Sábado, Novembro 16, 2024

A predestinação e os Concílios

INTRODUÇÃO


Um dos meus comentários anteriores foi sobre o tema da predestinação, e compartilhei o ensino do Cardeal Charles Journet explicando sobre esta questão complexa. Agora que ele levantou o caminho direto para entender a doutrina da predestinação, quero compartilhar o que o Magistério da Igreja definiu a este respeito.

UM POUCO DE HISTÓRIA


Entre os conflitos e heresias que Santo Agostinho teve que combater estava o pelagianismo, que não só negou a doutrina do pecado original, mas a necessidade da graça para a salvação. Na batalha campal que o santo se envolvia com os pelagianos, se encontra a dificuldade para equilibrar a relação entre a graça e o livre-arbítrio, e em algumas de suas obras, a doutrina da predestinação parece introduzir o conceito de dupla predestinação: Onde Deus salva pela graça aos eleitos, e deixa o resto em seu pecado. Por exemplo na obra Da predestinação dos santos escreve:

Todas as veredas do Senhor são graça e fidelidade (Sl 24,10). Pois são impenetráveis seus caminhos (Rm 11,33). Por conseguinte, são impenetráveis a misericórdia pela qual liberta gratuitamente e a verdade pela qual julga com justiça.(Santo Agostinho – Da Predestinação dos Santos VI, 11)

Santo Agostinho é acusado pelos pelagianos negar o livre arbítrio, o que Agostinho defende repetidamente. Em sua resposta a Juliano escreve:

Afirmas que em outro de meus livros eu disse: ‘Nega-se o livre-arbítrio se se defende a graça e nega-se a graça se se defende o livre-arbítrio’. Pura calúnia! Eu não disse isso. O que eu disse foi que essa questão apresenta enormes dificuldades que poderia parecer que se nega uma quando se admite a outra. E como minhas palavras são poucas, irei repeti-las para que meus leitores vejam como distorces os meus escritos e com que má-fé abusas da ignorância dos retardados e privados de inteligência, para fazer-lhes crer que me respondeste porque não sabes calar-te. Eu disse no final do primeiro livro, dedicado ao virtuoso Piniano, cujo título é ‘De gratia contra Pelagium’: ‘Nesta questão que trata do livre-arbítrio, parece se negar a graça de Deus; e quando se defende a graça de Deus, parece se destruir o livre-arbítrio’. Porém, tu, homem honesto, verás que suprimes as palavras que eu disse e colocas outras de tua invenção. Disse sim que esta questão era difícil de se resolver, não que era impossível. E muito menos afirmei, como falsamente me acusas, que ‘se se defende a graça, nega-se o livre-arbítrio; se se defende o livre-arbítrio, nega-se a graça de Deus’. Citai minhas palavras textuais e evaporam-se as tuas calúnias.(Resposta a Juliano 4,47).

Também se defende quando lhe acusam de chamar de pelagiano todos que reconhecem o livre-arbítrio:

Não é certo, como dizes, ‘que chamamos pelagianos ou celestianos a todo aquele que reconhece no homem o livre-arbítrio e afirma que Deus é o Criador das crianças’, mas que damos este nome aos que não atribuem à liberdade, à qual fomos chamados, a graça divina; e aos que recusam reconhecer Cristo como Salvador das crianças; aos que não admitem nos justos a necessidade de dirigir a Deus petição alguma da oração do Senhor. A estes sim, os chamamos de pelagianos e celestianos, porque participam de seus erros criminosos. (Resposta a Juliano 3,2).

Assim, ele rejeita a ideia da não necessidade da graça. É a graça para Agostinho, que lhe dá o poder de livre vontade para fazer a vontade de Deus.

Dizes que ‘louvo a continência dos tempos cristãos não para suscitar nos homens o amor à virgindade, mas para condenar o matrimônio instituído por Deus’. Mas para que ninguém acredite, te atormenta a suspeita de uma má interpretação dos meus sentimentos – me dizes – como querendo aprovar: ‘Se com sinceridade exortas aos homens à virgindade, deves confessar que a virtude da castidade pode ser observada por aqueles que quiserem, de sorte que qualquer um pode ser santo em corpo e espírito’. Respondo que admito isso, mas não no teu sentido. Tu atribuis este poder apenas às forças do livre-arbítrio; eu o atribuo à vontade auxiliada pela graça de Deus. No entanto, pergunto: sobre o quê exerce o espírito seu poder para não pecar senão sobre um mal que, se vence, nos faz cair em pecado? E para não ter que dizer, com os maniqueus, que este mal provém de uma natureza má, estranha a nós e com a qual se mistura, resta-nos confessar que existe em nossa natureza uma ferida que é necessário curar e cuja mancha nos torna culpáveis se não for lavada pelo sacramento da regeneração (=batismo).(Resposta a Juliano 5,65).

PRONUNCIA-SE O MAGISTÉRIO


Apesar disso, os textos obscuros de Santo Agostinho mais tarde deram origem a um pensamento exagerado sobre ele. Um deles era um sacerdote chamado Lúcido, que teve de ser corrigido pelo Concílio de Arles em 475 d.C. Se conserva o memorial de sua sujeição:

Da graça e a Predestinação

Sua correção é salvação pública e seu julgamento remédio. Daí, também, eu tenho que, pelo santo remédio, retratar-me dos erros do passado acusando-os, e por saudável confissão purificar-me. Portanto, de acordo com os recentes decretos do venerável concílio, condeno juntamente com vós aquela sentença que disse que não se deve juntar a graça divina com a obra da obediência humana; que diz que após a queda do primeiro homem, foi completamente extinto o arbítrio da vontade; que diz que Cristo Senhor e Salvador não morreu para a salvação de todos; que diz que a presciência de Deus violentamente empurra o homem para a morte, ou que pela vontade de Deus perecem os que perecem; Que diz que depois de legitimamente recebido o batismo, morre em Adão qualquer um que peca; que diz que alguns estão destinados a morrer e outros predestinados a vida; que diz que ninguém desde Adão até Cristo, dentre os gentios são salvos com vista da vinda de Cristo pela graça de Deus, isto é, pela lei da natureza, e que perderam o livre-arbítrio no primeiro pai; que diz que os patriarcas e profetas e grandes santos, viviam no paraíso, mesmo antes do momento do resgate. Tudo isso condeno como mau e cheio de sacrilégio. De tal modo, no entanto, afirmo que à graça de Deus sempre é adicionado à graça do esforço e empenho do homem e proclamo que a liberdade da vontade humana não é extinta, mas atenuada e enfraquecida, que está em perigo aquele que está na graça, e aquele que está no pecado pode se salvar.

Também confesso que Cristo, nosso Deus e Salvador, no que diz respeito as riquezas da sua bondade, ofereceu por todos o preço de sua morte e não quer que ninguém pereça, Ele que é o Salvador de todos, especialmente dos fiéis, rico para com todos os que o invocam [Rom. 10, 12]… Agora, no entanto, pela autoridade dos testemunhos sagrados que copiosamente estão nas divinas Escrituras, pela doutrina dos antigos, como demonstrado pela razão, de boa vontade confesso que Cristo também veio pelos homens perdidos e que contra a sua vontade foram perdidos. Não é lícito, com efeito, limitar as riquezas da sua grande bondade e os benefícios divinos para somente aqueles que aparentemente foram salvos. Porque se dissermos que Cristo só trouxe remédios para aqueles que foram redimidos, parecerá que absolvemos os não redimidos, os que negam vão ser condenados por desacato a redenção. Afirmo também que foram salvos, segundo a razão e a ordem dos séculos, alguns pela lei da graça, outros pela lei de Moisés, outros pela lei da natureza, que Deus escreveu nos corações de todos em espera do advento de Cristo; No entanto, desde o início do mundo, eles não estavam livres do pecado original, senão pela intercessão do sagrado sangue. Eu também professo que o eterno fogo do inferno e as chamas estão preparadas para pecados capitais, porque segue corretamente o juízo divino para a culpa humana persistente; e sentencio aqueles que não acreditam nessas coisas de todo coração. Ore por mim, senhores santos e padres apostólicos.

Lúcido, presbítero, assinei de próprio punho esta minha carta, e o que nela é afirmado, afirmo, e o que é condenado, condeno.” (Concílio de Arles, 475 d.C. Do memorial da sujeição de Lúcido, presbítero. Retirado do Enchiridion Symbolorum)

Aqui foram estabelecidos então quatro pontos básicos da reta doutrina da predestinação:

1 – O livre arbítrio colabora com graça, mas o livre arbítrio, sem graça nada pode.
2 – Cristo morreu por todos os homens e não para um grupo seleto.
3 – O Livre-arbítrio é enfraquecido, mas não extinto.
4 – Os que são condenados não são condenados por vontade de Deus.

Mais tarde, no II Concílio de Orange contra os Semipelagianos é reafirmada a correta doutrina da predestinação.

Acreditamos também segundo a fé católica, depois de receber a graça por meio do batismo, todos os batizados podem e devem, com a ajuda e cooperação de Cristo desde que fielmente eles queiram trabalhar, cumprir o que pertence a saúde da alma. No entanto, sobre alguns serem predestinados pelo poder divino para o mal, não só não cremos, como também se houve qualquer um que se atreva a crer em tamanho erro, com toda detestação pronunciamos o anátema contra ele.

Também professamos e cremos saudavelmente em toda a boa obra, e então nós não começarmos, mas somos ajudados pela misericórdia de Deus, mas que Ele nos inspira primeiro – sem mérito algum precedente de nossa parte – a fé e ao amor a Ele, para que fielmente busquemos o sacramento do batismo, e para que após o batismo, com a sua ajuda, possamos realizar o que lhe agrada. Assim, a de se crer com todas as provas que esta maravilhosa fé do ladrão que o Senhor chamou a pátria do paraíso [Lucas. 23, 43], do centurião Cornélio, que foi enviado um anjo [lei. 10, 3] e de Zaqueu, que mereceu acolher o próprio Senhor [Lc. 19, 6], não vêm da natureza, mas era um dom de liberalidade divina”. (II Concilio De Orange, 529 Confirmado por Bonifacio II (contra los semipelagianos))

Papa Adriano I volta a corrigir os erros em uma carta aos bispos da Espanha:

Sobre o que alguns deles dizem que a predestinação para a vida ou a morte está no poder de Deus e não a nossa, eles retrucam: ‘Por que se esforçar para viver, se ele tudo está no poder de Deus?’; e o outro, por sua vez: ‘Por que orar a Deus para não sermos vencido pela tentação, se isso está em nosso poder, pela liberdade do arbítrio?’. Porque na realidade, não são capazes de dar ou receber, nenhuma razão, ignorando o julgamento de Fulgencio abençoado… [contra certo Pelagiano]:

‘Então, Deus preparou as obras de misericórdia e justiça na eternidade de sua incomutabilidade […] preparou, pois os méritos para os homens que haviam de ser justificados; também preparou prêmios para a glorificação dos mesmos; mas não preparou os ímpios para más vontades ou más ações, para eles, preparou justos e eternos tormentos. Esta é a predestinação eterna das futuras obras de Deus e como sabemos que fomos sempre incutidos pela doutrina apostólica, tão confiantemente a pregamos…” (Da Carta universalis Institutio, aos bispos da Espanha – 785 Retirado do Enchiridion Symbolorum)

Posteriormente o concilio de Quierzy novamente teve que se pronunciar contra os predestinacionistas (O que pregavam a dupla predestinação de céu e inferno)

Da redenção de da graça

Cap. 1 Deus onipotente criou o homem perfeito, sem pecado, com livre arbítrio e colocou no paraíso, e queria permanecer na santidade da justiça. O homem, fazendo mau uso do seu livre arbítrio, pecou e caiu, e tornou-se “massa de destruição” de toda a humanidade. Mas Deus, bom e justo, elegeu segundo sua presciência, da mesma massa de perdição, os que por sua graça predestinou à vida [Rom. 8, 29 ss; Ef. 1, 11] e predestinou para a vida eterna; outros, no entanto, que, por juízo de justiça deixou na massa da perdição, ele sabia pela sua presciência que tinham perecido, mas não os predestinou a perecer; mas, por ser justo, lhes predestinou um castigo eterno. E assim dizemos que existe apenas uma predestinação de Deus, que pertence ao dom da graça ou a retribuição da justiça.

Cap. 2 A Liberdade do arbítrio, perdemos no primeiro homem, e recuperamos por Cristo, nosso Senhor, e nós temos o livre arbítrio para o bem, prevenido e ajudado pela graça; e nós temos o livre arbítrio para o mal, abandonando a graça. Mas temos o livre arbítrio, porque foi lançado pela graça, e pela graça foi curado da corrupção.

Cap. 3 Deus Todo-Poderoso quer que todos os homens, sem exceção sejam salvos [1 Tm. 2, 4], embora nem todos sejam salvos. Agora, alguns são salvos, com o dom Dele que salvar; mas se alguns se perdem, é merecimento próprio.

Cap. 4 Como não há, houve ou haverá homem algum cuja natureza não foi assumida por ele; assim não há, houve ou haverá ninguém por quem não tenha padecido Jesus Cristo, nosso Senhor, embora nem todos sejam resgatados pelo mistério da sua paixão. No entanto, se nem todos são resgatados pelo mistério de sua paixão, não olha para a extensão e prolixidade de preço, mas para a parte dos infiéis que não creem que fé que atua pelo amor [Gal. 5, 6]; porque beber da bebida da saúde humana, que é composta de nossa fraqueza e da virtude divina, tem certamente em si mesma, virtude para aproveitar a todos, mas se não se beber, não cura.” (Concílio de Quiersy 853 (Contra Gottschalk e predestinacionistas) Retirado do Enchiridion Symbolorum)

Os cânones dois e três do IV concílio de Valence em 855 d.C, se mantêm na mesma linha:

Canôn 2 Fielmente mantemos que ‘Deus sabe de antemão e eternamente soube tanto os bens que os bons fariam como os males que os maus cometeriam’ porque temos a palavra da Escritura que diz: Deus eterno, que és conhecedor do oculto e sabe de tudo antes que aconteça [Dan. 13, 42]; e nos agrada manter que ‘sabia absolutamente de antemão que os bons seriam bons por sua graça e que pela mesma graça receberiam as recompensas eternas;e previu que os maus seriam maus por suas próprias maldades e teria que condená-los ao castigo eterno por sua justiça’, como de acordo com o salmista: Porque de Deus é o poder e do Senhor a misericórdia para dar a cada um segundo as suas obras [Ps. 61 12 s] e como a doutrina do Apóstolo ensina: a vida eterna aos que, com perseverança da boa obra, procuram a glória, a honra e a imortalidade; ira e indignação aos que são, no entanto, de espírito de discórdia e não aceitam a verdade, mas acreditam na iniqüidade; tribulação e angústia sobre toda a alma do homem que faz o mal [Rom. 2, 7 ss]. E, no mesmo sentido em outro lugar: No apocalipse fala-se de nosso Senhor Jesus tanto no céu com seus anjos de seu poder, quanto no fogo da chama que tomará a vingança contra os que não conhecem a Deus nem obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo, que sofrerão a punição eterna para a sua ruína[…] quando ele vier para ser glorificado nos seus santos e mostrar-se admirável em todos os que crêem [2 Tessalonicenses. 1, 7 ss]. Também não é para ser acreditado que a presciência de Deus impõe algum mau em absoluto e que não se poderia fazer otura coisa, mas que o homem faz por sua própria vontade o que Deus, que sabe de tudo antes que aconteça, previu pela majestade onipotente e imutável. ‘E não acho que alguém é condenado por juizo prévio, mas por mérito de sua própria iniqüidade’, ‘nem que os mesmos maus foram perdidos porque não poderiam ser bons, mas porque não queriam ser bons e por sua culpa permaneceu na massa de condenação do pecado original, ou mesmo pelo pecado atual.’.

Cânon 3. E também sobre a predestinação de Deus satrifeito e fielmente coloca, de acordo com a autoridade apostólica que diz: ‘Ou não tem o oleiro poder sobre o barro para fazer da mesma massa um vaso de uso nobre e outro de uso vulgar?’ [Rom. 9, 21], a passagem a qual logo acrescenta: ‘em ter Deus, para mostrar a sua ira e manifestar o seu poder, suportado com muita paciência os objetos de ira preparados para a perdição, mostrando as riquezas da sua glória para com os objetos de misericórdia, que de antemão preparou para a glória?’ [Rom. 9, 22 s]: Corajosamente, confessamos a predestinação dos eleitos para a vida, e predestinação dos ímpios para a morte; no entanto, na escolha daqueles que se salvarão, a misericórdia de Deus precede o grande mérito; na condenação, no entanto, dos que perecerão, o mau mérito precede o justo juízo de Deus. ‘Mas pela predestinação, Deus vestabeleceu o que Ele mesmo faria ou misericórdia gratuita ou julgamento justo’, diz a Escritura: Aquele que fez o que tinha que fazer [Is. 45, 11; LXX]; nos maus, no entanto, de antemão conheceu sua malícia, porque deles é, mas não predestinou, porque não vem de Deus. A pena que ao mal mérito, como Deus que tudo prevê, esse que sabia e predestinado, porque justo é aquele no qual, como diz Santo Agostinho, fixa está a sentença sobre todas as coisas, por sua presciência. Aqui cabe certamente o que disse o sábio: ‘As varas estão preparadas para os malfeitores e os golpes para o dorso dos insensatos.’ [Prov. 19, 29]. Sobre esta imobilidade da presciência da predestinação de Deus, pela qual no futuro, n’Ele já é um fato também se entende bem o que se diz em Eclesiastes: ‘Reconheci que tudo o que Deus fez subsistirá sempre, sem que se possa ajuntar nada, nem nada suprimir. Deus procede desta maneira para ser temido.’ [Eclesiastes. 3, 14]. Mas que alguns são predestinados para o mal pelo poder divino, isto é, como se eles não pudessem ser outra coisa, não só não acreditamos, mas se há alguns que acreditam em tamanho mal contra eles, como o Sínodo de Orange, dizemos anátema com toda a repulsa.”.

Apesar disso, o cânon 4 deste concílio se opôs ao Canône 3 do concílio de Quiersy:

Igualmente sobre a redenção através do sangue de Cristo, em razão do erro excessivo que tem surgido sobre este assunto, a tal ponto que alguns, como seus escritos indicam, definem que foi derramado por aqueles ímpios que desde o início do mundo até a paixão do Senhor, morreram em sua maldade e foram punidos com a condenação eterna.” (Cânon 4 – IV Concílio de Valence)

Mas vê esta expiação limitada do ponto de vista da presciência divina. Ou seja, Deus sabe desde a eternidade o que acontecerá. Assim, apesar do conflito entre estes dois concílios locais, a Igreja manteve-se estável a sua posição a favor da vontade salvífica universal de Deus, que deseja que todos os homens sejam salvos e que quem é condenado é por sua própria vontade e não por Deus. Deus prevê sua condenação, não a impõe, e, portanto, a predestinação deve ser entendida a partir da perspectiva de que “Deus tem isto para ele, mas Deus não quer isto”.

A PREDESTINAÇÃO NA “REFORMA” PROTESTANTE


Mais tarde, William de Ockham entendeu que a obra de Deus era inescrutável a tal ponto que pode condenar o bom e salvar o perverso, pensamento que teve bastante vigor dentro da “reforma”. Muito possivelmente, o seu pensamento influenciou os reformadores protestantes (especialmente Calvino e Zwinglio), a ponto que as heresias sobre a doutrina da predestinação não só foram ressuscitadas, mas amplificadas.

O concilio de Trento se pronunciou contra estas doutrinas:

Cap. 12 – Presunção temerária de ser predestinado

805. Ninguém, enquanto peregrina por esta vida mortal, deve querer penetrar tanto no mistério oculta da predestinação divina, que possa afirmar com segurança ser ele, sem dúvida alguma, do número de predestinados [cân. 15], como se o justo não pudesse mais pecar [cân. 23] ou, que se tiver pecado, poderá com certeza prometer-se a si mesmo uma nova conversão. Pois, sem uma revelação toda especial de Deus, não se pode saber quais os que Deus escolheu para si [cân. 16].” (Concílio de Trento Decreto Sobre a Justificação)

Foi só mais tarde que dentro das fileiras protestantes um teólogo chamado Jacó Armínio pregava que o livre-arbítrio humano pode existir sem limitar o poder de Deus ou contradizer a Bíblia, opondo-se as doutrinas calvinistas que enfatizavam a predestinação.

Arminio, que estudou em Genebra com o teólogo evangélico francês Teodoro Beza, retornou à sua Holanda natal e foi professor de Teologia (1603-1609) na Universidade de Leiden. Afirmava que a predestinação era bíblica e verdadeira, ou seja, Deus tinha a intenção de algumas pessoas para o céu e outras para o inferno, como indicado pela referência a Jesus “ovelhas e bodes”. Mas é focado mais no amor de Deus, do que em seu poder no momento da escolha, o processo pelo qual Deus escolheu os que são destinados para o paraíso.

Depois da morte de Armínio, um grupo de ministros que simpatizavam com suas opiniões desenvolveram uma teologia sistemática e racional com base em seus ensinamentos. Em sua declaração publicada em 1610, arminianos afirmam que a escolha foi condicionada pela fé, que a graça pode ser rejeitada, que a obra de Cristo foi feita para todas as pessoas, e era possível que os crentes pudessem cair da graça.

Em uma reunião em Dort ou Dordrecht (1618 -1619), os calvinistas prevaleceram sobre o grupo de arminianos e condenaram aqueles que não concordavam com sua teoria. Eles declararam que a obra de Cristo foi destinada apenas àqueles que foram escolhidos para a salvação, que as pessoas criam não poderiam perder a graça, e que a escolha de Deus não estava dependente de qualquer condição.

Os evangélicos armínianos foram então totalmente proibidos na Holanda pelo resto de protestantes calvinistas até 1630, e, desde então, sem reservas, até 1795, no entanto, a tradição arminiana permaneceu na Holanda até o final do século XX.

O teólogo britânico John Wesley estudou e confirmou o trabalho de Arminio em seu movimento metodista no século XVIII, na Inglaterra. Para as pessoas, o Arminianismo se resume na idéia de que não há predestinação e que as pessoas são livres para seguir ou rejeitar o evangelho.

Atualmente dentro do protestantismo existem diferentes nuances entre essas posições conflitantes, mas, em essência seguem amargas como no tempo de “reforma”, mas o Calvinismo tem perdido gradualmente a força que já teve dentro do protestantismo.

PARA CITAR


ARRAIZ, José Miguel. A predestinação e os Concílios. Disponível em: <http://apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/estudos-patristicos/729-a-predestinacao-e-os-concilios> Desde: 03/10/2014 Tradutor: Rafael Rodrigues.

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