7. Discute-se entre os Doutores por que razão e como é que sucedeu que os Apóstolos, ao falarem, fossem entendidos por todos. Com efeito, de dois modos pôde esse dom ser-lhes concedido: um modo, da parte dos ouvintes; outro modo, da parte dos falantes. De facto, por um lado, os Apóstolos, ao pregarem, com apenas uma pronúncia de palavras e um só idioma, foram entendidos ao mesmo tempo por todos os homens presentes que falavam diversas línguas; por outro lado, foram infundidas nos Apóstolos as especificidades e o conhecimento das diversas línguas, e foi-lhes dada a capacidade de falar a todos eles, não ao mesmo tempo e com a forma da mesma voz, mas sucessivamente e conforme as ocasiões. São Tomás examina este assunto na 2.2. questão 176, artº 1, onde ensina que foi necessário que o dom das línguas fosse dado aos Apóstolos, sendo eles enviados a ensinar os outros, pois eram pobres e ser-lhes-ia difícil encontrar alguém que traduzisse fielmente aos outros as suas palavras e lhes explicasse a eles as palavras dos outros. Além disso, tendo sido replicado a São Tomás que Deus podia fazer com que os Apóstolos, falando uma única língua, fossem entendidos por todos e que assim eles não teriam possuído a habilidade de falar todas as línguas, responde assim: Resposta à segunda: Bem podiam acontecer ambas as coisas: serem os apóstolos, falando uma só língua, entendidos por todos; ou falarem as línguas de todos. Contudo era mais conveniente falarem eles as línguas de todos; porque a perfeição da ciência deles exigia não somente o falarem, mas ainda o poderem entender a fala dos outros. Mas se todos entendessem a língua única, que os discípulos falassem, sê–lo–ia pela ciência dos que lhes entendessem a fala, ou uma como que ilusão, pela qual as palavras dos discípulos chegassem aos ouvintes em sentido diferente daquele com que foram proferidas.
8. Vem em favor da explicação de São Tomás aquela passagem de Paulo em 1Cor, 14, 18: Dou graças a Deus, porque falo a língua de todos vós. Comprova-o também a razão pelo mesmo apresentada, de que este dom foi necessário, não só para que os ouvintes entendessem os Apóstolos que falavam, mas também para que os Apóstolos entendessem os outros infiéis que lhes dirigiam a palavra, pudessem responder às suas perguntas e resolver as dificuldades apresentadas. À opinião deste santo Doutor aderem claramente Suarez, Tom.1 de Gratia, prolegom. 3, cap. 5, do número 47 ao 55; Escaco, de not. et sign sanctit. sect. 8, cap.6; Vigner, loco supra cit. cap. 9, vers. 8; os Salamanticenses, in cursu Theol. tom. 3, in arbore praedicamentali § 17, nº 168 e ss; Thyreus, de apparitione vocali, lib. 2, cap. 14; e todos afirmam que podia ter sucedido, e talvez até tenha sucedido, que os Apóstolos, de acordo com as várias circunstâncias, falando por vezes um único idioma, eram entendidos por todos os ouvintes, embora estes tivessem várias línguas. Segue-os Matêucio, in pract. Theologo-Canon. ad causas Beatificat. et Canoniz. tit. 3, cap. 3, artº 2 § 5, do nº 55 ao 62. Sílvio diz de maneira ótima, in 2.2. D. Thomas, qu. 176. artº 1: Não se deve negar que por vezes sucedeu que, falando um só uma única língua, ele fosse entendido pelos ouvintes de diversas e estranhas línguas, tal como aconteceu, quando Pedro, tomando a palavra, discursou para a multidão onde várias línguas estavam misturadas… Mas dizemos não só que isto foi concedido aos Apóstolos e aos Santos que foram como eles, mas também consideramos que se deve afirmar que eles falavam várias línguas, conforme eram aqueles a quem era necessária dirigir a palavra.
9. Cristo Senhor teve, sem dúvida, conhecimento perfeitíssimo de todas as línguas, mas não precisou de as falar a todas, por ter de pregar somente a um povo, ou seja, aos judeus. Assim o advertiu São Tomás, no lugar citado, ad tertium, e Tomás Bózio ponderou-o atentamente, de signis Ecclesiae lib. 6, sign. 22, cap. 5, nº 1. Sílvio, no lugar citado, faz um comentário a São Tomás, dizendo que é muito verossímil que Cristo Senhor não tenha utilizado nenhuma outra língua publicamente e diante do povo, para além da que era familiar ao povo judeu, tendo o Senhor vindo pessoalmente a pregar só a eles. Mas privadamente, requerendo-o a ocasião, utilizou várias línguas, quando falava aos gentios no Egipto e quando falava a uma multidão formada por diversos povos, tal como está em Jo 12; ou quando falava ao Tribuno e à coorte dos soldados romanos que estavam reunidos com os Príncipes dos Sacerdotes, os magistrados do Templo e os Anciãos, tal como está em Jo 18 e em Lc 22. Embora aqui usasse uma única língua, certamente o Sírio, que nessa altura era familiar aos Hebreus, foi entendido por todos os presentes, ainda que nem todos dominassem a língua síria na perfeição. Mas não foi só aos Apóstolos, também à maior parte dos outros foi dado o Dom dos vários géneros de línguas para proveito e edificação dos fiéis. Há exemplos coligidos por Bagatta, in oper. de admirandis orbis Christiani, tom. 2, pag. 153. Nós, porém, apresentaremos aqui alguns exemplos, a partir dos quais se poderá reconhecer que Deus concedeu este dom, de que estamos a tratar, aos seus servos, tanto no primeiro modo, como no segundo modo. Na vida de São Sófio ou Cadoco, Bispo de Benevento e Mártir, editada por Bolando, para o dia 24 de janeiro, tom. 2, cap. 1, pag. 604, lê-se assim: Chegando, por fim, Cadoco a Jerusalém, visitou os lugares santos e o Senhor concedeu-lhe falar os idiomas dos povos por entre os quais Ele tinha passado, e Cadoco começou a falar em várias línguas. Na vida de São Teliau, Bispo de Llandaff, na edição do mesmo Bolando, para o dia 9 de Fevereiro, cap 2, nº 8, pag. 309, tom.2, estão estas palavras: Vendo que o amor da palavra de Deus se incendiava nos seus corações, não tendo ele nenhuma competência na língua deles, a preocupação e a angústia o invadiam de modo admirável. Todavia, para satisfazer o povo suplicante e as preces deles, começou a explicar as Sagradas Escrituras, e cada um dos que estavam diante dele ouviu-o a falar a sua própria língua. O mesmo dom foi concedido aos seus companheiros, isto é, aos Santos David e Paterno, como o atesta o mesmo autor, no lugar citado: Levantaram-se, pois, David e Paterno e pregaram ao povo, e todos os entendiam perfeitamente na sua própria língua. Na Paixão dos vinte Santos Mártires de Laura de São Sabas, na edição de Bolando, para o dia 20 de Março, cap. 7, nº 73, pag. 177, contase como um deles, desejoso de aprender a língua grega, para se dedicar à leitura das Escrituras, não conseguia aprendê-la de modo nenhum: Na verdade, deixando-se vencer pelo sono, foi visitado por um dos santos Padres, o Protodiácono Anastácio, de quem acima fizemos menção, tendo ele sido íntimo deste Padre, que lhe perguntou a causa da sua tristeza. Ele expôs-lhe então a sua dificuldade em aprender e o Santo, sorrindo, disselhe: “Abre a tua boca e mostra-me a tua língua”. Tendo-o em seu poder, tomou um pano novo e, esfregando-lhe a língua e limpando-a, depois de retirada uma substância gordurosa e uma viscosidade lodosa, desapareceu. Então o presbítero, que dormia, acordou. Porém, constatou que, a partir daquele dia, sentiu uma tão grande facilidade em entender o dialeto, e uma tão expedita eloquência, quer na leitura, quer na aprendizagem da língua submissa à sua vontade, que ele próprio se admirava e se espantava com o cuidado que Deus tinha para consigo e com a graça dos Santos. Nos paralipómenos às vidas de São Pacómio e São Teodoro, para o dia 14 de maio, segundo o citado Bolando, cap. 3, refere-se que São Pacómio, querendo corrigir um certo homem romano, que fazia uso do latim e do grego, idiomas esses que ele ignorava, dominando apenas a língua egípcia, dirigiu preces a Deus, durante três horas, para que pudesse auxiliar aquele irmão, e foi enviada do céu uma folha de papel escrita, que ele, logo que a leu, ficou a saber imediatamente as línguas de todos os povos. A seguir, tendo-se aproximado do irmão, o autor acrescenta que ele empregou sem nenhum erro tanto a língua romana, como a língua grega, diante do espanto desse irmão. Santo António dá este testemunho acerca de São Vicente Ferrer, na 3 part. Sum. histor. tit. 23, cap. 8 § 4: Era uma coisa estupenda e dotada de Graça Apostólica o facto de ele pregar no idioma vulgar da Catalunha e ser também entendido pelos outros povos que o ignoravam. Concorda com isto Henrique Espondano, in continuat. annal. Card. Baronii ad an. 1403, num. 7: Enfim, tem sido concedido a todos os pregadores do Evangelho, desde os tempos Apostólicos, que, falando-se na língua pátria e vulgar da Catalunha, o discurso seja entendido pelo povos estrangeiros que a ignoram, e seja ouvido não só pelos que são vizinhos da região, mas também pelos de regiões afastadíssimas, pelo doutos e pelos indoutos, pelos nobres e pelos plebeus. E por mais que se discurse prolixamente, ninguém é afetado pelo tédio. No relatório da causa do São Francisco Xavier, assim falaram os Auditores da Rota, no capítulo acerca do dom das línguas, etc.: Xavier distinguiu-se no dom das línguas, pois falava elegante e expeditamente as línguas dos diversos povos, que ele não tinha aprendido, quando recorria a elas por causa do Evangelho, como se ali tivesse nascido e ali fosse criado. E não raramente acontecia que qualquer um o ouvia a discursar para homens de diversas nações falando na sua língua. Tomás Bózio refere a mesma coisa acerca de São Luís Beltran, no lugar citado nº 3. Entre as epístolas de São Francisco Xavier (publicadas por Horácio Turselino despois da vida deste santo), a Epístola 5, lib. 3, pag. 105, fala a mesma coisa acerca de si próprio: Fez Deus com que, quanto antes, aprendêssemos o japonês, para a explicação das coisas divinas. Por fim, havemos de alcançar algum resultado na ação cristã. Com efeito, agora vivemos entre eles como se fôssemos estátuas mudas. Na verdade, eles dizem e pensam muitas coisas a nosso respeito, diante das quais nós obviamente emudecemos, ignaros como somos da sua fala. No momento presente voltamos à infância com a aprendizagem dos elementos desta língua. Tiago Picenino infere destas palavras que ele não foi dotado com o dom das línguas. Mas o Cardeal Gotto refuta-o energicamente, no tom. 1, de vera Ecclesia, cap. 2 § 4, nº 44, tendo podido o santo, num determinado momento, não dominar as línguas e, no momento seguinte, ser distinguido com o dom das línguas, como aconteceu com os Apóstolos, aos quais foi concedido o dom das línguas não imediatamente no início da sua vocação para o Apostolado, mas quando sobre eles desceu o Espírito Santo.
10. Não se deve duvidar que, com a permissão de Deus, o demónio pode fazer coisas semelhantes. Com efeito, ele pode, ao mover os instrumentos da voz, movê-los de tal maneira, que pronuncie a língua que quiser. E pode também formar a partir do ar diversas manifestações que nos ouvidos dos que ouvem representam palavras, que ele não pronuncia com a fala. Por isso, na vida de Santo Hilarião, São Jerónimo refere que um certo atrabiliário, que antes falava palavras siríacas, foi curado por esse santo, pondo em fuga o demónio. E tornou-se banal, entre os sinais da possessão demoníaca, que nenhum é mais evidente do que uma mulher, ou um camponês, ou um iletrado discutir sobre os mistérios teológicos, que ignorava antes da possessão, e conseguir falar em grego, ou hebraico, ou latim, em alemão ou em outra qualquer língua exótica, como nota Gaspar dos Reis, in Elysio iucundar. quaest. campo quaest. 27, art. 4. Por conseguinte, se ocorrer uma discussão acerca desta Graça dada de graça, que é o dom dos vários géneros de línguas, na Congregação dos Ritos Sagrados, por ocasião do estudo da causa de algum servo de Deus, de cuja beatificação ou canonização se trate, e os Postuladores afirmem que ele foi dotado do dom das línguas, isto é, que ele dominou por influência divina muitas línguas, será necessário que demonstrem, com o testemunho de homens honestos, que ele nunca se esforçou por aprender as línguas de que se trata, e que não foi com o tempo que ele se tornou perito nelas, utilizando-as de forma expedita, quando se proporcionava a ocasião, como alerta Matêncio, in pract. Theologo-Canon. ad causas Beatificat. et Canonizat. tit. 3, cap. 3, art. 2 § 5, num. 68. Os auditores da Rota seguem isto, no citado relatório da causa de São Francisco Xavier, tit. de dono linguarum. Porém, se os Postuladores afirmarem que o servo de Deus falava uma única língua e que foi ouvido por muitas pessoas de diversas línguas a falar a língua deles, como se fosse própria, é necessário que se apresentem testemunhas que assegurem que o ouviram a falar no seu próprio idioma, por exemplo, latim, italiano, etc., e se apresentem mais outras testemunhas de diversas nações a atestar que o ouviram também a falar as suas línguas, como por exemplo, alemães, a língua alemã; espanhóis, a língua hispânica, franceses, a língua francesa, ingleses, a língua inglesa, etc. Além disso, é necessário que todos concordem no facto de que o servo de Deus falou isso, segundo o que está determinado para os Auditores da Rota, no lugar citado. Além disto, deve advertir-se se no uso destas línguas se introduziu alguma vaidade, por exemplo, se isso aconteceu para granjear o aplauso dos povos ou dos príncipes, ou para arrecadar dinheiro, ou honras, ou se ele falou banalidades. Com efeito, estas coisas demonstrariam que o uso das várias línguas não procedeu de Deus. Pelo contrário, se ele falou das grandezas de Deus, se usou as línguas para converter os pecadores e os infiéis, esses serão sinais certíssimos de que ele foi agraciado por Deus com o dom das línguas, e este requisito se terá em muitíssima consideração nas causas de beatificação e canonização, depois estabelecidas principalmente as provas das virtudes em grau heroico, como advertiu Matta, de Canoniz. SS. part. 3, cap. 4, nº 18 e 19; e Matêucio, loc. cit., nº 68. Escaco, de Notis et sign. sanctit. sect. 8, cap.6, pag. 649.
11. A última Graça dada de graça, de que fala o Apóstolo, é a tradução dos discursos, que pode explicar-se de dois modos. Um deles é que a tradução de um discurso se refere ao significado das palavras; o outro é a busca do entendimento dos sentidos e mistérios nas palavras que ali constam. No primeiro modo, traduzir um discurso é transpor as palavras de um idioma para as palavras de outro idioma, coisa que pode fazer-se por escrito ou oralmente. No segundo modo, traduzir um discurso não é transpor as palavras de um idioma para as palavras de outro, mas ensinar os mistérios que se escondem nas palavras e que muitas vezes não são entendidos por aqueles que conhecem o significado das palavras. É isto que ensina Suarez, tom.1 de Gratia, prolegom. 3, cap. 5, nº 55 e ss. Ao primeiro modo deve atribuir-se a versão da Sagrada Escritura traduzida por Setenta homens que, sob a orientação de Ptolomeu de Filadélfia, segundo a comum opinião, compuseram a sua tradução, não a partir de charcos turvos de ribeiros, ou dos vulgares e populares livros caldaicos, siríacos e códices samaritanos, mas a partir das puras fontes hebraicas, tal como com sólidos argumentos o comprovou João Moriano contra o Rabino Azario; quer eles tenham feito esta versão separadamente, cada um fechado nas suas celas, como afirmaram Justino, Ireneu e Cirilo de Jerusalém; quer a tivessem feito reunidos num lugar público, ou numa grande basílica, afastada de todo o tumulto e ruído, como mais provavelmente pensa São Jerónimo. Ao segundo modo dizem respeito os textos que existem dos tradutores dos Santos Apóstolos. Na verdade, Pedro utilizou Marcos como tradutor, e Paulo teve como tradutor Tito, de quem na 2Cor 2, 12 diz: Quando cheguei a Tróade, para pregar o Evangelho de Cristo, e apesar de lá me estar aberta uma porta no Senhor, não tive sossego no meu espírito, porque não encontrei Tito. Na realidade, estes tradutores prestavam os seus serviços aos Apóstolos, como o fazia Tito a Paulo, quer quando se via que eles desejavam o serviço dos tradutores, no momento em que falavam a algum povo, por exemplo aos romanos, estando outros no meio do auditório que ignoravam totalmente o latim; quer quando os mesmos Apóstolos falavam coisas difíceis de entender, visto que nessa ocasião era missão dos tradutores explicá-las. Foi esta a conclusão a que chegou o Cardeal Barónio, depois de longa discussão, in annal. ad an. 45, nº 37.
12. Com o Cardeal Baronio concorda Suarez, loc. cit., nº 61 e ss. Mas Estio, in comment. ad cap.2 epist. 2 ad Corinth., considera que não pode aceitar-se como o múnus de tradutor tivesse sido exercido por Tito, seja de qual dos dois referidos modos for, e como Paulo tivesse podido ficar afetado por uma grande tristeza, ao não encontrar Tito em Tróade, e assim a ação dele não podia utilizar o modo explicado. Com efeito, diz que nessa altura Paulo pregou nas regiões da Ásia, da Acaia e da Macedónia, nas quais se falava a língua grega. Da mesma forma, Paulo alcançou, por um milagre divino, o conhecimento das línguas e falava com igual facilidade o latim, o grego e o hebreu, e, sendo assim, é improvável que ele, por causa da ausência de tradutor, que ele provavelmente nem precisava, ficasse com o espírito de tal modo perturbado, que, deixando Tróade, fosse para a Macedónia a procurar ali o seu tradutor. Este autor diz ainda que os Apóstolos, que pregavam à multidão, adaptavam o seu discurso às capacidades da maioria e que nessa altura reservavam os mistérios mais secretos, para os transmitirem aos mais capazes e mais adiantados na fé. Por essa razão o mesmo Apóstolo, na 1Cor 2, 6, diz: Nós falamos da sabedoria entre os perfeitos; e em 3, 1, diz: Não pude falar-vos a simples homens espirituais, mas como a homens carnais. Como a criancinhas em Cristo foi leite que vos dei a beber e não alimento sólido, que ainda não podíeis suportar. Destas palavras o mesmo Estio deduz que Paulo não precisava de Tito para a explicação dos mistérios e das coisas obscuras. E conclui que o espírito de Paulo não teve sossego, quando não encontrou Tito, porque o tinha enviado a Corinto, para lhe mandar notícias a saber se os Coríntios já se tinham corrigido. Cornélio a Lápide concorda com isto, no seu comentário ao capítulo 2 da Segunda Epístola aos Coríntios, onde tem estas palavras: Houve também outra razão pela qual Paulo se dirigiu de Tróade à Macedónia ao encontro de Tito: porque desejava que Tito, a quem ele tinha enviado a Corinto, lhe desse a conhecer o estado dos Coríntios, antes de regressar a Corinto, como tinha prometido. Por isso, no capítulo 7, versículo 6 diz que ele na Macedónia foi consolado com a chegada de Tito, que lhe contou o pranto dos Coríntios e desejo que tinham de Paulo. Parece, porém, que Tito comunicou a Paulo que ainda não era tempo de voltar a Corinto. Por isso Paulo adiou a sua viagem a Corinto, e enviou-lhes antes esta epístola, que lhe abriria o caminho para chegar até eles e corrigiria os defeitos dos Coríntios. Ora isto que eu referi é suficiente, pois, no que diz respeito às causas da Beatificação e Canonização, parece-me que é muito difícil que se dê ocasião à discussão desta Graça da tradução dos discursos. Embora, na verdade, possa acontecer, e muitas vezes aconteceu, que os mistérios ocultos das Escrituras fossem explicados por algum servo de Deus, sem o contributo do empenho humano, todavia isso não terá nada a ver com a Graça da tradução dos discursos, mas com a ciência infusa, de que falamos acima.
Fonte: https://charlesasullivan.com/6199/pope-benedict-xiv-on-the-gift-of-tongues/ Tradução: Pe. Zé.