gregoire XVI, Pie IX et Vatican II, 38.
²² Lucien, 33
²³ Lucien, 119-120.
²⁴ Cf. Basile (Rémi) Valuet, O.S.B., La liberte religieuse et la tradition catholique, I, 351-352.
²⁵ “Catholicam doctrinam, quam memoratis Nostris literis (Mirari vos), Tum de debita erga potestates subiectione (…), Tum demum de damnanda omnimoda conscientiae libertate…, pro auctoritate humilitati Nostrae tradita, definivimus” (Gregório XVI, Encíclica Singulari Nos: Enchiridion delle encicliche, ed. Latina e italiana, v. 2, 50, p. 56).
²⁶ Pio IX, Encíclica Quanta cura (8 de dezembro de 1864), em DP II, 5-18.
²⁷ Pio IX, Syllabus complectens praecipuos nostrae aetatis errores qui notantur in Encyclicis aliisque letteris Sanctissimi Domini Nostri Pii Papae IX (8 de dezembro de 1864), em DP II, 20-38
²⁸ Pio IX cita explicitamente a encíclica Qui Pluribus (9 de novembro de 1864) e suas alocuções Singulari Quadam (9 de dezembro de 1854) e Maxima Quidem (9 de janeiro de 1862).
²⁹ Pio IX, Quanta cura 3, em DP II, 7.
³⁰ Pio IX, Quanta cura 3, em DP II, 7.
³¹ Pio IX, Quanta cura 3, em DP II, 8.
³² Pio IX, Quanta cura 3, em DP II, 8.
³³ DH 2 b e 3 d.
³⁴ Pio IX, Quanta cura 3, em DP II, 8.
³⁵ Cf. Fr. Basile (Rémi) Valuet, O.S.B., La liberté religieuse et la tradition catholique, I, 362.
³⁶ Ib., 363-366.
³⁷ Pio IX, Quanta cura 4, em DP II,-9.
³⁸ Cf. Fr. Basile (Rémi) Valuet, O.S.B., La liberte religieuse et la tradition catholique, I, 367.
³⁹ Pio IX, Syllabus 3, em DP II, 21.
⁴⁰ Inmortale Dei 16-17, em DP II, 209-210.
⁴¹ Inmortale Dei 10, em DP II, 204-205.
⁴² Inmortale Dei 15,. em DP II, 207-208.
⁴³ Inmortale Dei, em DP II, 207-208, párr. 15.
⁴⁴ Inmortale Dei, em DP II, 209-210, párr. 16.
⁴⁵ Inmortale Dei, em DP II, 210, párr. 17.
⁴⁶ Inmortale Dei 18, em DP II, 211.
⁴⁷ Inmortale Dei 19, em DP II, 211.
⁴⁸ Inmortale Dei 19, em DP II, 212.
⁴⁹ Inmortale Dei 23, em DP II, 211.
⁵⁰ Leão XIII, Encíclica Libertas praestantissimum (20 de junho de 1888), em DP II, 225-260.
⁵¹ Libertas praestantissimum 21-22, em DP II, 243-244.
⁵² Libertas praestantissimum 21-22, em DP II, 251-252.
⁵³ Libertas praestantissimum 30, em DP II, 258.
⁵⁴ Libertas praestantissimum 21-22, em DP II, 251-252.
⁵⁵ Leão XIII, “Litterae encyclicae Rerum novarum de conditione opificum”, em DP I, 281-282.
⁵⁶ Rerum novarum, 32, em DP I, 284-286.
⁵⁷ Rerum novarum, 30, em DP I, 282.
⁵⁸ Rerum novarum, 6, em DP I, 256.
⁵⁹ Rerum novarum, 23-30, 35, em DP I, 275-282, 290.
⁶⁰ Cf. Pietro Pavan, Libertá religiosa e pubblici poteri, 316-326.
⁶¹ Pio XI, Divini Redemptoris, 29, em DP II, 687.
⁶² Pio XI, Divini Redemptoris, 30, em DP II, 687-688.
⁶³ Pio XI, Divini Redemptoris, 32, em DP II, 689.
⁶⁴ Pio XI, Non abbiamo bisogno 50 [29 de junho de 1931], em DP II, 594.
⁶⁵ Pio XI, Non abbiamo bisogno, 49, em DP II, 594.
⁶⁶ Pio XI, Divini Redemptoris, 27, em DP II, 686.
⁶⁷ Firmissimam constantiam 33, em DP II, 33.
⁶⁸ Pio XI, Mit brennender Sorge 8, em DP II, parr. 36, 659.
⁶⁹ Cf. Pietro Pavan, Libertà religiosa e pubblici poteri, 322-324.
⁷⁰ Pio XII, Radiomensagem Nell’alba e nella luce (24 de dezembro de 1941), em DP II, 832, párr. 17.
⁷¹ Pio XII, Radiomensagem Com sempre nuova freschezza (24 de dezembro de 1942), em DP II, 845, párr. 16.
⁷² Pio XII, Radiomensagem Natal Benignitas et humanitas (24 de dezembro de 1944), párr. 20, em DP II, 877.
⁷³ Pio XII, Radiomensagem Com sempre nuova freschezza, em DP II, 850, párr. 35.
⁷⁴ Pio XII, Radiomensagem Benignitas et humanitas, párr. 7, em DP II, 874.
⁷⁵ Pio XII, Radiomensagem Benignitas et humanitas, párr. 11, em DP II, 874.
⁷⁶ Pio XII, Radiomensagem Benignitas et humanitas, párr. 11, em DP II, 874-875.
⁷⁷ Cf. John Courtney Murray, “Vers une intelligence du développement de la doctrine de l’Église sur la liberté religieuse”, em Hamer-Congar, pp. 141-144, cf. nota 329.
⁷⁸ Pio XII, Radiomensagem Con sempre nuova freschezza, párr. 48, em DP II, 852.
⁷⁹ Pio XII, Radiomensagem La solennità della Pentecoste no 50ª aniversário da carta encíclica “Rerum novarum” de Leão XIII, em DP 870, párr. 15.
⁸⁰ Pio XII, Discurso Ci riesce al V Congresso Nacional da União de Juristas Católicos Italianos (6 de dezembro de 1953), em DP II, 1006-1016.
⁸¹ Pio XII, Ci riesce 11, em DP II, 1011.
⁸² Pio XII, Ci riesce 16, em DP II, 1012-1013. Cf. John Courtney Murray, “Vers une intelligence du développement de la doctrine de l’Église sur la liberté religieuse”, em Hamer-Congar, 143.
⁸³ Pio XII, Ci riesce 17, em DP II, 1013.
⁸⁴ João XXIII, Pacem in terris, párr. 103-105.
⁸⁵ João XXIII, Pacem in terris, párr. 14.
⁸⁶ Cf. Carlos Corral Salvador, “Declaración sobre la libertad religiosa. Introducción”, em Concílio Vaticano II. Constituições. Decretos. Declarações, BAC, Madrid, 2000, 981-987; Ph.-I. André-Vincent, La liberte religieuse, droit fondamental, Tequi, Paris, 1976; G. de Broglie, Le Droit naturel à la liberte religieuse, Beauchesne, Paris, 1964; R. Coste, Théologie de la liberte religieuse, Doculot, Gembloux, 1969; J. Hamer-Y. M. Congar (ed.), Vatican II. La liberté religieuse, Unam Sanctam 60, Cerf. Paris, 1967; Pietro Pavan, La libertà religiosa. Dichiarazione: “Dignitatis humanae”, Queriniana, Brescia, 1967; John Courtney Murray, “La déclaration sur la liberte religieuse”, Nouvelle revue théologique 88 (1966) 41-67; Íd. (ed.), Religious Liberty. An End and a Beginning, MacMillan, Nueva Yotk, 1966. Sobre a contribuição deste autor ao Vaticano II, cf. Dominique Gonnet, La liberte religieuse á Vatican II. La contribution de Jhon Courtney Murray, Cerf, Paris, 1944; Bernard Lucien, Gregoire XVI, Pie IX et Vatican II, 233-299; Fr. Basile (Rémi) Valuet, O.S.B., La liberté religieuse et la tradition catholique, t. I, 433-744.
⁸⁷ Cf. P. Pavan, “Le droit à la liberte religieuse em sés éléments essentiels”, em Hamer-Congar, 149-203.
⁸⁸ DH 2, c.
⁸⁹ DH 4, a.
⁹⁰ DH 5.
⁹¹ Cf. Pietro Pavan, La liberta religiosa. Dichiarazione: “Dignitatis humanae”, Queriniana, Brescia, 1967, 130-131.
⁹² DH 2, a in fine.
⁹³ P. Pavan, “Le droit à la liberte religieuse em sés éléments essentiels”, em Hamer-Congar, 152-153.
⁹⁴ DH 2 b.
⁹⁵ DH 4.
⁹⁶ DH 3.
⁹⁷ DH 7 c.
⁹⁸ DH 2 b.
⁹⁹ DH 2 b.
¹⁰⁰ DH 3.
¹⁰¹ Paulo VI, Evangelli nuntiandi, 37.
¹⁰² Paulo VI, “Discurso al Sacro Colegio y a la Prelatura Romana”, em Insegnamenti de Paulo VI 14 (1976) 1088-1089.
¹⁰³ Cf. Antonio Morabito, Giovanni Paolo II, defensor hominis. Il Papa della liberta religiosa, Gangemi, Roma, 1994.
¹⁰⁴ Redemptor hominis 17 b.
¹⁰⁵ Redemptor hominis 17 h.
¹⁰⁶ Redemptor hominis 17 i.
¹⁰⁷ Centesimus annus 47 a.
¹⁰⁸ N. 2109.
¹⁰⁹ João Paulo II, Veritatis splendor 33, nota 58.
¹¹⁰ Una nota doctrinal sobre algunas cuestiones relativas al compromiso y la conducta de los católicos em la vida políica, Edice, Madrid, 2003, n. 8.
Fonte: Communio – Revista Internacional Católica 2004
PARA CITAR
ABEJÓN, Gerardo del Pozo. Gênese e desenvolvimento da doutrina da Igreja sobre a liberdade religiosa a partir da Revolução Francesa – Disponível em: < http://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/concilio-vaticano-ii/liberdade-religiosa/653-genese-e-desenvolvimento-da-doutrina-da-igreja-sobre-a-liberdade-religiosa-a-partir-da-revolucao-francesa >. Desde: 03/06/2014. Tradução: Nelson M. Sarmento.