Domingo, Dezembro 22, 2024

Santo Agostinho e o culto aos santos

Colimus ergo martyres eo cultu dilectionis et societatis, quo et in hac vita coluntur sancti homines Dei, quorum cor ad talem pro evangelica veritate passionem paratum esse sentimus. Sed illos tanto devotius, quanto securius post certamina superata: quanto etiam fidentiore laude praedicamus, iam in vita feliciore victores, quam in ista adhuc usque pugnantes.

Veneramos, então, aos mártires com o culto do amor e companhia, que nesta vida os homens santos de Deus também são tributados, cujo coração percebemos que está disposto a sofrer o martírio para a verdade do evangelho. Mas para aqueles com maior devoção, com maior segurança, depois de terem vencido a batalha, mais confiante é o louvor que damos aos vencedores que estão em uma vida mais feliz do que aqueles que ainda estão lutando nesta.” (Contra Fausto Maniqueista, Livro XX, 21)

 

INTRODUÇÃO


Qualquer um que tenha lido as obras de Santo Agostinho, como Cidade Deus, Doutrina Cristã, O Cuidado Devido aos mortos e sua apologia contra Fausto Maniqueista, citada anteriormente, sabe claramente sua posição e afirmações em relação ao culto aos mártires e santos como prática cristã amplamente difundida em sua época, inclusive, ele próprio diz que fazia isto. No entanto, tem surgido uma linha de “adivinhadores” do pensamento de Santo Agostinho, que sem nunca terem lido qualquer de suas obras, pegam trechos isolados, desconsiderando todo o contexto e atribuem a ele um posicionamento contra a veneração dos santos e suas relíquias, como se fosse possível determinar o pensamento de um autor com uma frase de sua infinidade de obras.

 
Assim, demonstraremos aqui em mais de uma dezena de obras dele, todo o seu pensamento a respeito dos santos e suas relíquias, de modo que não possa haver nenhum espaço para qualquer outra alegação, além de declarações falsas e abuso; por fim o leitor verá que debater sobre este pensamento de santo Agostinho é se sentir como alguém que está usando um bate estacas para matar uma pulga, ou provando a tabuada contando nos dedos de alguém. E, no entanto, é claro, ninguém será convencido se não deseja isso.

 

A DIFERENÇA ENTRE CULTO DE LATRIA E CULTO DE DÚLIA PARA AGOSTINHO


Santo Agostinho também lança a base teológica para os tipos de culto, que são distintos na doutrina católica:

 
Mas que o Espírito Santo não é uma criatura, é muito simples por aquela passagem acima de todos os outros, onde somos ordenados para não servir a criatura, mas ao Criador, não no sentido em que somos ordenados a “servir” um ao outro pelo amor, que é douleuein [dúlia] em grego, mas naquele em que só Deus é servido, que está latreuein [latria] em grego.De onde eles são chamados de idólatras, pois ofertam imagens o que é devido a Deus. Pois é este serviço sobre o qual é dito: “Tu adorarás o Senhor teu Deus, e só a ele darás servirás”. Pois isso também é encontrada mais claramente nas Escrituras Gregas, que têm latreuseis. Ora, se somos proibidos de servir a criatura com tal serviço, visto que está escrito, mais a criatura do que o Criador, então com certeza o Espírito Santo não é uma criatura, a quem esse serviço é dado por todos os santos; como diz o apóstolo: “Porque somos nós a circuncisão, que serve ao Espírito de Deus”, que está em grego latreuontes. Pois até mesmo os exemplares mais latinos o têm assim.(Sobre a Santíssima Trindade Livro I, 6, 13 ).
 
Há quem queira desvirtuar o pensamento de Santo Agostinho e dizer que aqui ele está falando apenas dos vivos e não dos falecidos, portanto para eles não haveria dulia para os falecidos (estes mesmos que dizem que dulia é a mesma coisa de latria) só para os vivos. Isto é refutado pelo próprio Agostinho, que diz que os piedosos falecidos não se separam da Igreja em momento algum, portanto, tanto em vida quanto em morte, não deixamos de ser irmãos:

As almas dos falecidos piedosos não estão separadas da Igreja que mesmo hoje é o reino de Cristo. Caso contrário, não haveria memória deles no altar de Deus na comunhão do Corpo de Cristo.” (A Cidade de Deus XX, 9, 2).

Em sua resposta a Fausto Maniqueista, que acusava os cristãos de idolatria e de transformarem os mártires em ídolos, ele mostra novamente que o culto cristão aos mártires e santos é de Dulia, e que difere do culto supremo a Deus, que é Latria, aqui ele demonstra na prática o que ensinou no livro sobre a Trindade mostrando acima. E diz que a noção errônea e rasa de que adoramos os mártires como ídolos é advinda de poesias pagãs. E mostra novamente como o culto cristão é o culto de amor aos santos e não idolatria, como pensam os “desavisados”.

Quanto à nossa honra que damos à memórias [relíquias] dos mártires, e a acusação de Fausto, que os adoramos, ao invés de ídolos, eu não deveria me importar em responder este tipo de acusação, se não fosse por uma questão de mostrar como Fausto, em seu desejo de lançar opróbrio sobre nós, ultrapassou as invenções maniqueístas, e caiu descuidadamente em uma noção popular que encontrou na poesia pagã, embora ele seja tão ansioso para se distinguir dos pagãos […]

O povo cristão celebra unidos em solenidade religiosa o memorial dos mártires, tanto para encorajar e ser imitado quanto para que possamos participar de seus méritos e serem auxiliados pelas suas orações. Mas é tal que os nossos altares estão definidos para qualquer dos mártires – mas apenas em sua memória -, mas ao próprio Deus, o Deus dos mártires[…]

Veneramos, então, aos mártires com o culto do amor e companhia, que nesta vida os homens santos de Deus também são tributados, cujo coração percebemos que está disposto a sofrer o martírio para a verdade do evangelho. Mas para aqueles com maior devoção, com maior segurança, depois de terem vencido a batalha, mais confiante é o louvor que damos aos vencedores que estão em uma vida mais feliz do que aqueles que ainda estão lutando nesta. O que é propriamente o culto divino, que os gregos chamam de latria, e para o qual não existe uma palavra em latim, tanto na doutrina, quanto na prática, damos somente a Deus.Pois este culto pertence a oferta de sacrifícios, como podemos ver na palavra idolatria, que significa que a doação deste culto aos ídolos. Assim nós nunca oferecemos ou exigimos que qualquer um ofereça, sacrificios a um mártir, para uma alma santa, ou a qualquer anjo. Qualquer um que cair neste erro é instruído pela doutrina, seja na forma de correção ou de cautela.” (Resposta a Faustus o maniqueísta –  Livro XX, 21)

Diante de tais afirmações de Santo Agostinho, quem em sã consciência seria capaz de afirmar que ele é contra o culto aos santos?

 

A ORAÇÃO AOS SANTOS E SUA INTERCESSÃO


Depois de demonstrarmos qual a diferença entre o culto de honra aos santos, do culto de Latria devido somente a Deus, agora passaremos a ler as passagens onde o próprio Agostinho mostra na prática o exercícios desta doutrina cristã durante seu tempo.

 
O primeiro caso é de um velho chamado Florêncio que habitava Hipona, que estando sem ter o que vestir, orou aos 20 mártires para que recebesse o que vestir, e suas orações foram atendidas como atesta o próprio Agostinho:

 “Havia um velho chamado Florêncio, nosso filho de Hipona, homem piedoso e pobre. Vivia da sua arte de alfaiate. Tinha perdido seu casaco, mas não tinha com que comprar outro. Ele orou aos 20 mártires, tão celebrados entre nós, e pediu-lhes em alta voz com o que se vestir. Uns adolescentes brincalhões que, por acaso, ali estavam, ouviram-no e quando ele saiu, seguiram-no, caçoando dele como se ele tivesse pedido aos mártires cinquenta óbolos (folles) para que comprasse a peça de vestuário. Mas ele, em silêncio ia caminhando, viu um enorme peixe encalhado a praia ainda a agitar-se e, com o auxílio daqueles, que então o ajudaram, apanhou-o e vendeu-o a um certo cozinheiro chamado Catoso, bom cristão, a quem contou tudo o que aconteceu, por trezentas moedas, para os condimentos da sua cozinha- disposto a comprar assim a lã para que sua mulher lhe fizesse, caso fosse capaz, o que se vestisse. Mas o cozinheiro, ao abrir o peixe, encontrou no ventre um anel de ouro e imediatamente, tomado de compaixão e possuído de religioso temor, entregou-o ao homem, dizendo: Veja como os vinte mártires te vestiram.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

O segundo caso de Basso, um sírio, que vendo sua filha doente foi orar sobre as relíquias de Santo Estevão e sua filha foi curada:

Em Hipona um certo Basso, sírio, orava sobre as relíquias do mesmo mártir [Estevão] por uma filha que se encontrava gravemente doente. Tinha trazido para lá um vestido dela. Nisto saem de casa uns servos para lhe anunciarem a morte da doente. Mas como ele estava a rezar, uns amigos detiveram-nos e impediram-nos de lhe falarem para não chorasse perante o público. Quando voltou a casa onde já ressoavam as lamentações dos seus, pôs sobre ela o vestido que trazia da filha -e ela voltou à vida.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Em sua Homilia 845 sobre o Evangelho de João, também mostra que os mártires oram por nós do céu:

À mesa do Senhor nós não comemoramos os mártires da mesma forma que fazemos outros que descansam em paz, a fim de orar por eles, mas sim pois eles podem orar por nós para que possamos seguir os seus passos.” (Homilias sobre João 84)

Em seu sermão 313 na solenidade da Festa de São Cipriano, mostra como os Cristãos louvando a são Cipriano estão automaticamente louvando o próprio Deus, já que o mártir é mártir de Deus:

A santa solenidade do bem-aventurado mártir, que nos reuniu em nome do Senhor, exige que se diga algo sobre os méritos e glória de tão grande mártir, mas nada pode ser dito dignamente. Talvez teria bastado a língua humana para elogiar suas virtudes e sua glória, caso ele tivesse querido engrandecer-se. No entanto, louvai-o mais com devoção do que com eloquência; melhor, louvado seja o Senhor nele: o Senhor nele, e ele no Senhor. (…) Com efeito, não levantamos um altar a Cipriano, como a um deus, mas temos feito de Cipriano um altar para o verdadeiro Deus.(…)” – (Sermão 313A – Festa de São Cipriano)

Também na festa dedicada aos mártires Macabeus, nos conta de uma Igreja feita em Antioquia que foi dedicada aos mártires do livro de Macabeus, matando assim  vários coelhos com uma cajadada só, mostrando tanto a intercessão, a dedicação de Igreja aos mártires, e também a própria inspiração do livro de Macabeus:

(…) A glória dos Macabeus se fez solene para nós, neste dia. Quando foram lidas suas admiráveis paixões, não só ouvimos, mas participamos como espectadores delas. Aconteceram há muito tempo, antes da encarnação e da paixão de Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador. (…) Assim os Macabeus foram mártires de Cristo. Portanto, não está fora de lógica,  nem é inoportuno, pelo contrário, é muito comovedor, que sejam os cristãos que celebram solenemente o dia de sua festa. Os judeus celebram algo parecido? Sabe-se que a basílica dedicada aos santos Macabeus está em Antioquia (…)” (Sermão 300 – Festa dos santos mártires Macabeus)

Também mostra que com as honras e festas dedicadas aos mártires, eles nos ajudam com suas orações do céu:

 (…) Neste dia solene dos mártires, eu devo meu sermão. Ajudem-me as orações dos mártires, para falar de sua glória, e para apresentar brevemente a justiça de sua causa. Nestas solenidades, a primeira coisa que deve ser recordada é que não se pode pensar que se dá algo aos mártires, pelo fato de comemorarem estas festas. Eles não tem necessidade delas, porque gozam nos céus da companhia dos anjos. Mas nos apreciam não se os honramos, mas se os imitamos. O próprio fato de honrá-los é proveitoso para nós, não para eles. (…)” (Sermão 325)

 O Senhor  quis que eu comemorasse com vocês a festa dos bem aventurados mártires. (…) Os mártires foram jogados em terra, pela humildade, mas não caíram, porque foram coroados no céu. (…)”  (Sermão 335E)

 Por fim, mostra como devemos orar pela alma dos defuntos e pedir orações aos santos em nosso auxílio:

Há uma disciplina eclesiástica, como os fiéis sabem, quando os nomes dos mártires são lidos em voz alta no altar de Deus, a oração não é oferecida por eles. A oração, no entanto, é oferecida pelos mortos que são lembrados. Por que é errado rezar por um mártir, a quem as orações nós mesmos deveriamos ser recomendados.” (Sermões 159, 1).

 “(…) A justiça dos mártires é perfeita, porque se fizeram perfeitos ao sofrer a paixão. Esta é a razão pela qual não rezamos por eles na Igreja. Se reza pelos outros defuntos, não pelos mártires. Saíram tão perfeitos desta vida que não são nossos protegidos, mas nossos protetores. (…)” (Sermão 285)

Ainda resta alguma dúvida na crença de Agostinho sobre a eficácia da oração, dedicação de festa e templos aos Santos?

 

A HONRA DADA AS RELÍQUIAS DOS SANTOS


Assim diz o catecismo da Igreja católica:

O culto cristão das imagens não é contrário ao primeiro mandamento, que proíbe os ídolos. De fato, a hora prestada a uma imagem se dirige ao modelo Original, e quem venera uma imagem venera a pessoa que nela está pintada. A honra prestada às santas imagens é uma ‘veneração respeitosa’, e não uma adoração, que só compete a Deus:Oculto da religião não se dirige às imagens em si como realidades, mas as considera em seu aspecto próprio de imagens que nos conduzem ao Deus encarnado. Ora, o movimento que se dirige à imagem enquanto tal não termina nela, mas tende para a realidade da qual é imagem.(Catecismo da Igreja Católica, Parágrafo 2132)

Comparece isso com o que diz Santo Agostinho:

“(…) Você tem, portanto, meu caro, um alívio não pequeno: este lugar de oração. Aqui seja honrado, o mártir Estevão; mas honrando-o, seja adorado Aquele que o coroou. (…)” (Sermão 318)

Mas, no entanto, nós não construímos templos, e ordenamos sacerdotes, ritos e sacrifícios para estes mesmos mártires, porque não são nossos deuses, mas o seu Deus é o nosso Deus. Certamente honrarmos seus relicários, como os memoriais dos santos homens de Deus que se esforçaram para a verdade, mesmo até morte de seus corpos, para que a verdadeira religião pudesse ser conhecida, e as religiões falsas e fictícias expostas. (Cidade de Deus, livro VIII, capítulo 27)

A próxima história ele nos conta sobre um bispo que estava levando as relíquias do mártir Santo Estêvão. O bispo deu uma garota cega algumas flores, e ela foi milagrosamente curada por elas. Podemos ver que foi um resultado das relíquias que isso aconteceu. O grande Santo refere-se as relíquias carregadas pelo bispo duas vezes.

Quando o bispo Prejecto chegou com uma relíquia do gloriosíssimo mártir Estêvão a Aguas Tibilitanas (ad Aquas Tibilitanas), veio ao seu encontro uma grande multidão. Uma mulher cega que ali se encontrava pediu que a levassem ao bispo portador da relíquia. Ofereceu as flores que levava, voltou a pegar nelas, aproximou-as dos olhos, e imediatamente ficou a ver. Exultando de alegria, caminhava ã frente dos que, estupefatos, ali estavam presentes, tomando o seu caminho sem precisar de guia para o resto da viagem.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

A Igreja católica proíbe qualquer tipo de adoração ou idolatria a imagens:

O primeiro mandamento condena o politeísmo. Exige que o homem não acredite em outros deuses afora Deus, que não venere outras divindades afora a única. A escritura lembra constantemente esta rejeição de “ídolos, ouro e prata, obras das mãos dos homens”, os quais “têm boca e não falam, têm olhos e não vêem… Esses ídolos vãos tornam as pessoas vãs: “Como eles serão os que o fabricaram e quem quer que ponha neles a sua fé” (Sl 115,4- 5.8). Deus, pelo contrário, é o “Deus vivo” (Jo 3,10) que faz viver e intervém na história.(Catecismo da Igreja Católica – Parágrafo 2112).

O concílio de Trento declara que  a veneração não deve ser dirigida a uma imagem diretamente como realidade, pois uma imagem apenas representa:

Além disso declara este santo concílio, que as imagens devem existir, principalmente nos templos, principalmente as imagens de Cristo, da Virgem Mãe de Deus, e de todos os outros santos, e que a essas imagens deve ser dada a correspondente honra e veneração, não por que se creia que nelas existe divindade ou virtude alguma pela qual mereçam o culto, ou que se lhes deva pedir alguma coisa, ou que se tenha de colocar a confiança nas imagens, como faziam antigamente os gentios, que colocavam suas esperanças nos ídolos, mas sim porque a honra que se dá às imagens, se refere aos originais representados nelas, de modo que adoremos unicamente a Cristo, por meio das imagens que beijamos e em cuja presença nos descobrimos, ajoelhamos e veneramos aos santos, cuja semelhança é espelhada nessas imagens. Tudo isto está estabelecido nos decretos dos concílios, principalmente no segundo de Nicéia, contra os impugnadores das imagens.” (Concílio de Trento: sessão XXV).

Portanto, tanto os cristãos atuais quanto os antigos não veneravam e honravam as imagens e relíquias sagradas dos mártires e santos em si como realidades, mas a quem as imagens representam, ou seja, ao honrar uma imagem de Cristo ou da Cruz, estamos venerando o próprio Cristo.

 

OS MILAGRES ATRAVÉS DAS RELÍQUAS DOS SANTOS


O Capitulo 8 do livro XXII da obra “A Cidade de Deus” é um riquíssimo escrito de Santo Agostinho sobre o culto e os milagres feito através dos santos e suas relíquias. Acima colocamos algumas passagens deste capítulo sobre a oração feita aos mártires e diante de suas relíquias, agora iremos colocar alguns testemunhos seletos das dezenas de histórias que Santo Agostinho conta, neste mesmo capítulo, sobre os milagres realizados através das relíquias dos santos.

No inicio do capitulo ele mostra que Deus realiza milagres de varias formas:

Os milagres que foram realizados e que foram realizados para que se acreditasse. Estes milagres tiveram toda a publicidade para fazerem nascer a fé e com a fé que produziram tornaram-se muito mais conhecidos. São, realmente, lidos às populações para que creiam, mas não seriam lidos às populações se neles não acreditassem já. Ainda agora se fazem milagres em seu nome, quer pelos seus sacramentos quer pela oração e pelas relíquias dos santos. Mas não resplandecem com o mesmo brilho que cheguem a divulgar-se com tão grande fama quanta era a de então.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Santo Agostinho passa então a provar que houve milagres em seu tempo por estes vários meios. Na continuação, então, ele se refere a um homem que está sendo curado em Milão, como resultado da visita de uma multidão as relíquias de São Protásio e Gervásio. Também é digno de nota que Santo Agostinho acreditava que estes corpos foram revelados milagrosamente por Santo Ambrósio em um sonho.

O milagre que se verificou em Milão quando lá estávamos — quando um cego recuperou a luz da vista–pôde chegar ao conhecimento de muitos porque a cidade é extensa e estava lá o imperador e os factos aconteceram tendo por testemunha uma população imensa que acorrera a ver os corpos dos mártires Gervásio e Protásio. Quando estes estavam escondidos e completamente ignorados, foram mostrados em sonhos ao bispo Ambrósio e encontrados. Pela Virtude dessas Relíquias as trevas deste velho foram dissipadas, e ele viu a luz do dia[1] (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Santo Agostinho diz que viu isso acontecer com seus próprios olhos, ou, pelo menos, estava presente na cidade quando aconteceu.

É engraçado que os protestantes odeiam quando os católicos fazem o sinal da cruz. No entanto, podemos claramente que Santo Agostinho não só reconheceu que os cristãos faziam o sinal da cruz em seus dias, mas também na próximo ele conta a história de uma menina que foi curado por este sinal.

Na mesma Cartago, urna mulher muito religiosa chamada Inocência, das mais ilustres dessa cidade, tinha um cancro no peito, caso que, segundo diziam os médicos, nenhum medicamento era capaz de curar. Costumava-se, portanto, extrair do corpo o órgão onde ele surgia ou então, para se viver durante mais algum tempo, sem que daí se protelasse, todavia, a morte para muito mais tarde; devia-se, conforme o conselho atribuído a Hipócrates, omitir todo o tratamento. Foi o que ela soube dum médico: hábil, amigo intimo de sua família. Ela, então, apenas para Deus se voltou pela oração. Ao aproximar-se a Páscoa, foi avisada em sonhos de que, colocando-se no batistério na parte destinada às mulheres, a primeira mulher batizada a ela se dirigiria e lhe traçaria sobre o peito o sinal da cruz. Assim fez e alcançou imediatamente a cura.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Se havia alguma dúvida quanto à cura que Cristo traz como resultado de relíquias, ele nos dá ainda uma outra história. Assim, através do carregar de uma relíquia, um bispo foi curado, e outro sacerdote foi até mesmo ressuscitado dentre os mortos pela relíquia! Na verdade, ele conta a história de várias ocasiões em que isso aconteceu como resultado da relíquia de Santo Estêvão.

Com o povo a precedê-lo e a segui-lo, levava Lucílio, bispo do lugar, uma relíquia do citado mártir que se encontrava na fortaleza de Siniti, próxima da colónia de  Hipona. De repente, quando transportava aquelas piedosas relíquias, sentiu-se curado de uma fistula, mal de que sofria já De tempos; esperava a chegada de um médico muito amigo seu que o havia de operar; e o certo é que nunca mais a encontrou no corpo.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Eucário, presbítero de Espanha residente em Cálama, que a muito sofria do mal de pedra, foi curado por intermédio das relíquias do mencionado mártir que o bispo Possídio lhe levou. Este mesmo presbítero jazia mais tarde como morto, atingido por outra doença, de forma que já e ligavam os polegares. Por intervenção do mencionado mártir voltou a vida quando puseram sob o corpo do presbítero moribundo a sua própria túnica que tinham trazido da memória do mártir.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Apenas no caso de restar qualquer dúvida quanto à linguagem literal utilizada aqui, podemos ver o que o próprio Agostinho fala sobre as histórias contadas a nós. Ele nos diz muito claramente que todos esses milagres eram verdadeiros, histórias literais. Na verdade, essa é a razão do porque ele está escrevendo esta carta. Ele está escrevendo-a para responder aos “protestantes” de sua época.

Que é que eu hei-de fazer? A promessa de acabar com esta obra aperta comigo de forma tal que não posso deixar aqui consignado todos os milagres que sei. Não há dúvida de que a maioria dos nossos, ao lerem isto, lamentarão que eu tenha passado em silêncio tantos factos que conhecem tão bem como eu. A esses peço, desde já, que me desculpem e pensem quão extenso seria fazer o que a necessidade determinar esta obra me obriga já a não fazer. De fato, se não referisse os outros e me limitasse a contar as curas miraculosas que, por intermédio deste gloriosíssimo mártir Estêvão, se realizaram na Colónia de Cálama e na nossa, muitos livros teriam de ser compostos, e nem mesmo assim poderiam ser todos coligidos, mas apenas aqueles de que se redigiram os folhetos (libellí) que se recitam ao povo. Quisemos, de fato, que se contasse isto, ao vermos que, também nos nossos tempos, são frequentes os sinais do poder divino, semelhantes aos antigos, e que não devem escapar ao conhecimento de muitos. Ainda não há dois anos que esta memória ,existe em Hipona Régia, e de muitos (disto estou bem certo) dos milagres que se verificaram, foram redigidos os libelos; todavia, quando estes factos descrevi, eram já cerca de setenta os libelos redigidos. .Mas em Cálama, onde há tuna memória anterior a nossa, verificam-se mais frequentemente e contam-se em quantidade incomparavelmente superior.” (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Finalmente Santo Agostinho fecha com uma incrível história de uma cura que aconteceu como resultado da veneração das relíquias de Santo Estêvão em sua igreja. Leia atentamente a forma como os cristãos de sua época viram relíquias da mesma forma que os católicos fazem hoje. Os protestantes acusam os católicos de idolatria ao venerar as relíquias, apesar das explicações da Igreja Católica em contrário. No entanto, podemos ver aqui a fé católica sendo vivida na época de Santo Agostinho. Podemos ver que os milagres provocados pelos santos e suas relíquias nunca podem ser separado do próprio Cristo. Os católicos naquela época sabiam o que nós católicos sabemos hoje, e você pode ver como os cristãos dos primeiros 400 viam isso neste último parágrafo. Além disso, Santo Agostinho nos diz que ele testemunhou esses eventos acontecerem. Será que os protestantes irão chamar Santo Agostinho de mentiroso?

Verificou–se entre nós um milagre que não é maior do que aqueles de que falei, mas tão notório e brilhante que não há em Hipona, estou certo, quem o- não tenha visto e dele não saiba; não há quem, por qualquer razão, o possa esquecer.

 Dez irmãos (sete dos quais são varões e três irmãs) de Cesareia da Capadócia, nobres entre os seus concidadãos, foram amaldiçoados por sua mãe, desvalida em consequência da morte recente do pai deles e que suportará uma gravíssima ofensa que por eles lhe foi feita. Por isso foram pelo poder divino castigados com pena tal que todos se agitavam horrivelmente com o tremor dos membros. Não podendo suportar, nesta tão repugnante situação, os olhares dos seus concidadãos, decidiram ir cada um para seu lado e vagabundeavam por quase todo o mundo romano. Também até nós chegaram dois deles, irmão e irmã, Paulo e Paládia, já conhecidos em muitos outros lugares pela sua notória desgraça.

 Chegaram uns quinze dias antes da Páscoa e todos os dias iam ã igreja e ã memória lá existente do gloriosíssimo Estêvão, pedindo a Deus que deles se compadecesse e lhes restituísse a antiga saúde. Aí e em qualquer parte para onde fossem, atraíram sobre si os olhares da cidade. Alguns que já os tinham visto noutros sítios e sabiam qual era a causa das suas convulsões, contavam o caso aos outros como podiam.

 Chegou o dia de Páscoa e, nesse domingo, de manhã, quando já lá estava muita. gente, estava também, junto às grades do lugar santo onde estava o relicário (martyrium), o mencionado jovem orando. De repente cai e jaz por terra como se estivesse a dormir mas sem tremer como lhe era habitual mesmo durante o sono. Ficaram estupefatos os presentes, uns possuídos de pavor, outros de compaixão. Quando alguns o quiseram levantar, os outros opuseram- se dizendo que era preferível esperar pelo desfecho. Nisto ele levanta-se, mas não tremia pois estava curado e olhava de pé, incólume, os que o olhavam. Quem é- que então se aguentou sem dar louvores a Deus? De todos os lados se encheu a igreja com os gritos dos que aclamavam e davam graças. Correram até ao sitio onde eu estava sentado mas já disposto a ir ao seu encontro. Cada um se precipita, um depois do outro, contando-me cada um que vem as seguir, como novidade aquilo que outro me tinha acabado de contar. Cheio de alegria e dando, cá comigo, graças ar Deus, surge-me ele próprio com vários outros, lança-se aos meus joelhos e depois levanta-se para receber o meu beijo. Dirijo-me ao povo; a igreja estava repleta; ecoava com as vozes de alegria: Graças a Deus, Louvores a Deus! Ninguém estava calado. As aclamações vinham de todos os lados. Saudei o povo e renovam-se as aclamações com o mesmo fervor. Feito por um silêncio, procedeu-se a leitura solene das Sagradas Escrituras. Quando chegou as alturas do meu sermão, proferi umas poucas palavras apropriadas à ocasião e à exuberância daquela alegria. Achei melhor, não que me ouvissem, mas antes que consideras-Í sem a eloquência de Deus na sua obra divina. O homem almoçou conosco e contou-nos pormenorizadarnente toda a história da sua desgraça – a de sua mãe e a de seus irmãos.

No dia seguinte, depois de proferido o sermão, prometi que no outro dia se deveria ler ao povo o libelo desta narrativa. Ao terceiro dia depois do domingo de Páscoa, enquanto isso se fazia, fiz colocar ambos os irmãos de pé nos degraus do estrado do alto do qual eu falava. Toda a gente de ambos os sexos os mirava – a um, de pé, sem qualquer anormal movimento, a outra com todos os seus membros em convulsão. Os que o não tinham visto podiam ver na sua irmã o que nele era efeito da divina misericórdia. Viam o que nele se devia agradecer e o que por ela se devia implorar. Terminada que foi a leitura do seu libelo, mandei-os retirar da vista do povo e começava eu a falar um tanto mais desenvolvidamente do mesmo caso, eis se não quando, estando eu ainda já falar, outros gritos de congratulação se ouviam vindos da memória do mártir. Os que me ouviam voltaram-se para lá e todos juntos para lá começaram a correr. É que ela, tendo descido do estrado onde se mantinha de pé, foi orar para junto do Santo Mártir e, apenas tocou nas grades, também ela semelhantemente caiu por terra como que mergulhada no sono para logo se levantar curada. Quando eu procurava saber o que tinha acontecido, donde é que vinha aquele tumulto de alegria, entram com ela na basílica onde estávamos, trazendo-a curada do lugar do Mártir. Levantou-se então um tão grande clamor de admiração da parte de ambos os sexos que a ininterrupta gritaria ã mistura com lágrimas parecia nunca mais ter fim. Levaram-na ao mesmo lugar onde pouco antes estivera em convulsões. Exultavam por vê-la tão semelhante a seu irmão, ela a quem, com dor, tinham visto tão diferente dele – e constatavam que já tinham sido atendidas (e tão depressa) as suas preces, quando ainda por ela nem sequer as tinham erguido. Exultavam em louvores a Deus, não com palavras mas com gritos, com tal estrépito que dificilmente os nossos ouvidos podiam suportar. Que é que nos corações dos que saltavam de alegria havia senão a fé de Cristo pela qual Estêvão derramou o seu sangue?”. (Cidade de Deus Livro XXII, Capitulo VIII)

Também em sua carta 212, mostra novamente a honra dada as relíquias de Santo Estevão, em todas as partes:

Quão forte são as suas súplicas por você, que reside no mesmo país nesta terra em que estas senhoras, pelo amor de Cristo, renunciaram as distinções deste mundo, Eu também peço-lhe para rebaixar e receber com o mesmo amor com o qual Eu ofereci a minha saudação oficial, e se lembre de mim em suas orações. Estas senhoras carregam consigo relíquias do abençoado e gloriosíssimo mártir Estevão: Vossa Santidade sabe dar a devida honra a estes, como temos feito.”(Carta 212).

 

CONCLUSÃO


Depois deste carrilhão de citações das obras de Santo Agostinho, resta apenas lamentar por aqueles que querem fazer de tudo para negar as bases da fé cristã criando suas próprias doutrinas e ainda fazer uso desonesto de citações recortadas do contexto atribuindo ao santo algo que ele nunca pensou.

 
NOTAS

[1] Acerca deste facto leia-se o seu relato nas Confissões IX, 7.

 

PARA CITAR


RODRIGUES, Rafael. Santo Agostinho e o culto aos santos. Disponível em:<http://apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/controversias/792-santo-agostinho-e-o-culto-aos-santos> Desde: 29/04/2015.

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